segunda-feira, 25 de fevereiro de 2013

Por que eu deveria ser papa.

 James Martin*

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Ele não é um novato em textos de efeito: é um grande comunicador e possui uma boa dose de humorismo, começando sobre si mesmo. O padre jesuíta James Martin, redator da revista America, dos jesuítas dos EUA, escreveu uma carta endereçada aos cardeais eleitores para convencê-los a votar... nele mesmo. Uma espécie de Habemus Me.

O artigo foi publicado no sítio da revista America, 21-02-2013. A tradução é de Moisés Sbardelotto.

Eis o texto.

Caros Cardeais,

Eminências, eu sei que vocês tem um trabalho duro pela frente no conclave. Vocês têm que fazer o impossível: eleger alguém que seja supersanto, superinteligente, que fale uma dúzia de idiomas e que possa dirigir um conglomerado internacional. E, se eu posso ser um pouco brusco, as probabilidades são de que vocês não podem conhecer todos que estarão na sala naquele dia.

Especialmente se vocês recém-receberam aquele barrete vermelho, vocês poderão estar sentados na Capela Sistina, ouvindo alguém falando em francês sobre aggornamiento e ressourcement, e ficar muito envergonhados ao dizer a quem estiver do seu lado esquerdo: "Que diabos é isso?". Além disso, todos meio que parecem iguais: cabelos grisalhos, barrete vermelho, óculos. É difícil diferenciá-los, não importa quantos desses acessíveis infográficos "Quem é Quem" vocês possam ter estudado.

Então, para facilitar as coisas, eu gostaria de sugerir um candidato sobre o qual vocês podem não ter pensado, mas, após alguns segundos de reflexão, vocês saberão que ele é quem vocês estavam procurando: eu.

Aqui estão 12 razões pelas quais vocês devem me eleger papa:

1. Eu sou homem. Isso já é metade do caminho, certo?

2. Eu sou batizado. E tenho os documentos para provar. Não há nenhuma controvérsia de origem aqui.

3. Eu falo diversas línguas. Não muito bem, mas, vocês sabem, quem realmente fala bem? Eu falo inglês, como vocês podem ver a partir deste pequeno ensaio. E adivinhem: Bonjour! É isso mesmo: francês! Eu comecei a estudar français quando eu estava na sétima série. (Reparem que eu usei aquela coisinha embaixo do "c"). Isso significa que eu posso falar com praticamente toda a África ocidental e a França: isso é um monte de católicos. Infelizmente, se eu tiver que usar o subjuntivo ou o imperfeito, estamos sem sorte, mas tudo o que tenho a fazer é evitar dizer "Se eu fosse" em qualquer uma das minhas encíclicas, e estamos feitos. Mas há mais: Hola! É isso mesmo: eu falo espanhol. Mais ou menos. Ou, "Más o menos", como dizemos. Agora, nesse caso, eu realmente não posso lidar com os tempos passados ou futuros, mas tudo bem, porque isso significa que eu falarei tudo no presente – o que vai me fazer soar como alguém forte e confiante. Vocês sabem, "Agora é a hora!". Ou "Ahora es la... bem, ora, eu acho". De qualquer forma, há muitos e muitos católicos de língua espanhola e, assim que ouvirem a minha versão de De Colores, eles ficarão vidrados no Servo dos Servos de Deus muy rapido.

4. Eu sou meio italiano. Eu quase ia me esquecendo: Ciao! Eu sou meio italiano. Pelo lado da minha mãe. Então, assim que eu for Bispo de Roma, eu facilmente serei capaz de lidar com quaisquer problemas da Cúria, porque todas as autoridades curiais italianas irão instantaneamente reconhecer-me como um paesan. Escândalos? Finito! Má gestão? Basta! A minha eleição também irá satisfazer quem procura um papa italiano: ou seja, todos os cardeais italianos, que vocês definitivamente querem do seu lado. A outra metade de mim, a propósito, é irlandesa, o que ajuda muito nos Estados Unidos, podem acreditar.

5. Eu trabalhei na África. Eu quase me esqueci da minha outra língua. Jambo! É isso mesmo! Eu falo suaíli. Ou kiswahili. (Isso é suaíli em suaíli.) Bem, ao menos eu costumava falar. Eu trabalhei no Quênia por dois anos. Então, para todas aquelas pessoas que querem um papa do mundo em desenvolvimento, bem, eu não sou exatamente de lá, mas há três bebês que foram batizados com o meu nome enquanto eu trabalhava no Quênia. (Eles não são meus, se isso for uma preocupação). Isso deve contar para alguma coisa.

Agora que vocês sabem que eu falo inglês, espanhol, francês e suaíli, vocês provavelmente devem estar pensando: "Puxa, por que não o Jim como Pontifex Maximus?". Por que vocês não compartilham esse pensamento com o homem de vermelho sentado ao seu lado?

6. Livros. Vocês provavelmente querem um papa que seja literato, mas talvez não alguém que passe tanto tempo escrevendo livros, com todas as coisas com as quais ele tem de lidar. Eu sei que essa era às vezes uma crítica ao Papa Bento XVI – não que eu esteja atirando pedras! Mas eu já escrevi os meus livros, por isso, quando eu estiver no Vaticano, eu vou estar 100% trabalhando. Nove horas, cinco dias por semana. Os fins de semana também, se as coisas ficarem realmente cheias. Domingos, é claro, eu estarei disponível para as missas.

