terça-feira, 13 de julho de 2010

Uma coisa de cada vez

NEURO

SUZANA HERCULANO-HOUZEL*
suzanahh@uol.com.br

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Como diria Lavoisier,
dois pensamentos não ocupam o foco de atenção do cérebro ao mesmo tempo

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VOCÊ ACHA que dá para dirigir e falar ao celular ao mesmo tempo, ou responder a e-mails prestando atenção à reunião?

Pois não dá, e a culpa não é da internet ou da tecnologia, que colocam cada vez mais informações dividindo a mesma tela do computador.

Por uma limitação intrínseca do cérebro, tudo o que conseguimos fazer é dividir nossa atenção ao longo do tempo, alternando entre um objetivo e outro, mas sempre dando atenção a uma coisa de cada vez. Como diria Lavoisier, dois pensamentos não ocupam o foco de atenção do cérebro ao mesmo tempo.

Por outro lado, dois objetivos até conseguem ocupar o cérebro simultaneamente.

Não a mesma parte do cérebro, é verdade.

Segundo pesquisa recente da equipe de E. Koechlin, quando decidimos alternar entre duas tarefas julgadas importantes, regiões nos lados direito e esquerdo do córtex pré-frontal dividem o trabalho, uma cuidando do objetivo da vez (ler o jornal), de um lado, e a outra mantendo ativa a representação da tarefa em espera, do outro lado do cérebro (não deixar o leite ferver), sob a supervisão da parte mais frontal do córtex, que gerencia o esforço de alternar entre a execução atenta de tarefas.

Quer experimentar? Em www.cerebronosso.bio.br/multitask você pode testar sua habilidade de fazer duas coisas "ao mesmo tempo", ou seja, dar atenção alternadamente a um de dois objetivos.

Comece usando as setas esquerda e direita do teclado para equilibrar uma bola.

Fácil, certo? Logo surge uma segunda tela, onde você deve usar as setas para cima e para baixo, com a mesma mão, para desviar de um ponto em movimento. Passar nos dois testes ao mesmo tempo requer um bocado de esforço pré-frontal para alternar a atenção entre os dois objetivos, mas ainda dá.

E então... surge uma terceira tarefa na tela, a executar com a outra mão. A essa altura, é preciso sorte para sobreviver mais que alguns segundos no jogo. Se por puro acaso você chegar à quarta tarefa simultânea, duvido que dure por muito tempo.

Por quê? Koechlin, novamente, explica: com apenas dois hemisférios confrontados com um terceiro objetivo simultâneo, o córtex se vê obrigado a abandonar um deles e cuidar apenas dos dois que considerar mais importantes. Três coisas ao mesmo tempo, nem pensar!
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*SUZANA HERCULANO-HOUZEL, neurocientista, é professora da UFRJ e autora de "Pílulas de Neurociência para uma Vida Melhor" (ed. Sextante) e do blog www.suzanaherculanohouzel.com

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