Tarso Genro*
Este não é um texto de reflexão sobre as
eleições no RS, que, como já afirmei – mesmo com as imperfeições do
sistema político atual – teve resultados que dão legitimidade suficiente
ao Governador eleito, para governar e aplicar suas propostas nos
próximos quatro anos. Pretendo, com ele, apenas adiantar alguns
argumentos para motivar todos os que, independentemente de partidos,
querem algo mais da democracia brasileira, para dar qualidade à esfera
da política e recuperar uma autenticidade mínima das representações
partidárias.
A Presidenta nem assumiu o seu segundo
Governo e um dos principais partidos de sustentação do seu mandato, que
tem – nada mais nada menos – que o Vice-Presidente da República, já se
prepara para bloquear as iniciativas governamentais e promover disputa
interna, para colocar na Presidência da Câmara – o terceiro posto na
ordem da sucessão presidencial – um líder do Partido que é governo, mas
que apoiou o candidato da oposição, Aécio Neves, nas eleições
presidenciais.
No Estado do Maranhão, onde o PT apoiou
oficialmente o candidato indicado pelo ex-Presidente José Sarney,
abandonando (felizmente não a maioria dos militantes) um aliado
histórico da esquerda e do PT, Flávio Dino (PCdoB), o ex-Presidente é
flagrado votando no candidato da oposição, adiantando, de uma parte, o
grande racha interno na sustentação do Governo e, de outra, comprovando a
total instrumentalização do PT maranhense pelo conservadorismo local.
No Rio de Janeiro, as mesmas
contingências levaram a presidenta Dilma a não apoiar o candidato do PT,
Lindbergh Farias, mas o candidato vencedor, Governador Pezão, que
apoiou a Presidenta formalmente, mas todo o seu “staff” (pemedebista) da
coalizão vitoriosa, deu sustentação à candidatura Aécio Neves. No Rio
de Janeiro é bom parar por aqui, sob pena da gente cair, pela esquerda,
num arroubo de direita, tipo Lobão, e dizer que dá vontade de sair do
país… Mas como amamos nosso país, o negócio é permanecer aqui, na briga
pela Reforma Política.
No Rio Grande do Sul o candidato a
Vice-Presidente na chapa da presidenta Dilma – apoiada por nós do PT-
veio a Porto Alegre e deu apoio ao candidato da oposição que, por seu
turno, como ato de coerência, sequer foi recebê-lo. Já não diria o mesmo
da ação do Vice-Presidente, que veio ao Rio Grande tentar fortalecer
candidatura que lutava contra a sua própria chapa, logo, contra a sua
eleição e a eleição da Presidenta Dilma.
Outros exemplos poderiam ser arrolados à
exaustão e “pescados” em quase todos os estados da Federação. Seria até
cômico, se não fosse trágico, pois se é verdade que a grande mídia faz
uma campanha contra os partidos e contra a política, com o objetivo de
manter uma influência mais forte do que os partidos na formação da
opinião – para transitar seu programa mínimo de integração subserviente
às políticas de austeridade da globalização neoliberal – não é menos
verdade que os partidos colaboram, com seu desprestígio, através destes
festivais de incoerência e irresponsabilidade cívica.
Poder-se-ia dizer que isso lembra
Ionesco e seu Teatro do Absurdo. Mas a situação lembra mais a decadência
da República de Weimar. A Constituição de Weimar (1919) nasceu sob o
signo do compromisso de distintas forças políticas, nem todas elas fiéis
aos princípios da Democracia e da República e espelhou, de maneira
contraditória, avanços sociais e escassos instrumentos institucionais e
financeiros para materializá-los. O mesmo aconteceu no Brasil, com a
Constituição de 88: promoveu o absurdo tabelamento da taxa de juros, mas
não criou instrumentos efetivos, por exemplo, para o acesso à terra
para quem dela precisa para trabalhar, nem instituiu um sistema fiscal e
tributário, capaz de prover fundos para o Estado responder aos Direitos
Fundamentais que a própria Constituição declarou.
Impasses como este que estamos vivendo,
só se resolvem pela iniciativa política consciente, para repactuar o
país através de um sistema político oxigenado e com novas normas de
regulamentação democrática dos partidos. Alianças verticais, para dar
identidade nacional aos Partidos, fim do financiamento empresarial das
campanhas e votação em Lista Fechada, para valorizar os partidos. Eis o
que pode ser um programa mínimo, para que a nossa Weimar tropical não
tenha o mesmo destino imprimido, naquela época, pela má consciência da
aristocracia alemã, com sua burguesia de escasso iluminismo e baixa taxa
de apreço à República.
-------------------------
* Tarso Genro é Governador do estado do RS.
Fonte: http://portal.ptrs.org.br/2014/11
Imagem da Internet
Nenhum comentário:
Postar um comentário