COM A PALAVRA: ANTÔNIO DELFIM NETTO
Antônio Delfim Netto é daqueles personagens que desperta admiração ou raiva, mas não indiferença. Assumiu o Ministério da Fazenda em 1967, aos 39 anos, e ainda comandou a Agricultura, em 1979, e o Planejamento de 1979 a 1985. Pilotou a fase mais longa e de maior crescimento da economia, mas deu um choque no câmbio e congelou salários. Em 13 de dezembro de 1968, assinou o AI-5, que suspendia direitos individuais. Em fevereiro passado, admitiu que voltaria a assinar. Na entrevista em seu escritório em São Paulo, diz que repetiria também as medidas econômicas do período que chama de “regime autoritário”. Mais de quatro décadas depois, segue influente. Conselheiro do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e de Dilma Rousseff, aponta temor com uma suposta disposição do governo de ter um “capitalismo sem lucro”. E virou guru. Depois que advertiu para a formação de uma “tempestade perfeita” em 2014 – fatores combinados que detonam uma crise –, ganhou eco do ex-presidente do Banco Central Armínio Fraga. Aos 85 anos, Delfim mantém a verve e a ironia. Para não dar detalhes sobre as conversas com Dilma, faz uma ginástica verbal: – Na minha opinião, é totalmente invenção da imprensa.
Como funciona sua consultoria econômica ao governo Dilma?
Você acredita na imprensa? (risos) Não existe isso. Uma vez ou outra ela me honrou com um convite, mas não sou assessor nem conselheiro. Tenho grande admiração pela presidente, é uma tecnocrata muito competente, muito trabalhadora, tem ideias todas na direção correta. Na implementação, sempre há problemas, mas ela está plantando um Brasil que vai voltar a crescer.
Quantas vezes vocês conversaram?
Nunca contei.
Então foram muitas...
Na minha opinião, é totalmente invenção da imprensa (risos).
Como vê a economista Dilma?
Ela tem uma ideia muito clara sobre a realidade. Por exemplo, o caso da energia elétrica. Precisava mesmo baixar a tarifa de energia. Talvez a antecipação dos contratos tenha sido um pouco prematura. Houve uma coincidência, o tempo andou muito mal, e foi preciso usar usinas termelétricas. Tudo isso vai ser dissipado. Daqui a dois, três anos, a baixa de energia vai ser visível, e você vai tirar proveito disso. É que no começo sempre é muito difícil mudar as coisas.
Mas o mandato atual não está mais perto do fim do que do começo?
Pode estar no começo de outro mandato. Houve um aprendizado muito grande. O governo está mudando. É muito importante para o Brasil esse acordo com o Congresso de que não se colocará em pauta medidas de aumento de despesa ou redução de receita. A situação fiscal se complicou, e isso produziu um mal-estar, levou as agências de risco a fazer ameaça de redução de rating, mas está mudando.
O senhor teme uma “tempestade perfeita” no Brasil em 2014...
É isso mesmo. Houve uma mudança importante no governo causada pela compreensão do mal-estar em relação à política fiscal, resultado também de certo desconforto com as alquimias fiscais. Caminhamos para um aumento da dívida bruta fiscal, que não é exagerada, mas é quase o dobro dos outros países emergentes. E vai haver uma redução no estímulo monetário americano. Se não forem tomadas medidas concretas, enérgicas, vai haver a tempestade perfeita, com choque de câmbio e interrupção do crédito. As medidas preventivas vão resolver. Está cada vez mais visível que o governo aprendeu. É uma coisa que eu sempre dizia e as pessoas não acreditavam: com o tempo suficiente, até o PT aprende.
O que o governo aprendeu?
A mudança na disposição do governo de colocar suas concessões com muito mais inteligência e competência do que no passado. O sucesso de Libra (primeiro leilão exclusivo de área do pré-sal), porque só participou quem quer tirar óleo. As grandes estavam tentando retardar a extração do petróleo no Brasil. Não há defeito no projeto. O sucesso no leilão de aeroportos mostra que o governo aprendeu que a concessão de serviços públicos, na verdade, é a concessão do monopólio público para o monopólio privado. E o mercado entendeu que a preocupação que a Dilma tinha com a modicidade tarifária (preço baixo para o usuário) é legítima, não uma hostilização ao setor privado. Tanto é verdade que agora está ficando cada vez mais claro que você não pode controlar as duas variáveis da concessão. Ou controla a qualidade ou a taxa de retorno. Se opta pela qualidade, a taxa de retorno vai ser fixada num leilão bem feito.
