quinta-feira, 24 de dezembro de 2009

Pesquisa ajuda Igreja a melhorar comunicação


Levantamento traça perfil de fiel católico em 2 regiões de SP; maioria é mulher, com ensino superior completo

Por Alexandre Gonçalves

Olga Bechara tem 77 anos e vai à missa todos os domingos na Igreja do Calvário, em Pinheiros, zona oeste de São Paulo. Professora aposentada da Faculdade de Educação da USP, ela tem o perfil médio do católico praticante na região central da cidade. É o que mostra uma pesquisa realizada pela própria arquidiocese com mais de 10 mil pessoas.
Como Olga, cerca de 70% dos fiéis entrevistados são mulheres e têm mais de 40 anos. O levantamento contraria o costume da Igreja de não realizar pesquisas de opinião para aprimorar suas estratégias pastorais.
A ideia partiu de d. Tarcísio Scaramussa, bispo auxiliar de São Paulo e vigário episcopal da região Sé, divisão administrativa da arquidiocese que reúne bairros da zona oeste e do centro. Ele conta que a proposta de fazer a pesquisa surgiu no momento de elaborar um plano para aprimorar a comunicação dentro da Igreja e com a sociedade.

MODO DE VIDA

A professora aposentada é solteira e vive em um apartamento a seis quarteirões da paróquia que frequenta. Como Olga, quase 40% dos entrevistados não têm filhos e um terço costuma ir desacompanhado à missa. Ela também pertence ao grupo dos 16% que moram sozinhos. Segundo o levantamento, cerca de 70% dos fiéis na região vivem em edifícios e são donos de suas próprias residências.
O sobrinho de Olga, João Bechara Ventura, ingressou no seminário há um ano, logo após concluir o curso de Direito. Ao contrário da tia, que frequenta a Igreja desde criança e já cogitou ser freira, o rapaz não praticou o catolicismo até os 18 anos.
Hoje tem 25 anos e pertence ao grupo pouco numeroso, mas convicto, de jovens que redescobriram a religião (mais informações nesta página). Como metade das pessoas que responderam o questionário, tia e sobrinho têm curso superior.
Segundo o padre Manoel Quinta, organizador do estudo, a grande parcela de pessoas com diploma universitário reflete o perfil da região. Além disso, ele aponta que algumas igrejas frequentadas por pessoas com maior poder aquisitivo empenharam-se mais na realização do levantamento. Mesmo assim, Quinta considera a amostra muito representativa.
Na paróquia São Geraldo, em Perdizes, todos os fiéis receberam papel e lápis durante o sermão da missa para responder o formulário de perguntas.

ESTRATÉGIA

O levantamento conta com diversas perguntas sobre os principais veículos de comunicação utilizados pelos fiéis e sobre a penetração da mídia católica. Também avalia o impacto das emissoras de TV de outras religiões, especialmente evangélicas. Cerca de 23% dos entrevistados assistem programas de outras religiões com alguma frequência.
A pregação dos padres também foi avaliada. Mais de 80% dos católicos consideram o sermão claro e oportuno. Por outro lado, quase 70% dos fiéis julgam a missa insuficiente para responder as suas dúvidas de fé e estariam dispostos a dedicar pelo menos uma hora semanal para aprender sobre religião. Cerca de 56% admite conhecer pouco o cristianismo.
A pesquisa também indagou a imagem que cada fiel tem da Igreja. Os itens mais citados foram "séria", "acolhedora" e "respeitável". Mas quando questionados sobre a imagem veiculada pelos meios de comunicação venceram os adjetivos "conservadora", "moralista" e "atrasada".
O padre Benedito Spinoza, diretor do Liceu Coração de Jesus, afirma que já houve uma reunião de párocos da região Sé para estudar iniciativas com base nos dados da pesquisa. "Ficou claro que devemos apostar na capacitação das pessoas", afirma o padre que recebeu de d. Tarcísio a missão de assessorar a criação de pastorais de comunicação em cada paróquia.

ANÁLISE

70% dos fiéis entrevistados têm mais de 40 anos ou é mulher
63% já frequentaram cultos de outras religiões
56% querem aprender mais sobre o catolicismo
80% afirmam entender perfeitamente o sermão do padre

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Por Alexandre Gonçalves


A professora aposentada Olga Bechara nasceu em uma família libanesa de tradição maronita - católicos que celebram parte da missa em aramaico, língua falada por Jesus. No Brasil, integraram-se bem ao rito latino, tradicional no ocidente.
Olga recorda com alegria a realização do Concílio Vaticano II na década de 60, quando todos os bispos do mundo reuniram-se para discutir a ação da Igreja nos tempos atuais. "Foi uma renovação muito grande", comenta a professora.
Ela se considera uma católica por tradição, mas convicta. "Nunca pensei em mudar de religião", afirma Olga, que já participou de cultos de outros credos por "curiosidade intelectual". Cerca de 63% dos fiéis entrevistados na pesquisa da arquidiocese de São Paulo afirmam ter frequentado cerimônias não católicas.
O sobrinho de Olga, João Bechara Ventura, também considera o Concílio Vaticano II um marco na história da Igreja. Ele redescobriu a fé aos 18 anos, movido por uma grande inquietação espiritual. Hoje, afirma não ter interesse em outros grupos religiosos e fala com orgulho da própria conversão.
O sociólogo Francisco Borba Neto, coordenador de projetos do Núcleo Fé e Cultura da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), aponta que uma pergunta sempre incomodou o católico europeu e brasileiro: minha opção religiosa é fruto da tradição ou de uma decisão verdadeira? "Começa a surgir na classe média um catolicismo de minoria - semelhante ao existente nos Estados Unidos - em que esta dúvida existencial desaparece", aponta Borba Neto. "Justamente porque a tradição não é mais importante, há uma convicção maior."

Fonte: Estadão online, 24/12/2009

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