O economista americano afirma que inovações antigas transformaram a sociedade muito mais do que as atuais
Um período em ebulição tecnológica, com novidades de impacto mudando o
dia-a-dia das pessoas. Será o século 21 das redes sociais e da banda
larga? Que nada. O período em questão foi de 1929 a 1941, de acordo com
Alexander Field, professor de Economia da Universidade Santa Clara, nos Estados Unidos. Ele escreveu o livro A great leap forward: 1930s depression and U.S economic growth
(Um grande salto para frente: a depressão da década de 1930 e o
crescimento econômico americano, em tradução livre), de 2011. Na
pesquisa para o livro, Field mostrou que, entre 1929 e 1941, os Estados
Unidos passaram pelo mais rápido crescimento histórico na eficiência de
uso da mão-de-obra, das matérias primas e do capital para investimentos.
Esse ganho de eficiência, chamado pelos economistas de produtividade
total dos fatores (PTF), é uma boa maneira de mensurar o impacto das
inovações numa sociedade. “Naquela época, havia uma gama ampla de
fronteiras que podiam ser exploradas e avançadas”, diz.
Field refere-se a frentes como a difusão de automóveis e caminhões, a
melhora nos serviços de saúde e ao aprimoramento das linhas de produção
em geral – ao longo do período destacado, os EUA tiveram de enfrentar a
Grande Depressão e se preparar para a Segunda Guerra Mundial. Entre as
invenções que começaram a ser gestadas ou chegaram ao mercado nessa
época estão a comida congelada, o motor a jato, a fita magnética, o
nylon e o neoprene.
ÉPOCA – O que faz o senhor pensar que vivemos uma era fraca em inovação?
Alexander Field – Minha universidade fica no coração do Vale do Silício. E estou aqui desde os anos 80. Ou seja, eu presenciei muitas vezes a empolgação criada em torno das maravilhas da era da internet. O meu trabalho e o do [economista Robert] Gordon confirmam a visão que a aceleração da produtividade que vivemos nos anos 90 era relativamente estreita ao afetar somente tecnologia da informação e telecomunicações.
No meu livro, eu contrasto os anos 90 com o período da Grande Depressão. Não há um aparelho ou tecnologia específica que dite o caráter daquela época. O impressionante da Grande Depressão é que havia uma gama ampla de fronteiras que podiam ser exploradas. O carro teve um efeito mais amplo na sociedade que os celulares, smartphones e computadores. Minha filha ficaria magoada se eu lhe dissesse que a internet não importa. Ela não consegue imaginar como era a vida antes da web e como ficaria sem um smartphone para mandar mensagens a seus amigos. Eu sei que ele teve um impacto tremendo e não quero minimizar isso. Mas nós estamos falando comparativamente.
ÉPOCA – O que faz o senhor pensar que vivemos uma era fraca em inovação?
Alexander Field – Minha universidade fica no coração do Vale do Silício. E estou aqui desde os anos 80. Ou seja, eu presenciei muitas vezes a empolgação criada em torno das maravilhas da era da internet. O meu trabalho e o do [economista Robert] Gordon confirmam a visão que a aceleração da produtividade que vivemos nos anos 90 era relativamente estreita ao afetar somente tecnologia da informação e telecomunicações.
No meu livro, eu contrasto os anos 90 com o período da Grande Depressão. Não há um aparelho ou tecnologia específica que dite o caráter daquela época. O impressionante da Grande Depressão é que havia uma gama ampla de fronteiras que podiam ser exploradas. O carro teve um efeito mais amplo na sociedade que os celulares, smartphones e computadores. Minha filha ficaria magoada se eu lhe dissesse que a internet não importa. Ela não consegue imaginar como era a vida antes da web e como ficaria sem um smartphone para mandar mensagens a seus amigos. Eu sei que ele teve um impacto tremendo e não quero minimizar isso. Mas nós estamos falando comparativamente.
ÉPOCA
– E se estivermos próximos de atingir um ponto de virada com uma
tecnologia, tendo robôs com inteligência artificial, por exemplo?
Field – A robótica é muito empolgante. Mas, como falamos em inglês, “a prova do pudim está em comê-lo”. Há décadas, parece que estamos perto de alguma descoberta. Há muita gente no Vale do Silício atrás disso. Obviamente, o progresso em computadores, como a miniaturização e comunicação, faz isso mais possível. Mas eu não acho que nós vimos uma prova concreta da [capacidade transformadora] da robótica até agora. Ela é uma daquelas coisas que parece sempre estar prestes a acontecer. E até pode. Mas não sei se irá. Eu me lembro da primeira vez que acessei a busca do Google. Eu pensei: “Esse é o futuro das buscas”. Se pudesse comprar ações naquela época, teria comprado. Tive um momento “eureca”. Nunca vi uma demonstração de que os robôs cumprirão a promessa que muitas pessoas veem neles.
ÉPOCA – O economista Robert Gordon diz que o período de progresso tecnológico rápido da Revolução Industrial é uma exceção de 250 anos na história humana, e que a regra é a estagnação. É exagero?
Field – Nós tivemos períodos que a produtividade e renda per capita subiram antes da Revolução Industrial. Mas esses ganhos geralmente foram apagados pelo mecanismo malthusiano: quanto mais cedo os padrões de vida melhoraram, mais mulheres engravidaram, mais crianças sobreviveram e a população cresceu. A Revolução Industrial quebrou esse ciclo. Os ganhos de renda também passaram a ser associados com a transição demográfica, que é essencialmente uma queda na mortalidade e fertilidade, e permitiu um período de crescimento contínuo no padrão de vida nos últimos 250 anos. Nesse sentido, há mérito no que Gordon falou. A Revolução Industrial foi uma exceção a uma história longa de altos e baixos.