Será possível reconstruir a ponte entre a Fazenda e o empresariado?
Acho que sim. O que havia era uma desconfiança em relação ao que supunham que era a filosofia do governo. E de onde tiravam? Se ela (a presidente) quer tarifa baixa, não quer que eu tenha lucro. Agora compreenderam que a preocupação é legítima, e a modicidade será a possível.
Você acredita na imprensa? (risos) Não existe isso. Uma vez ou outra ela me honrou com um convite, mas não sou assessor nem conselheiro. Tenho grande admiração pela presidente, é uma tecnocrata muito competente, muito trabalhadora, tem ideias todas na direção correta. Na implementação, sempre há problemas, mas ela está plantando um Brasil que vai voltar a crescer.
Quantas vezes vocês conversaram?
Nunca contei.
Então foram muitas...
Na minha opinião, é totalmente invenção da imprensa (risos).
Como vê a economista Dilma?
Ela tem uma ideia muito clara sobre a realidade. Por exemplo, o caso da energia elétrica. Precisava mesmo baixar a tarifa de energia. Talvez a antecipação dos contratos tenha sido um pouco prematura. Houve uma coincidência, o tempo andou muito mal, e foi preciso usar usinas termelétricas. Tudo isso vai ser dissipado. Daqui a dois, três anos, a baixa de energia vai ser visível, e você vai tirar proveito disso. É que no começo sempre é muito difícil mudar as coisas.
Mas o mandato atual não está mais perto do fim do que do começo?
Pode estar no começo de outro mandato. Houve um aprendizado muito grande. O governo está mudando. É muito importante para o Brasil esse acordo com o Congresso de que não se colocará em pauta medidas de aumento de despesa ou redução de receita. A situação fiscal se complicou, e isso produziu um mal-estar, levou as agências de risco a fazer ameaça de redução de rating, mas está mudando.
O senhor teme uma “tempestade perfeita” no Brasil em 2014...
É isso mesmo. Houve uma mudança importante no governo causada pela compreensão do mal-estar em relação à política fiscal, resultado também de certo desconforto com as alquimias fiscais. Caminhamos para um aumento da dívida bruta fiscal, que não é exagerada, mas é quase o dobro dos outros países emergentes. E vai haver uma redução no estímulo monetário americano. Se não forem tomadas medidas concretas, enérgicas, vai haver a tempestade perfeita, com choque de câmbio e interrupção do crédito. As medidas preventivas vão resolver. Está cada vez mais visível que o governo aprendeu. É uma coisa que eu sempre dizia e as pessoas não acreditavam: com o tempo suficiente, até o PT aprende.
O que o governo aprendeu?
A mudança na disposição do governo de colocar suas concessões com muito mais inteligência e competência do que no passado. O sucesso de Libra (primeiro leilão exclusivo de área do pré-sal), porque só participou quem quer tirar óleo. As grandes estavam tentando retardar a extração do petróleo no Brasil. Não há defeito no projeto. O sucesso no leilão de aeroportos mostra que o governo aprendeu que a concessão de serviços públicos, na verdade, é a concessão do monopólio público para o monopólio privado. E o mercado entendeu que a preocupação que a Dilma tinha com a modicidade tarifária (preço baixo para o usuário) é legítima, não uma hostilização ao setor privado. Tanto é verdade que agora está ficando cada vez mais claro que você não pode controlar as duas variáveis da concessão. Ou controla a qualidade ou a taxa de retorno. Se opta pela qualidade, a taxa de retorno vai ser fixada num leilão bem feito.
Será possível reconstruir a ponte entre a Fazenda e o empresariado?
Acho que sim. O que havia era uma desconfiança em relação ao que supunham que era a filosofia do governo. E de onde tiravam? Se ela (a presidente) quer tarifa baixa, não quer que eu tenha lucro. Agora compreenderam que a preocupação é legítima, e a modicidade será a possível.
CONEXÃO GAÚCHA
Com o governador Amaral de Souza no Palácio Piratini
E preço mais alto para o usuário?
O governo entendeu que tarifa baixa não é a que se quer, é a que pode ser obtida nos melhores leilões possíveis. Entendeu que nos leilões houve o maior progresso na teoria econômica. Leilão é coisa para profissional, não para amador. Foi amadorístico tentar fixar a taxa de retorno.
O fracasso foi pedagógico?
