quinta-feira, 17 de dezembro de 2009

O Natal de Pandora

Taís Braga

Na mitologia grega, a caixa de Pandora, a primogênita de Zeus, foi um presente do pai, onde ela deveria guardar todos os bens que não fossem materiais. Não poderia ser destruída. O rei dos deuses entregou Pandora como presente a Epimeteu, que a tomou como esposa. Ela levou a sua caixa no enxoval. Epimeteu abriu a caixa e liberou os males que afligem a humanidade: a loucura, a inveja, a mentira… No fundo, ficou a esperança.

Nos últimos 20 dias, os brasilienses conviveram com diversas revelações e denúncias que suscitaram os piores sentimentos do ser humano: raiva, sede de vingança, mentira, decepção, falsidade, traição. No campo político, a caixa revelou uma trama mitológica. Quanto às relações humanas, exibiu o pior da personalidade dos políticos, que são aqueles que representam os anseios dos cidadãos.

Nós nos perguntamos: somos o que mostram aquelas imagens? É a postura que outorgamos aos nossos representantes? As imagens revelam o que almejávamos deles? Muitos se revoltam, dizem que não poderiam esperar outro comportamento. Outros se encolhem, se aquietam, envergonhados por suas escolhas. E outros buscam uma mudança. Há quem veja Pandora como uma oportunidade de aperfeiçoamento.

Como na mitologia, a caixa indestrutível serve de depositário de lembranças que sempre se revelam.

Há anos, a prática política decepciona cidadãos. Há anos, figuras políticas se renovam tal qual a também mitológica Fênix, que renascia das cinzas. E há anos os cidadãos se deixam levar pelas más escolhas e se recusam — ou receiam — a abrir as suas caixas de Pandora para resgatar do fundo a tal esperança esquecida, num comportamento autodestrutivo, revelador da tristeza que as lembranças e sentimentos guardados provocam.

A proximidade do Natal e a chegada do novo ano nos estimulam a abrir a nossa caixa da Pandora. É o momento de reflexão sobre nossos piores sentimentos. Aproveitamos o período para nos aproximar de quem e do que nos fazem felizes e para descobrir que podemos nos aprimorar. É tempo de computar os acertos, reforçar sonhos e rever as nossas expectativas. Sim, como bem disse Barack Obama, nós podemos! Podemos escolher melhores sentimentos, comportamento, melhores representantes. Não devemos pensar como Pandora, que, ao achar que a caixa era enfeitiçada por ser indestrutível, não conseguiu viver com o que chamou de maldição e se matou aos 36 anos.

FONTE: Correio Braziliense online, 17/12/2009

Nenhum comentário:

Postar um comentário