D.
Manuel Clemente, patriarca de Lisboa, diz que a pedofilia nada tem que
ver com o celibato dos padres e admite que o caso do vice-reitor do
Seminário do Fundão não
seja único na Igreja em Portugal
Correio
da Manhã - Este ano a pedofilia deixou de ser, para a Igreja
portuguesa, um pecado estrangeiro, uma vez que foi detido, por suspeita
da prática desse crime, o vice-reitor do Seminário do Fundão. Como
recebeu essa notícia?
D. Manuel Clemente - Com
imensa tristeza, como é de calcular. Não fiquei feliz nem descansado,
sobretudo porque se trata de alguém com responsabilidades na Igreja. O
que há a fazer é, sobretudo, prevenir. É preciso reforçar o trabalho de
discernimento e acompanhamento vocacional dos candidatos ao sacerdócio.
Mas há aqui outras questões a ter em conta.
- Quais?
-
Acho que aqui a sociedade também tem de entrar, não apenas a Igreja,
mas a sociedade no seu todo. É preciso rever questões relacionadas com a
educação para a sexualidade, a relação com o corpo, porque há por aí
muita contradição em termos culturais e até em termos mediáticos.
- O celibato dos padres não potencia esses comportamentos?
-
Não tem nada a ver com isso, até porque a esmagadora maioria dos casos
acontece, infelizmente, em relações de parentesco e praticados por
pessoas casadas.
- O caso do vice-reitor do Seminário do Fundão será único em Portugal ou admite que haja outros?
-
Infelizmente, a natureza humana já não nos reserva grandes surpresas.
Não devemos é não desistir de a melhorar. Pode haver por cá mais casos,
mas não tenho conhecimento.
- Não tem informações concretas?
-
Se algum dia tiver informações concretas, isso posso assegurar, não
haverá nada que não seja verificado, investigado e acompanhado, tendo
sempre em conta a salvaguarda das vítimas. Seremos sempre colaborantes
com a justiça, no pressuposto de que os clérigos são cidadãos como os
outros, sem direitos especiais.
- Qual é a sua opinião sobre o celibato dos padres?
-
Acho que, para além de ser uma questão de disciplina, é também um
assunto com relevo teológico. A ordenação é um sacramento e, nessa
medida, o sacerdote assume o papel de representante de Cristo na
comunidade. Pessoalmente, acho que o casamento e a constituição de
família é incompatível com esta nossa tarefa de evangelizar, mas a
discussão está aí e eu sou a favor de que tudo seja discutido.
- Repugna-o a ordenação das mulheres?
-
Não se trata de repugnar. O que penso é que, também aqui, podem ser
levantados problemas de ordem teológica. Cristo deu grande relevo às
mulheres, mas não as escolheu para o sacerdócio. Mas também aqui a
discussão continua em aberto. Mas o que é necessário discutir é a
relação masculino-feminino. É uma questão em aberto, tanto na ordenação
das mulheres como no casamento entre pessoas do mesmo sexo.
- A primeira encíclica do papa Francisco volta a condenar o casamento homossexual...
-
Na minha opinião, casamento implica um homem e uma mulher e a abertura à
geração de filhos. Foi sempre assim. Se é outra realidade, com todo o
respeito pelos outros, também deve ter outro nome.
- Qual é a sua opinião sobre os exorcismos?
- Acho que essas coisas têm de ser levadas muito a sério. Ultrapassam muito a nossa compreensão, mas são sérias.
- Deve haver um exorcista por diocese?
-
Na diocese do Porto tinha dois cónegos preparados para isto e em Lisboa
também tenciono fazê-lo, até porque é importante que haja quem atenda,
com competência, os problemas dos fiéis.
- O papa diz que fica doente quando vê padres com carros de alta cilindrada. Também fica?
- Doente não, mas interrogativo fico. Não devemos esquecer que Cristo quando entrou em Jerusalém ia num burro.
- Acha que a Igreja paga os devidos impostos?
- Isso está a ser verificado no âmbito da Concordata, mas no geral, penso que sim.
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Fonte: Jornal de Portugal: http://www.cmjornal.xl.pt/detalhe/noticias/nacional/entrevista/pode-haver-por-ca-mais-casos-de-pedofilia
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