É claro, não há nada mais educativo do que o fracasso (risos).
Também não fracassou a redução do juro para recuperar o crescimento?
O que alavanca o crescimento não é o juro, é acordar o espírito animal dos empresários. O governo assustou os empresários. O crescimento é fundamental, dá perspectiva e coragem para investir. Quando esse crescimento diminuiu, foi atribuído a uma disposição ideológica do governo, de que era a favor do capitalismo sem lucro. E de onde tiravam essas ideias? Entre outras coisas, da pressão por tarifas menores. Foram os equívocos iniciais. Só que o governo foi aprendendo. O tempo é um fator importante. Nos últimos três, quatro meses, a orientação está mudando de forma muito significativa. Dilma está mostrando que quer o setor privado funcionando, e o setor privado está dando respostas.
O senhor é fiador da reaproximação da presidente com os empresários?
Não sou fiador, mas acho importante porque conheço os dois lados. Ela não tem restrição ao funcionamento de mercado. Empresários acham que ela pensa que eles têm visão curta, desejo muito pouco solidário de lucros muito avantajados, um certo egoísmo. Ela não pensa isso. E eles temem que ela seja uma trotskista enrustida. Ou uma brizolista, o que é ainda pior (risos), uma aluna do engenheiro. No fundo, criou-se uma distância alimentada pelos fracassos da economia. O vento de cauda acabou em 2011. O real valorizado destruiu a indústria nacional. Primeiro roubou a demanda externa, depois a interna, com a concorrência da importação. A indústria murchou.
Não há outro paradoxo entre crescimento baixo e emprego alto?
Houve uma revolução demográfica. Nos anos 60, 70, eu ficava discutindo com Roberto Campos (então ministro do Planejamento) o que seria o Brasil em 2000. O Roberto, muito mais pessimista do que eu, dizia: ‘ah, esquece, vai ser uma porcaria, 400 milhões de pobres, sujos, vai repetir a Índia e a China’. Estávamos errados. Naquele tempo, cada mulher deixava seis filhos. Hoje, deixa dois. Houve um processo civilizatório. A senhora que era doméstica virou manicure, a manicure foi para o call center. Quem usava sabão de coco agora usa Dove. Não tem como fazer esse gente voltar para o sabão de coco aumentando a taxa de juro, . Esse processo civilizatório ocorreu junto com essas dificuldades. O Brasil de hoje é muito melhor do que o de 15 anos atrás.
O bolo não foi repartido antes de crescer, ao contrário do que o senhor receitava nos anos 70?
Essa frase nunca foi minha, eu não sou idiota. O que eu disse foi que não se pode distribuir o que não produziu. O Lula repartiu o que não produziu e fez um buraco de US$ 280 bilhões de déficit em conta corrente. Hoje só tem um caminho para crescer, aumentar a produtividade. A forma mais fácil de fazer isso é aumentar a infraestrutura.
O senhor disse que Lula distribuiu sem produzir e gerou déficit, mas também que salvou o capitalismo...
(interrompendo) O Lula é um gênio, um diamante bruto, uma inteligência absolutamente fora da curva. Ele não distribuiu só fazendo déficit, produziu uma política interna de redistribuição de renda focando melhor programas que já existiam. Essa distribuição de renda começou com o Médici, com a aposentadoria para todos os velhinhos do campo. Cada um foi acrescentando algo. Quando veio o Bolsa Família, houve melhoria dramática no nível de bem-estar da sociedade brasileira.
E o aumento real do salário mínimo?
Não tem nada gratuito em economia. O preço – não precisava ter sido – foi a valorização do câmbio, usada para combater a inflação. Quando se aumenta salário acima da inflação e da produtividade, vai dar em inflação ou em déficit de conta corrente. No nosso caso, um pouquinho de cada.
Faltou fazer algo para equilibrar?
Poderíamos ter feito melhor. Houve exagero na velocidade. Mas uma coisa é segura: isso está construído. Hoje você tem 30 milhões ou 40 milhões de sujeitos no mercado, e funcionando. O Lula fez muita coisa. Houve um aprendizado, o Brasil foi aprendendo. E também não nasceu em 2002, costumava ter nascido em 1500, e continua.
Como foi a experiência de assumir o ministério bem jovem, aos 39 anos?