7. Experiência de trabalho. Falando em trabalho – adivinhem! –, eu tenho uma graduação pela Wharton School. Essa é uma das maiores faculdades de negócios aqui nos Estados Unidos. Além disso, eu trabalhei na General Electric por seis anos. Então, aqui vai uma boa notícia: digam arrivederci a quaisquer problemas de gestão na Cúria. Já ouviram falar da Administração por Objetivos? A propensão marginal ao consumo? Os "4 Ps" do marketing? Vocês ouvirão falar, depois que eu for Sumo Pontífice. Esse lugar vai funcionar como uma máquina. Uma máquina que faz dinheiro, também.

8. Eu sou ordenado. Quase me esqueci: eu já sou um sacerdote ordenado. Isso significa que, como eu correspondi com todos os outros requisitos, a única coisa que faltava para mim era estar disposto a ser ordenado bispo. E adivinhem: eu estou disposto. Agora, deixem-me antecipar uma objeção menor. Aposto que vocês sabem que eu fiz um voto como jesuíta a não "lutar por ambição" por qualquer alto cargo na Igreja, mas eu tenho uma forma apropriada, fácil e canonicamente factível para contornar esse obstáculo. Assim que vocês me elegerem papa, eu vou ser o meu próprio superior! Depois que eu vestir aquelas vestes brancas, eu posso chamar o superior-geral dos jesuítas e dizer: "Ei, que tal você me deixar aceitar essa ordenação como bispo e a minha eleição como papa?". E eu acho que ele vai ter que dizer que sim, porque ele recebe ordens de mim. Problema resolvido. Além disso, eu não estou lutando por ambição, de qualquer forma. Estou fazendo campanha.

9. Formação. O processo de formação jesuíta é muito, muito, muito longo. Eu nem me lembro quantos anos eu estudei. Isso significa que eu estudei filosofia (bom saber), teologia (muito bom saber) e um monte de outras coisas como história da Igreja, o que eu acho que seria muito útil como papa. E adivinhem? Eu sei grego antigo, também. Isso realmente impressiona os tipos acadêmicos da Igreja. Por exemplo, quando os estudiosos me perguntarem: "Qual tradução do Novo Testamento você está usando?", eu vou dizer: "A minha tradução". Eles adoram esse tipo de coisa. E mais, isso também tem apelo junto à demografia de fala grega antiga da qual a Igreja pode ter desistido.

10. Disposto a viajar. Ok, eu admito. Eu não sou louco por viagens aéreas, por todos os atrasos e pelo fato de ter que tirar os sapatos e de sentar ao lado de alguém que fica tossindo o pulmão para fora, mas eu me dei conta de que isso não será um problema. O pontífice tem o seu próprio avião: Shepherd One. Então, quando vocês instalarem filmes grátis no meu avião dourado e branco, eu vou ficar dourado e branco de tão feliz. Eu irei aonde vocês quiserem que eu vá. Até os confins da terra, se for preciso. Contanto que eu ganhe um pacotinho extra de amendoins.

11. Humildade. Eu já posso prever qual será a última objeção de vocês: a minha campanha para ser papa pode me fazer parecer um pouco menos humilde do que se poderia esperar. Mas o fato de eu estar disposto a fazer campanha não é um sinal da minha humildade? Um cara menos humilde assumiria que todo mundo já sabe que ele seria um bom candidato e, por isso, não diria nada mais do que o seu orgulho. Meio contraintuitivo, não? Isto é: como eu estou fazendo campanha, sou o máximo no que se refere a humildade.

12. Nome legal. Todo mundo sabe que a primeira grande decisão do papa é escolher o seu nome. E mais, eu sei que todo mundo está sempre preocupado com a continuidade. Com isso em mente (eu gosto de pensar no futuro, o que é uma boa característica), eu já escolhi o meu nome. Como vocês sabem, o sucessor do Papa Paulo VI escolheu o nome "João Paulo I" para mostrar a sua continuidade com o Papa João XXIII e com Paulo VI. Todo mundo ficou muito impressionado com isso. Depois, vocês tiveram João Paulo II. Mais continuidade. E, claro, em seguida, tivemos (ou temos, dependendo de quando vocês estiverem lendo isso) Bento XVI. Se vocês me elegerem, e eu espero que o façam, depois de eu dizer "Accepto" (vejam que eu também falo um pouco de latim), eu escolheria o meu nome: João Paulo Bento I. Isso leva em consideração todo mundo, de João XXIII a Bento XVI. Mais continuidade. É claro que pode demorar um pouco para que alguns se acostumem a dizer "JPB1", mas os católicos são bastante flexíveis, e eu aposto que em pouco tempo haverá muitos bebês batizados com o nome de João Paulo Bento.

Enfim, espero que isso lhes ajude a facilitar uma decisão difícil, Suas Eminências. Será que eu não deixei nada de fora? Bem, eu sou um rápido digitador, posso desenhar muito bem e sei contar algumas piadas realmente engraçadas. Por exemplo, aqui está uma boa: "O que o jesuíta disse quando foi eleito papa?"

Só há um jeito de descobrir.
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* O padre jesuíta James Martin, redator da revista America, dos jesuítas dos EUA.
Fonte: IHU on line, 2013
Imagem da Internet

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