sexta-feira, 8 de fevereiro de 2013

Individualismo

J. B. Libanio*

Nós, cristãos, com razão, estamos habituados a considerar o individualismo sob o ângulo moral religioso. Opõe-se à atitude evangélica. Jesus Cristo viveu existência centrada em Deus Pai e no irmão. E mostrou-nos que aí reside a verdadeira felicidade do ser humano.

Constitui-se dado evidente da fé, já faz dois milênios de pregação. E por que a sociedade cada dia parece mais individualista? Que fatores sociais e culturais têm influenciado tanto a ponto de neutralizar o coração do anúncio de Jesus?

Um pensador francês afirma sem rodeios que o individualismo é a ideologia da modernidade. E entende por ideologia o conjunto de valores, de ideias, de símbolos que nos configuram a visão do mundo. Isso quer dizer então que o cidadão moderno vê todas as coisas a partir da ótica individualista. Soa terrível, mas parece verdade.

Cada um de nós é provocado então a perguntar-se, se realmente, quando vai tomar uma decisão, quando vai escolher uma profissão, quando aceita um emprego, o seu espontâneo e principal olhar se dirige a si próprio, a seus interesses. Quando julga os acontecimentos, quando analisa a situação, a sua ótica primeira é o próprio interesse. Então o filósofo francês tem razão.

Se, porém, o bem comum, a vocação cívica, a consciência de cidadania, a perspectiva social ocupam o primeiro lugar, significa que nos afastamos da ideologia individualista.

Convergem para a criação de tal visão de mundo, tanto o pensamento centrado no sujeito, como o sistema econômico voltado para a iniciativa pessoal em vista do maior lucro. Respiramos tal ar todo o tempo. É-nos então difícil escapar do peso dessa influência.

Além disso, tal cultura casa com o instinto de autodefesa. Os instintos são as defesas avançadas de nossa vida. E funcionam por primeiro. Há instintos individuais e instintos sociais. Mas mesmo os sociais convergem para a proteção do indivíduo. Desta sorte, o instinto de sobrevivência individual leva-nos a alimentar-nos, a cuidar das necessidades básicas com ferocidade primordial. O instinto procriativo exerce também forte pressão sobre o indivíduo.

A cultura humaniza os instintos. Desde o comer, transformando o gesto animal em ato tão bonito e fraterno, como é a refeição entre amigos. Assim por diante. Ora bem, só a cultura consegue orientar o instinto individualista para atitude social. Para tanto, o evangelho oferece excelente contribuição, ao converter as pessoas para a saída de si em direção ao irmão. Trava-se verdadeira batalha entre a cultura ocidental capitalista, que reforça o instinto individualista, e o anúncio da mensagem de fraternidade e serviço. Anima-nos, porém, a certeza de que as pessoas perceberão a força humanizante da cultura do outro, que encontra na pessoa, mensagem e prática de Jesus exemplo perfeito.
--------------
* Teólogo jesuíta. Licenciado em Teologia em Frankfurt (Alemanha) e doutorado pela Universidade Gregoriana (Roma). É professor da FAJE (Faculdades Jesuítas), em Belo Horizonte
Fonte:  http://www.adital.com.br/site/noticia.asp?boletim=1&lang=PT&cod=73473
Imagem da Internet

Nenhum comentário:

Postar um comentário