Eu era visto como um caipira de São Paulo. O Rio era a metrópole. Você vai com suas circunstâncias. Tinha uma situação muito favorável. A dupla Campos e Bulhões (Roberto Campos, ministro da Fazenda, e Octávio Bulhões, do Planejamento, no governo Castelo Branco) havia feito bom serviço, com reforma tributária. Havia inflação de 40%, um problema de dívida pública, mas o ajuste tinha deixado uma boa situação. Quando entramos, aproveitamos. Havia recursos. O imposto único sobre combustíveis e lubrificantes era um dinheiroduto para a infraestrutura. Naquele tempo, a carga tributária era de 24% e se investia 5% do PIB. Hoje a carga é de 36% e se investe menos de 2%.
Na crise da dívida de 1982, o senhor levou o Brasil ao FMI...
(interrompe) O Brasil foi o primeiro a sair da crise. Em 1984, não havia mais déficit em conta corrente, mas foi o último a negociar a dívida externa. Isso se deve ao Malan (Pedro, ex-ministro da Fazenda de FH). Em 1994, era preciso terminar a negociação para tornar possível o Plano Real.
A dívida e o acordo com o FMI levaram a duas décadas perdidas?
Isso é uma grande tolice. A dívida não foi feita com grande crescimento, mas quando não tinha mais condição de ampliar as exportações para pagar petróleo. Foi feita porque o governo do Brasil decidiu não acreditar no Giscard d’Estaing, que depois foi presidente da França, sobre um complô dos exportadores de petróleo. Geisel se opôs aos contratos de risco (abertura à iniciativa privada) em 1972, quando era presidente da Petrobras. Só fez em 1976, 1977, quando não tinha mais saída. O Brasil produzia 20% do petróleo que consumia.
Nada poderia ter sido diferente?
Eu deveria ter providenciado a oferta de petróleo interna mais cedo. Só cresceu no governo Figueiredo. E não foi só o Brasil. Todos os países que importavam petróleo quebraram juntos. O Geisel não tinha outra coisa a fazer, mesmo. Não tendo petróleo, só podia se endividar.
O senhor já disse que assinaria de novo o AI-5...
Exatamente.
E também tomaria as mesmas decisões na economia?
Eu repetiria o que fiz. Dizem que a gente não deveria ter crescido tanto em 1980, mas o Brasil já estava quebrado. Melhor crescer quebrado do que nada. Ia quebrar do mesmo jeito. Não tinha mais o que fazer, então seria uma idiotice não crescer.
Mas o crescimento acelerado não agravou a situação da dívida?
Por quê? Não tinha mais crédito nenhum. Nem era a dívida, era o juro que estava crescendo, e não estava mais na nossa mão, os Estados Unidos levaram o juro a 18%. É lamentável como as pessoas não olham os números e ficam repetindo. Falam no processo de substituição de importações como se fosse uma teoria, uma filosofia.
... Chargistas também
abusaram do perfil redondo do
perene e poderoso ministro.
O
desenho básico: um círculo (rosto)
e dois quadrados (óculos).
E não era?
Nunca foi, era simplesmente falta de dólar. Então, para crescer, havia três coisas: um câmbio relativamente desvalorizado e constante, um sistema tarifário que realmente protegia o mercado interno e um sistema que permitia importar o que ia exportar depois. Isso permitiu que o Brasil multiplicasse as exportações por seis em cinco anos.
Por que há incentivo ao conteúdo nacional, mas a indústria murcha?
Para resolver, é preciso sistemas estáveis, câmbio competitivo, relativamente estável, reformulação o sistema tarifário, sistema amplo e irrestrito de draw back verde-amarelo (isenção de tarifa de importação sobre insumos para exportação). É preciso liberar a indústria para importar e exportar.
Dólar a R$ 2,30 não é competitivo?
O valor anterior não era, este é um pouco mais. Os economistas nunca sabem nada sobre o câmbio, o que é uma alegria para a gente (risos).
Por que é tão difícil mexer no intrincado sistema tributário?
A guerra fiscal foi um mecanismo de legítima defesa dos Estados, abandonados pela União. Havia programas de desenvolvimento regionais. Quando isso desapareceu, o que Goiás podia fazer? Nada. A solução foi oferecer vantagens no ICMS. É um sistema terrível. As vantagens vocacionais são eliminadas por conta de tributo. O desperdício que produz é gigantesco. Mas o que está aí é produto do descaso do governo federal depois de 1984, que abandonou todo mundo à própria sorte. Se fosse o governo, aprovaria o fundo de estímulo regional e cooptaria os Estados todos para um novo arranjo, que vai eliminar tudo isso em 15, 20 anos.
