J. B. Libanio*
Nós, cristãos, com razão, estamos habituados a considerar o
individualismo sob o ângulo moral religioso. Opõe-se à atitude evangélica.
Jesus Cristo viveu existência centrada em Deus Pai e no irmão. E mostrou-nos
que aí reside a verdadeira felicidade do ser humano.
Constitui-se dado evidente da fé, já faz dois milênios de
pregação. E por que a sociedade cada dia parece mais individualista? Que
fatores sociais e culturais têm influenciado tanto a ponto de neutralizar o
coração do anúncio de Jesus?
Um pensador francês afirma sem rodeios que o individualismo
é a ideologia da modernidade. E entende por ideologia o conjunto de valores, de
ideias, de símbolos que nos configuram a visão do mundo. Isso quer dizer então
que o cidadão moderno vê todas as coisas a partir da ótica individualista. Soa
terrível, mas parece verdade.
Cada um de nós é provocado então a perguntar-se, se
realmente, quando vai tomar uma decisão, quando vai escolher uma profissão,
quando aceita um emprego, o seu espontâneo e principal olhar se dirige a si
próprio, a seus interesses. Quando julga os acontecimentos, quando analisa a
situação, a sua ótica primeira é o próprio interesse. Então o filósofo francês
tem razão.
Se, porém, o bem comum, a vocação cívica, a consciência de
cidadania, a perspectiva social ocupam o primeiro lugar, significa que nos
afastamos da ideologia individualista.
Convergem para a criação de tal visão de mundo, tanto o
pensamento centrado no sujeito, como o sistema econômico voltado para a
iniciativa pessoal em vista do maior lucro. Respiramos tal ar todo o tempo.
É-nos então difícil escapar do peso dessa influência.
Além disso, tal cultura casa com o instinto de autodefesa.
Os instintos são as defesas avançadas de nossa vida. E funcionam por primeiro.
Há instintos individuais e instintos sociais. Mas mesmo os sociais convergem
para a proteção do indivíduo. Desta sorte, o instinto de sobrevivência
individual leva-nos a alimentar-nos, a cuidar das necessidades básicas com
ferocidade primordial. O instinto procriativo exerce também forte pressão sobre
o indivíduo.
A cultura humaniza os instintos. Desde o comer,
transformando o gesto animal em ato tão bonito e fraterno, como é a refeição
entre amigos. Assim por diante. Ora bem, só a cultura consegue orientar o
instinto individualista para atitude social. Para tanto, o evangelho oferece
excelente contribuição, ao converter as pessoas para a saída de si em direção
ao irmão. Trava-se verdadeira batalha entre a cultura ocidental capitalista,
que reforça o instinto individualista, e o anúncio da mensagem de fraternidade
e serviço. Anima-nos, porém, a certeza de que as pessoas perceberão a força
humanizante da cultura do outro, que encontra na pessoa, mensagem e prática de
Jesus exemplo perfeito.
--------------* Teólogo jesuíta. Licenciado em Teologia em Frankfurt (Alemanha) e doutorado pela Universidade Gregoriana (Roma). É professor da FAJE (Faculdades Jesuítas), em Belo Horizonte
Fonte: http://www.adital.com.br/site/noticia.asp?boletim=1&lang=PT&cod=73473
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