Field – A robótica é muito empolgante. Mas, como falamos em inglês, “a prova do pudim está em comê-lo”. Há décadas, parece que estamos perto de alguma descoberta. Há muita gente no Vale do Silício atrás disso. Obviamente, o progresso em computadores, como a miniaturização e comunicação, faz isso mais possível. Mas eu não acho que nós vimos uma prova concreta da [capacidade transformadora] da robótica até agora. Ela é uma daquelas coisas que parece sempre estar prestes a acontecer. E até pode. Mas não sei se irá. Eu me lembro da primeira vez que acessei a busca do Google. Eu pensei: “Esse é o futuro das buscas”. Se pudesse comprar ações naquela época, teria comprado. Tive um momento “eureca”. Nunca vi uma demonstração de que os robôs cumprirão a promessa que muitas pessoas veem neles.
ÉPOCA – O economista Robert Gordon diz que o período de progresso tecnológico rápido da Revolução Industrial é uma exceção de 250 anos na história humana, e que a regra é a estagnação. É exagero?
Field – Nós tivemos períodos que a produtividade e renda per capita subiram antes da Revolução Industrial. Mas esses ganhos geralmente foram apagados pelo mecanismo malthusiano: quanto mais cedo os padrões de vida melhoraram, mais mulheres engravidaram, mais crianças sobreviveram e a população cresceu. A Revolução Industrial quebrou esse ciclo. Os ganhos de renda também passaram a ser associados com a transição demográfica, que é essencialmente uma queda na mortalidade e fertilidade, e permitiu um período de crescimento contínuo no padrão de vida nos últimos 250 anos. Nesse sentido, há mérito no que Gordon falou. A Revolução Industrial foi uma exceção a uma história longa de altos e baixos.
ÉPOCA – A inovação funciona em ciclos?
Field – Sim. Mas não acho que eles tenham uma periodicidade que os deixem previsíveis. Leva um bom tempo para identificarmos todo o potencial de uma tecnologia. O economista Paul David, da Universidade Stanford, tem uma hipótese sobre isso e usou a eletricidade e os computadores como exemplo. Uma inovação pode levar 20, 30 ou mais anos para atingir sua amplitude máxima de aplicação. Em 1987, Robert Solow, ganhador do prêmio Nobel naquele ano, descreveu o paradoxo da produtividade. Ele escreveu no New York Times uma frase famosa, afirmando que os computadores estavam aparecendo em todos os lugares, menos nas estatísticas de produtividade. Nós só vimos os ganhos dos computadores pessoais se refletindo na produtividade em 1995. A questão é: há algo análogo agora aos computadores nas décadas de 1980 e 1990? Eu não sei. Algumas pessoas acreditam que a internet de alta velocidade ainda pode nos trazer muitos ganhos.
Field – Sim. Mas não acho que eles tenham uma periodicidade que os deixem previsíveis. Leva um bom tempo para identificarmos todo o potencial de uma tecnologia. O economista Paul David, da Universidade Stanford, tem uma hipótese sobre isso e usou a eletricidade e os computadores como exemplo. Uma inovação pode levar 20, 30 ou mais anos para atingir sua amplitude máxima de aplicação. Em 1987, Robert Solow, ganhador do prêmio Nobel naquele ano, descreveu o paradoxo da produtividade. Ele escreveu no New York Times uma frase famosa, afirmando que os computadores estavam aparecendo em todos os lugares, menos nas estatísticas de produtividade. Nós só vimos os ganhos dos computadores pessoais se refletindo na produtividade em 1995. A questão é: há algo análogo agora aos computadores nas décadas de 1980 e 1990? Eu não sei. Algumas pessoas acreditam que a internet de alta velocidade ainda pode nos trazer muitos ganhos.
Eu argumento em meu livro que o período da grande depressão nos Estados
Unidos, entre 1929 e 1941, foi o que apresentou o crescimento mais
rápido da produtividade total dos fatores (PTF) do que qualquer outro
período comparável na história americana. No setor privado, as horas
totais [de trabalho] não cresceram naquela época. E o estoque de capital
era o mesmo. Mas a produção cresceu de 32% a 40% até 1941. A PTF
cresceu, em média, 2,5% por ano. Desde então, nós nunca chegamos perto
disso. Entre 1948 e 1973, a PTF estava a 1,1% por ano. Depois, de 1973
até 1995, ficou muito baixa. Não passou de 1% por ano. Por conta do
avanço da tecnologia da informação, voltou a acelerar entre 1995 e 2005.
Recentemente, os dados andam meio confusos e não sei se estamos
retornando nem para as últimas taxas boas, entre 1995 e 2005. Há quem
seja pessimista e fale que as grandes inovações ficaram para trás.
ÉPOCA – As patentes atrasam a inovação?
Field – Sim. Elas são uma espada de dois gumes. As
patentes e o sistema de direito autoral, em uma mão, são feitos para
encorajar a inovação. Dão incentivos financeiros a pessoas que descobrem
novos processos ou produtos dando a elas o monopólio daquilo sob
determinados anos. Mas pode ser que nossa lei tenha caminhado muito
longe na direção errada. Não sabemos se devemos ceder um monopólio de
10, 25 ou 75 anos. E quando esse período é muito longo, ele pode
desencorajar e atrasar a inovação. Os efeitos tremendos de entregar o
monopólio às pessoas talvez pesem mais que os incentivos econômicos para
os inventores trabalharem mais duro.
Veja:
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Reportagem por FELIPE PONTES
Fonte: http://revistaepoca.globo.com/Ciencia-e-tecnologia/noticia/2013/02/alexander-j-field-o-carro-teve-mais-impacto-que-o-smartphone.html
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