Fernando Altemeyer Junior*
O novo papa terá o imenso desafio de cambiar modos obsoletos de
organizar a igreja, abrindo espaço para jovens, pobres e mulheres
Ainda surpreso e comovido com a renúncia do papa. Ouvi, silencioso, ao
bávaro Joseph Ratzinger dizer em latim que não tem mais as forças
necessárias para governar a Igreja e exercer o ministério petrino.
Fiquei a me perguntar: Quem será o novo sucessor de Pedro? Quem calçará
as sandálias de Jesus?
O perfil de um novo papa é a questão nevrálgica dos próximos 30 dias.
Quem deve ser papa para receber a herança valiosa do Concílio Vaticano
2º e fecundá-la? Quem tem o rosto de pastor universal para essa hora
decisiva? Seria um intelectual como Bento 16? Um ator, atleta e místico
como João Paulo 2º? Um amigo dos pobres como João 23? Um homem do
diálogo como Paulo 6º?
Há questões emergentes na sociedade: o terrorismo e o crescimento dos
fascismos em tantos países; o ateísmo militante e o agnosticismo
desafiador; a luta da mulher e das culturas como expressões autênticas
em um mundo globalizado; as crises éticas que desfiguram a política e as
instituições; os pecados mortais na Igreja como o escândalo da
pedofilia perpetrado por sacerdotes contra crianças; o reconhecimento
dos direitos dos povos africanos na luta por liberdade e paz; e a
candente questão ecológica.
Há o imenso desafio de cambiar modos obsoletos de organizar a
instituição eclesial, abrindo espaço para que os jovens participem
plenamente; que os pobres digam suas palavras utópicas e que elas
reverberem na alma de toda a Igreja; que as mulheres possam agir em
novos ministérios eclesiais instituídos, reconhecidos e celebrados; que
nossas igrejas e paróquias tornem-se vivas e participativas.
Precisamos de um papa que confie nos teólogos, nos padres, nas
religiosas e, sobretudo, nos leigos e leigas missionários. Um papa que
canonize subitamente dom Romero, Enrique Angelelli e a irmã Dorothy
Stang. Um papa maestro de orquestra e não virtuose solitário de um único
instrumento. Um papa de sandálias, que caminhe como bom pastor.
Um papa de sorriso fácil. Um papa que ame e defenda a família. Um papa
profeta, que enfrente a violência contra homossexuais, crianças, negros,
jovens, mulheres e povos indígenas. Um papa que não se submeta à
mentira e proclame as bem-aventuranças do Evangelho.
Quer seja italiano, africano, brasileiro (sim, poderemos viver essa
alegria) ou até filipino, que assuma a causa ecumênica como prioridade
pessoal e primordial: busque, plante, reze, cuide e construa a união
plural entre as igrejas cristãs: ortodoxas, anglicanas, protestantes e
pentecostais.
Um papa capaz de caminhar com judeus, islâmicos e gente de todas as fés.
Um papa capaz de dizer aos ateus que são muito amados porque creem no
humano que, para nós,é divino. Precisamos de um papa paternal e,
paradoxalmente, maternal.
Um papa capaz de uma misericórdia uterina por ser fiel discípulo de
Jesus. E com fé imensa capaz de um milagre: comover o coração da
humanidade! Os novos rumos da Igreja estarão nas mãos e, sobretudo, no
coração do novo bispo de Roma: que ele tenha como bússola a fé vivida e
professada.
O sonho de cada cristão será o de ouvir ressoar da janela vaticana uma
voz firme e serena no dia da posse: "Coragem, irmãos e irmãs! Vamos de
esperança em esperança! Encorajem os crucificados, propondo-lhes a
ressurreição e a paz, em nome de Jesus, o Vivente!". O perfil de um novo
bispo de Roma será, assim, o do bom samaritano.
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FERNANDO ALTEMEYER JUNIOR, 56, mestre em teologia e doutor em
ciências sociais, é professor de ciências da religião da Pontifícia
Universidade Católica de São Paulo
Fonte: Folha on line, 17/02/2013
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