IVAN MARTINS*
Estar ao lado de uma mulher permite viver uma gama maior de sentimentos e expressá-los – como não se faz entre homens
Se não houvesse outra razão para gostar do convívio com as mulheres,
haveria a maneira como elas são capazes de parar pela manhã diante do
guarda-roupa escancarado e queixar-se amargamente de que não têm o que
vestir. Usualmente nuas, com as mãos nas cadeiras, fazem um beicinho
desolado. Várias vezes por semana.
Metrossexuais à parte, homens não têm esse encanto. Falta a eles
sinceridade ou imaginação. Mark Zuckerberg, o fundador do Facebook, diz
que economiza tempo e energia usando sempre a mesma cor de camiseta. Há
um exemplo feminino equivalente? Desconheço. Mulheres tendem a ser
ciosas da própria aparência. Esse é apenas um dos fatos que as distingue
positivamente dos homens.
Às vezes, quando estou enternecido, tenho vontade de fazer a lista das
coisas que tornam as mulheres adoráveis. A cena diante do guarda-roupa é
uma delas. Outra, talvez minha favorita, é a capacidade de chorar
fazendo sexo. Não qualquer sexo, em qualquer dia, mas o sexo apaixonado
que só se faz de vez em quando, cheio de ternura, beijos e juras
pornográficas de amor.
Em meio a essa festa dos sentidos, você olha cheio de lascívia nos
olhos da sua fêmea e percebe que ela chora. Por sentir-se amada,
provavelmente. Ou por alguma razão inconfessável e terrível. Não
importa. Você se comove ainda mais, tem vontade de chorar, mas não
chora. Por ser besta, por ter algo quebrado, por ser homem.
Outra coisa que me toca é a sinceridade das mulheres diante das
próprias emoções. Quando jovem, a gente se perturba com a intensidade e a
franqueza dos sentimentos delas. Está tudo à flor da pele, vem aos
borbotões, assusta. Com os anos, a gente se acostuma. Começa a perceber
que o repertório delas de medo, tristeza, alegria, raiva é mais rico do
que os áridos clichês emocionais usados pelos homens. Estar ao lado de
uma mulher permite não apenas usufruir de uma gama maior de sentimentos.
Permite expressá-los de um jeito que não se faz no convívio entre
homens.
Alguns dos melhores momentos da minha vida foram passados ao lado de
mulheres contando algo de bom que lhes tinha acontecido. A alegria delas
nessa hora é contagiante. Homens raramente são capazes de se despir da
soberba e de exibir surpresa com a generosidade da vida. As mulheres,
que não foram criadas como príncipes, expressam melhor alegria e
gratidão diante do inesperado.
É inevitável, sendo homem, amar a forma delicada como as mulheres
cuidam de si mesmas. A saúde, os planos, a agenda repleta de
compromissos. Sem falar dos filhos, claro. Tenho mais de uma amiga cheia
de responsabilidades que, vira e mexe, me surpreende com uma mensagem
do outro lado do mundo. Elas procuram passagens baratas, acham tempo
para viajar, organizam o pagamento de prestações. Ao mesmo tempo que
fazem todo o resto que mal consigo fazer. Tenho certeza de que todas
elas se tornarão velhinhas ativas e felizes, enquanto temo pelo futuro
dos marmanjos improvisadores, como eu.
Sou igualmente fascinado pela autonomia dessas criaturas. Elas
florescem na companhia de si mesmas. A solidão das mulheres me parece
uma clareira iluminada, enquanto a dos homens é um poço escuro. Sempre
tive a sensação de que a média das mulheres está mais confortável com si
mesma que a média dos homens - e isso faz diferença na hora de estar
sozinha ou de lidar com a adversidade. Os homens fogem das camas vazias e
dos quartos de hospitais. As mulheres respiram e enfrentam. Há algo de
estóico nelas que não se confunde com a caricatura das mulheres à beira
de um ataque de nervos. Quando a barra pesa, frequentemente elas são
mais serenas.
Isso não quer dizer que as mulheres sejam legais o tempo todo ou que
permanecerão adoráveis para sempre. Elas vão embora, nos abandonam,
deixam de nos amar, se tornam indiferentes, às vezes nos odeiam com uma
energia única. Não importa. Em algum lugar da nossa memória, continuarão
nuas, com as mãos na cadeira, sacudindo os cabelos molhados com enorme
desalento, reclamando, diante do guarda-roupa: “Não tenho o que
vestir!”. Oh, graças a deus!
------------------------ *Editor-executivo de ÉPOCA Autor do livro Alguém especial.
Fonte: Revista Época, acesso 28/11/2014
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