Antonio Prata*
Deixemos os presídios para quem mata ou rouba dinheiro público, não para quem precisa de tratamento médico
Dos 15 aos 20 e poucos anos, fumei maconha pelo menos uma vez por
semana. Confesso que nem achava muito bom, era o típico cara que fuma só
porque está todo mundo fumando; ficava mais confuso do que relaxado,
sem saber se punha as mãos nos bolsos ou cruzava os braços, se ia ouvir
Pink Floyd no escuro ou comer melancia com ketchup. Finda a
adolescência, percebi que a cannabis não era mesmo a minha e parei. Não
tive que tomar nenhuma atitude drástica, reunir força de vontade, buscar
ajuda: simplesmente deixei de usar e não senti a menor falta.
Não estou dizendo que maconha não vicia. Entre os vários amigos meus que
a consomem regularmente um é viciado. É advogado tributarista, casado,
pai carinhoso e fuma umas duas vezes por dia. Compare-o a um alcoólatra e
fica claro que, mesmo no pior cenário, os males da maconha são menos
graves do que os de uma droga lícita.
Não estou afirmando, tampouco, que a maconha não faz mal. Certamente
esse amigo que fuma diariamente tem mais chances do que eu de, no
futuro, desenvolver um câncer de pulmão --e mais dificuldade para, de
manhã, se lembrar de onde colocou as chaves--, mas a escolha é dele. O
pulmão e as chaves, também.
A vida é muitas vezes chata, é quase sempre dura, é definitivamente
curta. Por isso uns bebem, outros fumam, ingerem mais gordura saturada
do que recomenda a Organização Mundial da Saúde e há até quem salte de
asa-delta, sem que o Estado se meta em suas vidas.
Tudo isso posto, fiquei muito contente, semana passada, ao encontrar nos
jornais, entre Felicianos e Malufs, vans e panelas de pressão, a
notícia de que sete ex-ministros da Justiça encaminharam ao STF uma
carta recomendando a descriminalização do uso de drogas.
Que a maconha deveria ser legalizada já, plantada e fumada por quem
quisesse, não tenho a menor dúvida. Quanto às outras drogas, é preciso
analisar bem como proceder, para que não se resolva apenas o lado do
consumidor do asfalto, mantendo a tragédia do tráfico nos morros e
periferias.
Felizmente, além dos ex-ministros, há muita gente gabaritada pensando em
como desatar esse nó. Ano passado, foi criada a Rede Pense Livre
(migre.me/efd02), um grupo apartidário, com membros de diversas áreas
--da antropologia ao mercado financeiro, da direita e da esquerda; gente
de terno, de piercing, de terno E de piercing--, cujo objetivo é
rediscutir a atual política brasileira referente às drogas --e mudá-la.
Parte da premissa de que a estratégia atual, a guerra, não funcionou e
propõe a descriminalização.
O mal que a "guerra às drogas" causa à sociedade é infinitamente
superior aos danos que as substâncias causam a seus indivíduos. Hoje,
mais de 130 mil pessoas (1/4 da população carcerária brasileira) estão
na cadeia por alguma relação com entorpecentes; são jovens, em grande
parte, cujos futuros o contribuinte paga caro para arruinar, mantendo-os
atrás das grades.
Deixemos os presídios para quem mata, quem estupra, quem desvia dinheiro
público e deposita nas ilhas Jersey: não para quem precisa de
tratamento médico ou nem isso, quem só quer esquecer um pouco dos
problemas, ouvir Pink Floyd e --por que não?-- comer melancia com
ketchup.
