Para sociólogo francês, Brasil é
um laboratório pós-moderno ao congregar
valores como criatividade, presente e comunidade
RIO - O sociólogo francês Michel Maffesoli, um dos maiores teóricos
da Pós-Modernidade, diz não ver a economia na origem da crise mundial.
Antes, afirma o professor da Sorbonne, diretor do Centro de Estudos
sobre o Atual e o Cotidiano e do Centro de Pesquisas sobre o Imaginário
(M.S.H.), que veio ao Brasil para uma série de conferências, a crise
está, na base, na saturação de valores da Modernidade, como
individualismo, racionalidade, futuro como progresso, trabalho como
valor e utilitarismo.
Para
uma plateia formada por acadêmicos, estudantes e empresários em
conferência nesta segunda-feira na Associação Comercial do Rio em evento
organizado em conjunto com o Instituto Palavra Aberta e com o Ibmec,
Maffesoli diz ver no Brasil um laboratório da Pós-Modernidade, por
abrigar na sua cultura valores como criatividade, presente e comunidade.
Ele afirma que a sociedade de maneira geral vive um momento paradoxal
em que conceitos modernos e pós-modernos coexistem.
— A palavra democracia não quer dizer mais nada, a liberdade não está
mais na pauta do dia. O conceito de Estado-Nação dá lugar ao localismo,
ao mosaico de ideias. Não é mais o materialismo que vai predominar, a
dimensão somente econômica não vai predominar — afirma o professor, que
orientou vários estudantes brasileiros na França.
Com base nas novas tecnologias, no conceito de horizontalidade da
internet, na percepção das gerações mais jovens, Maffesoli baseia sua
série de hipóteses. Agora, segundo ele, não existe mais o indivíduo, mas
pessoas múltiplas. Não se está preso a uma identidade sexual ou
profissional, pode-se ser várias coisas diferentes e não excludentes. O
presente se contrapõe à noção de futuro. As coisas inúteis também são
importantes, haja vista que a Google quer que seus funcionários gastem
parte do tempo de seu dia pensando em outras coisas, que não apenas o
trabalho.
— O fim do mundo não é o fim do mundo, mas a sua metamorfose. Nós
vimos por muito tempo a luz de uma estrela morta — disse, ao afirmar que
ainda vivemos com os valores do século XIX.
Autor de diversos livros, ele lança no Brasil ‘Homo Eroticus - As
Comunidades Emocionais', pela editora Forense. Ao ser indagado, diz que
não comenta o livro do colega Thomas Piketty “O Capital no século XIX”
porque não o leu. Grande demais, disse. Ele diz, no entanto, que o
igualitarismo, democracia, liberdade e educação são temas que estão em
crise.
— A democracia moderna se baseia no hierárquico, mas agora há o
retorno das diferenças. Podemos pensar num ajuste das desigualdades, mas
não no fim das desigualdades. Estamos em um período em que a crueldade
vai retornar. A Modernidade foi essencialmente dramática, mas havia uma
solução, agora vamos nos virar com o que dá prá ser. Não se resolve
tudo, mas, ao mesmo tempo, há vida com sombra e luz — afirma.
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Reportagem por Clarice Spitz
Fonte: Jornal O Globo online, acesso 12/11/2014.
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