segunda-feira, 21 de dezembro de 2009

Traídos pelo texto





Há uma pergunta que vem à mente de qualquer pessoa que tenha enviado recentemente uma mensagem de texto por celular enquanto traía seu cônjuge: onde é que eu estava com a cabeça?

As mensagens de texto são o novo batom no colarinho, ou a fatura do cartão de crédito largada por aí. Instantâneas e aparentemente casuais, elas podem ser a confissão de um caso clandestino por parte de quem esquece que tudo que é digital deixa pegadas.

Isso ficou óbvio neste mês, quando uma mulher que diz ter tido um caso com Tiger Woods afirmou a uma publicação de celebridades que o golfista lhe mandara mensagens românticas via SMS, algumas das quais foram publicadas. Alguns políticos americanos já haviam caído nessa armadilha, como Kwame Kilpatrick, ex-prefeito de Detroit, preso depois da divulgação de mensagens picantes a uma assessora, e o senador John Ensign, cujo caso com uma ex-funcionária foi confirmado por um SMS incriminador.

Ao contrário de eras anteriores, quando um namorico poderia ser suspeitado, mas não confirmado, hoje em dia as mensagens de texto são a prova. Advogados especializados em divórcios dizem estar vendo no último ano um aumento de casos em que um cônjuge traído apresenta SMSs para demonstrar que seu parceiro se desgarrou.

A Associação Americana dos Advogados começou a promover recentemente seminários sobre como usar provas eletrônicas —mensagens de texto, histórico de navegação e redes sociais. E a Suprema Corte dos EUA aceitou, em 15 de dezembro, decidir se um órgão policial da Califórnia violou os direitos constitucionais à privacidade de um funcionário ao inspecionar mensagens pessoais enviadas e recebidas num “pager” do governo.

“Como alguém inventa uma desculpa quando o que está acontecendo está bem aí, escrito em preto e branco?”, questionou Mitchell Karpf, advogado de Miami que é também presidente da seção de direito familiar da Associação dos Advogados. “Na hora em que alguém aparece com um punhado de mensagens, não há volta.”

Enquanto a maioria dos usuários de e-mail já entende que as mensagens ficam nos seus computadores mesmo quando são deletadas, as mensagens de celular em geral são consideradas mais efêmeras. Mas elas podem permanecer nos telefones do remetente e do destinatário e, mesmo que sejam deletadas, as empresas de telefonia as mantêm por um prazo de dias ou até semanas.

Os advogados preveem que o número de casos crescerá conforme os usuários jovens de celular, mais propensos a mandar mensagens que a falar, se casarem. Na raiz disso está a privacidade —ou a crescente falta dela na nossa cultura do exibicionismo digital. Mensagens de texto são consideradas privadas, assim como telefonemas, segundo juristas. Mas, se o celular do cônjuge traidor for parte de um plano familiar de ligações ou costuma ficar desbloqueado, é concebível que um cônjuge com suspeitas possa se defender por ter espiado a caixa de mensagens.

“Pessoas que têm algo realmente privado a dizer provavelmente não deveriam fazê-lo por meio de mensagem no seu celular”, disse Marc Rotenberg, diretor-executivo do Centro de Informação da Privacidade Eletrônica, de Washington.

No caso de Woods, Jaimee Grubbs, que trabalha como garçonete em Las Vegas, apareceu com mensagens de texto e voz que disse ter recebido do golfista. Os textos surgiram depois de ele bater o carro, em 26 de novembro; seguiram-se várias reportagens sobre infidelidades conjugais dele. Desde então, mais de 12 outras mulheres afirmaram ter dormido com Woods.

Woods anunciou, no último dia 11, um afastamento por tempo indeterminado do golfe profissional para cuidar do seu casamento. A consultoria global Accenture suspendeu seu contrato de patrocínio para ele no dia 13, um dia depois de a Gillette anunciar que reduziria a presença do esportista em sua publicidade.

Outros, como o ex-prefeito de Detroit Kwame Kilpatrick, foram descobertos porque usaram celulares e “pagers” cedidos pelo governo. Kilpatrick mentiu sob juramento sobre ter tido um caso com uma assessora, mas suas mensagens de texto revelaram a verdade. Há alguns meses, o governador de Nevada, Jim Gibbons, foi acusado por sua esposa, em documentos para o divórcio, de ter mandado mais de 800 mensagens de texto para uma amante em 2007. Ele argumentou que a mulher era uma amiga, mas pagou ao Estado US$ 130 pelas mensagens enviadas do seu telefone.
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O texto íntimo de hoje virará a prova judicial amanhã

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O mais comum, porém, é que a suspeita seja seguida de uma confrontação. Doug Hampton, amigo de longa data e funcionário do senador Ensign, disse recentemente a uma TV que ficou alarmado no final de 2007 quando pediu emprestado o celular de Ensign para ligar para sua mulher, Cynthia Hampton, e a encontrou listada como “Tia Judy”. Hampton disse ter encontrado um SMS incriminador e confrontado os dois sobre o relacionamento durante um jantar de Natal logo depois.

Numa recente pesquisa com 2.300 adultos sobre suas redes sociais, o Projeto Pew da Internet e da Vida Americana descobriu que 12% diziam já ter se arrependido de ter compartilhado certas informações on-line. Lee Rainie, diretor do projeto, argumenta que isso é sinal de uma mudança cultural geral, na qual as pessoas se tornam cada vez mais descuidadas no que tange a revelar informações pessoais.

“Uma coisa é escrever um bilhete pessoal a alguém, que o compartilha com suas duas melhores amigas”, disse Rainie. “Outra coisa é mandar uma mensagem sobre o seu afeto imorredouro e se tornar alvo de risos. O que parece íntimo e anônimo num momento talvez não seja realmente. Pode ser amplamente partilhado.”

Robert Stephan Cohen, advogado especializado em divórcios, disse que até casos rotineiros podem se complicar se houver SMS como prova. “É muito diferente do rumor que corre sobre um marido jantando com uma garota nos fundos de um lugar”, disse ele. “[Um SMS] está na cara do cônjuge. É lido repetidamente. É rude e doloroso.”
Texto por  LAURA M. HOLSON
Fonte: Folha New York online, 21;12;2009

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