Leonardo Boff*
Fazei
com que eu procure mais amar, que ser amado.
De repente, sei que estou no coração e
na mente de outra pessoa. Sou para ela um valor inestimável. Acompanha-me em
cada gesto, procura saber cada pormenor da minha história, valoriza cada
palavra minha e intui amorosamente cada intenção, por mais secreta que seja.
Aquele que ama vive num estado de
consciência alterado. Perde o interesse por si mesmo e entrega-se a forças que
o arrastam irrefreavelmente na direcção da pessoa amada. Esta aparece aos seus
olhos como única e diferente de todas as demais no Universo. Experimenta um
estado de arrebatamento e de potencialização de sentido que, em função da
pessoa amada, reorganiza toda a vida.
Todos querem ser amados; pois todos
anseiam ser únicos para alguém. A frase mais triste que ouvi foi de uma jovem
assistente social, mulher simples do povo, sem grandes dotes de beleza, segundo
as pobres convenções da nossa cultura material: "Eu nunca fui amada; nunca
fui interessante para ninguém; ninguém até hoje olhou para mim." E os seus
olhos traíam uma tristeza infinita. Uma mágoa profunda com a vida ingrata e
cruel pesava em cada uma das suas palavras. O Universo parecia ter desabado
sobre ela.
Sem amor, a vida perde significado e
densidade. Tudo fica irrelevante e sem valor. É fundamental para o brilho da
existência sentirmo-nos amados e acolhidos com enternecimento por aqueles que
nos cercam. Por detrás do ateísmo, do gnosticismo e do indiferentismo talvez
esteja essa experiência devastadora: a incapacidade de alguém se sentir
acolhido como num útero, aceite como no seio de uma família e amado
incondicionalmente por uma pessoa.
Porque temos esta necessidade
inarredável de sermos amados? Porque nós, seres humanos, desde que nascemos
mostramos a tendência para nos unirmos a algo que nos realize, a algo que nos
transcenda. As ciências da Terra dizem que esse algo representa a acção da seta
do tempo e do impulso da evolução a empurrar-nos sempre para a frente e para
cima, de convergência em convergência, na direcção de uma culminância suprema.
Os especialistas da psique humana aventam a ideia de que esse desejo de união
representa a memória ancestral da nossa vida no útero materno. As religiões
ensinam que esse algo é a ânsia por Deus como Alfa e Omega da nossa vida. Seja
como for, o ser humano, ao sentir-se amado, vive a experiência de ter resgatado
o paraíso terrestre ou ter chegado à Terra da Promissão.
Que significa procurar mais amar, que
ser amado? É o convite para darmos o salto por cima de nós mesmos, para
podermos propiciar amor ao outro e aos outros. Ao amar o outro, queremos que
ele experimente uma absoluta realização - ser amado - e se sinta
existencialmente o centro afectivo do nosso universo. Pois é exactamente essa a
experiência que o amor nos permite fazer.
Amar mais do que ser amado é, então, a
força de sairmos de nós mesmos e de nos centrarmos no outro por causa do outro
- dando-lhe valor, cuidado, ternura, cordialidade e convivialidade. São
Francisco conseguiu amar os leprosos e todas as criaturas como irmãos e irmãs
muito queridos. Por isso o seu universo é cheio de unção, enternecimento e
respeito, porque permite que todos se sintam amados.
Esta atitude de um amor maior pode
resgatar a humanidade ameaçada e salvar a vida do planeta Terra. Quem tem este
tipo de amor superabundante conquista tudo: o próprio coração, a salvação
eterna e Deus mesmo.
Ó Mestre, fazei que eu procure mais
amar, que ser amor.
Que eu acolha com generosidade e alegria o amor que me é
dado,
mas que me empenhe sobre tudo em fazer com que os que me cercam se sintam
amados.
Fazei que nos sintamos amados por Vós para experimentarmos
a suprema
felicidade concedida nesta vida.
Amém.
------------------------ [Publicado em A Oração de São Francisco: Uma Mensagem de Paz para o Mundo Atual. Ed. Sextante].
(*) NdE.: Português de Portugal.
Fonte: http://www.adital.com.br/19/02/2013
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