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* Colunista da Folha
Fonte: Folha on line, 25/04/2013
Imagem da Internet
Comercio e uso um ato normal, de alcool e outras drogas no Brasil, pois até a presente data somente temos irracionalidade uma em cima da outra, conforme texto abaixo:
ResponderExcluirCapitulo - MUNDIALIZAÇÃO E CRIMILIDADE
JOSÉ LUIZ DEL ROIO
PESQUISADOR DO NÚCLEO DE ESTUDOS DA VIOLÊNCIA DA USP E DIRETOR DO CENTRO STUDI PROBLEMI INTERNAZIONALI DI MILANO
....... South Central é um dos maiores e mais pobres bairros onde vivem os negros de Los Angeles. Praticamente uma geração de seus jovens foi devastada pelo crack. Morte, doenças, loucura e criminalidade é o que vivem no dia-a-dia os seus habitantes. A partir de 18 de agosto de 1996, um jornal local, o San José Mercury News, publicou uma série de artigos, resultado de um alto jornalismo investigativo, onde contava detalhadamente como a droga se apoderou daquele território. É uma historia menos que se insere no interior de uma moldura vasta conhecida com Irangate.
Os que possuem boa memória se recordarão do processo contra o coronel Oliver North, que terminou com sua condenação. Os atos deste processo demonstraram com nomes e fatos que por vários anos a CIA (Central Intelligence Agency ) e a DEA estiveram em contato com os chamados cartéis colombianos, protegendo a entrada de drogas nos Estados Unidos. Tal operação servia para encontrar fundos ilegais para financiar as forças opositoras ao governo sandinista da Nicarágua. Lembremos também que estes fatos foram provados por uma comissão do Senado, presidida pelo já citado senador John Kerry.
É neste clima que Danilo Brandon, pertencente a uma das famílias mais ricas da Nicarágua e expoente do partido anti-sandinista Fuerza Democrática, entra em contato com Ivan Meneses, pequeno criminoso, já fichado pela policia norte-americana. Juntos encontram em Honduras um tal de coronel Bermudez, regularmente pago pela CIA, que lhes propõe traficar a cocaína da Colômbia para o interior dos EUA para conseguir fundos. Entram em contato com o chamado cartel de Cáli e tentam entrar no mercado de Beverly Hills, famoso bairro onde se concentram os ricos de Hollywood. Porem, os canais já estão ocupados por outros bandos de criminosos. Experimentam então com as zonas mais pobres de Los Angeles, mas a cocaína custa muito para os bolsos dos jovens e o preço do mercado não deve ser rebaixado porque entrariam em conflito com outras quadrilhas.
Os valentes “combatentes pela liberdade” encontram-se num impasse, ate que uma inovação tecnológica vem resolver seus problemas. Através dos cristais que restam da fabricação da cocaína, é possível fabricar uma droga muito mais barata e mortal, adequada aos pobres, que será chamada de crack. Eis que os guetos negros de Los Angeles, aonde o desemprego juvenil chega a 45%, pode ser inundado com o novo produto. Por cinco anos, de 1983 a 1987, os contras nicaragüenses, com a cobertura de organismos oficiais, despeja 100 quilos de cristais de coca semanais sobre South Central. Os lucros são lavados em Miami e partem para a América Centra para alimentar a subversão contra o de Manágua.
Ao tomar conhecimento destes fatos, a comunidade negra justamente se rebela e exige a abertura de um processo que lance luz sobre os episódios e condene os culpados. A reação da administração Clinton é hesitante, e faz-se de tudo para sepultar o episodio. O jornal conservador Washington Post, mesmo reconhecendo que a CIA conhecia pelo menos parte das atividades dos traficantes e que não fez nada para bloqueá-los, tenta desmoralizar os artigos publicados pelo San José Mercury News, dizendo que as quantidades de cristais de coca que entraram em Los Angeles por mãos dos contras nicaragüenses não foram 27 000 quilos, mas apenas 5 000 !!!
Paginas 120 a 122
LIVRO – DROGAS : A HEGEMONIA DO CINISMO
ORGANIZADORES – MAURIDES DE MELO RIBEIRO E SERGIO DARIO SEIBEL - ANO 1997 – 353 PAGINAS – ISBN 85-85373-16-4
FUNDAÇÃO MEMORIAL DA AMÉRICA LATINA - DEPARTAMENTO DE PUBLICAÇÕES
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