quarta-feira, 29 de janeiro de 2014

MERCOSUL

Antonio Delfim Netto*
 

Se tomarmos distância e tentarmos discernir quais os fenômenos que caracterizam o momento em que vi- vemos, talvez possamos apontar seis deles: 

1. A evolução do clima, que, em parte, é resultado da dinâmica do sistema planetário (sobre a qual pouco podemos fazer) e, em parte, é resultado da ação do homem na apropriação da natureza finita para atender ao crescimento da população mundial. 

2. Uma globalização do sistema produtivo, estimulada pela "mundialização" financeira gestada pela livre movimentação dos capitais e pela facilidade de informação. Nela, as nações politicamente independentes são, cada vez mais, peças importantes, mas dispensáveis, na produção global. 

3. O resultado mais deplorável dessa dominância financeira foi uma exacerbada concentração de renda. A solução da grande recessão de 2007 mostrou que, em larga medida, o mercado financeiro apropriou-se do sistema político, com graves consequências: os patifes que promoveram o assalto ao cidadão incauto (sob a proteção dos olhos complacentes dos governos) estão muito bem, enquanto mais de 40 milhões de honestos trabalhadores de todo o mundo ainda estão sem emprego. A falta de uma resposta política eficiente e rápida para esse problema é uma das mais sérias ameaças à democracia. 

4. Houve, em compensação, um claro avanço das relações entre a organização econômica (o "mercado"), que o homem foi encontrando num processo de seleção histórica para satisfazer objetivos não inteiramente compatíveis, e o processo democrático (a "urna"), o que reduziu a angústia da procura de soluções mágicas para resolvê-los. 

5. Um rápido processo de urbanização, que acarreta profundas consequências ecológicas no comportamento humano e cria um ambiente vulnerável. 

6. E, finalmente, a emergência de uma forma revolucionária de interação popular paralela à da representação democrática clássica. Ela tornou-se possível pelos rápidos e incontroláveis avanços da tecnologia de informação. Ainda estamos longe de entender suas consequências práticas, a longo prazo, nas relações entre o cidadão e o Estado (que tenta controlar a tecnologia). 

Como resulta claro desses fenômenos, nenhum grupo de pequenos países pode enfrentá-los. Se, por um lado, é preciso uma coordenação mundial, por outro, é necessário o reconhecimento de cada um, por mais importante que pense ser, de que é apenas uma engrenagem pequena ou grande que, ou se integra no processo produtivo global, ou será desembreado dele! Esse será, por exemplo, o destino dos países do Mercosul se não entenderem o processo...
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* Economista.
contatodelfimnetto@terra.com.br
Fonte: Folha online, 29/01/2014
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