sábado, 3 de julho de 2010

A química amorosa

JOAQUIM ZAILTON BUENO MOTTA*


Ouvimos habitualmente que os pares precisam de uma boa interação corporal para se darem bem. É a famigerada química do amor. Procurando desvendar essa questão, surgem publicações variadas em todo o mundo. Por exemplo, Helen Fisher e Antonio Damasio, nos EUA, estão frequentemente apresentando importantes trabalhos sobre os sentimentos e emoções. No Brasil, a neurocientista Suzana Herculano-Houzel tem disponibilizado muito conhecimento acadêmico sobre o cérebro sexual e afetivo à população leiga. Recentemente, a médica e fisiologista Cibele Fabichak lançou o livro Sexo, Amor, Endorfinas e Bobagens (Ed. Novo Século). Em 256 páginas, ela tenta popularizar muitos desses conceitos e desfazer mitos.

Sinteticamente, podemos dizer que o livro debate a compreensão bioquímica do desejo sexual, em que o principal hormônio envolvido é a testosterona. Depois, enfoca a atração física ou sexual e caracteriza a paixão, a grande euforia e intensa felicidade regidas pelos hormônios que proporcionam bem-estar (dopamina, endorfina e serotonina). E discute o vínculo duradouro, o amor. A autora procura mostrar que é melhor dizer “paixão à primeira vista” do que amor, pois esse encantamento rápido é essencialmente visual devido às forças da natureza que buscam a procriação. O gatilho é “olhar e gostar”.

O homem herdou dos ancestrais primitivos esse enlevo imediato pela fêmea. A mulher também é atraída pela visão, mas nem tanto. Ela procura também avaliar o perfil psicológico do parceiro: cultura, bom humor, status, responsabilidade, capacidade provedora.

Quando a pessoa está apaixonada, o sistema límbico (central cerebral das emoções) produz uma avalanche química que torna o amado lindo e sem imperfeições. Vem daí a ideia de que o amor é cego, além das explicações oportunistas sobre casamentos precipitados e escolhas equivocadas.

Depois que passa a onda de prazer que distorce os julgamentos, os pares começam a se enxergar exatamente como são. Se os laços formados e a entrega erótica forem fortes, a parceria continua.

As últimas pesquisas seguem demonstrando que a paixão dura aproximadamente de 12 a 48 meses, tempo suficiente para fortalecer a união, aprimorar o sexo, promover a gestação e a criação dos filhos. Como uma criança começa a ter certa independência por volta dos 2 anos, a natureza parece respeitar a cronologia necessária e suficiente para manter o núcleo familiar unido.

A manutenção e os retoques do relacionamento são facilitados por tudo o que é novidade, pois a cada criação dos pares (um jantar especial, uma viagem, uma brincadeira erótica), o cérebro ativa os mediadores do prazer.

Por outro lado, nas vivências de rompimento, como a pessoa apaixonada se acostumou com as substâncias cerebrais que geram satisfação, ela pode entrar em um processo de abstinência. Isso demandaria uma busca intensa pelo parceiro e até o aumento do estado passional à medida que se mantêm ativos os setores do cérebro que estimulam a paixão. Algumas pessoas podem exagerar e recorrer à vingança, apelando a recursos escusos e até criminosos.

Porém, quando essa química “viciada” começa a diminuir, o estímulo da atividade do córtex pré-frontal, região onde se concentram o julgamento crítico e o discernimento, processa a oposição ao amor, o distanciamento bipessoal, o que facilita a separação.

Toda a objetividade bioquímica é afetada por inúmeros aspectos subjetivos. A educação, a instrução, a personalidade, a cultura, o ambiente e os valores abstratos influenciarão nos destinos da paixão, do amor e da evolução do relacionamento, determinando se o indivíduo vai passar por essas fases sugeridas, suportando os altos e baixos ou cometendo loucuras de amor.
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*Joaquim Zailton Bueno Motta é psiquiatra e sexólogo
Fonte: Correio Popular online, 03/07/2010

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