É a melhor perspectiva, 15, 20 anos?
Menos do que isso não sai. Não se vai destruir a indústria que está em Goiás, mal localizada, ou no Rio Grande (pausa antes da ironia). Agora, o Rio Grande é bom, porque mandou embora até a Ford.
E não era?
Nunca foi, era simplesmente falta de dólar. Então, para crescer, havia três coisas: um câmbio relativamente desvalorizado e constante, um sistema tarifário que realmente protegia o mercado interno e um sistema que permitia importar o que ia exportar depois. Isso permitiu que o Brasil multiplicasse as exportações por seis em cinco anos.
Por que há incentivo ao conteúdo nacional, mas a indústria murcha?
Para resolver, é preciso sistemas estáveis, câmbio competitivo, relativamente estável, reformulação o sistema tarifário, sistema amplo e irrestrito de draw back verde-amarelo (isenção de tarifa de importação sobre insumos para exportação). É preciso liberar a indústria para importar e exportar.
Dólar a R$ 2,30 não é competitivo?
O valor anterior não era, este é um pouco mais. Os economistas nunca sabem nada sobre o câmbio, o que é uma alegria para a gente (risos).
Por que é tão difícil mexer no intrincado sistema tributário?
A guerra fiscal foi um mecanismo de legítima defesa dos Estados, abandonados pela União. Havia programas de desenvolvimento regionais. Quando isso desapareceu, o que Goiás podia fazer? Nada. A solução foi oferecer vantagens no ICMS. É um sistema terrível. As vantagens vocacionais são eliminadas por conta de tributo. O desperdício que produz é gigantesco. Mas o que está aí é produto do descaso do governo federal depois de 1984, que abandonou todo mundo à própria sorte. Se fosse o governo, aprovaria o fundo de estímulo regional e cooptaria os Estados todos para um novo arranjo, que vai eliminar tudo isso em 15, 20 anos.
É a melhor perspectiva, 15, 20 anos?
Menos do que isso não sai. Não se vai destruir a indústria que está em Goiás, mal localizada, ou no Rio Grande (pausa antes da ironia). Agora, o Rio Grande é bom, porque mandou embora até a Ford.
GENERAIS DE ESTIMAÇÃO
Com Figueiredo (E),esteve na Agricultura e no Planejamento
E uma nova reforma tributária?
Claro que dá, tem de ter governo.
E não tem?
Hoje, o sistema ficou tão emaranhado que não tem como fazer. Está havendo um grande esforço na direção do ICMS, deveríamos fazer o acordo final. Os ganhos de produtividade seriam enormes.
Se há consenso, por que é tão difícil?
Porque contraria alguns interesses. É assim mesmo, tem de convencer a todos.
O senhor se referiu aos governos aos quais serviu como “regime autoritário”. Sabia o que se passava nos porões na época, não?
A administração civil era absolutamente independente, nunca houve qualquer interferência de nenhum jeito. Uma vez perguntei ao presidente Médici se havia (Delfim não pronuncia a palavra tortura), e ele me respondeu que não havia nada, só disse ‘tem uma guerra’.
E o senhor acreditou?
Acreditei. O Médici era mais sério do que parece.
Hoje o senhor sabe que havia?
Hoje todo mundo sabe. Na verdade, primeiro que o AI-5 não implicava que você torturasse alguém, isso é uma bobagem. Não tinha ninguém autorizado a maltratar alguém sob a guarda do Estado. Se alguém fez isso, deve ser punido.
E uma nova reforma tributária?
Claro que dá, tem de ter governo.
E não tem?
Hoje, o sistema ficou tão emaranhado que não tem como fazer. Está havendo um grande esforço na direção do ICMS, deveríamos fazer o acordo final. Os ganhos de produtividade seriam enormes.
Se há consenso, por que é tão difícil?
Porque contraria alguns interesses. É assim mesmo, tem de convencer a todos.
O senhor se referiu aos governos aos quais serviu como “regime autoritário”. Sabia o que se passava nos porões na época, não?
A administração civil era absolutamente independente, nunca houve qualquer interferência de nenhum jeito. Uma vez perguntei ao presidente Médici se havia (Delfim não pronuncia a palavra tortura), e ele me respondeu que não havia nada, só disse ‘tem uma guerra’.
E o senhor acreditou?
Acreditei. O Médici era mais sério do que parece.
Hoje o senhor sabe que havia?
Hoje todo mundo sabe. Na verdade, primeiro que o AI-5 não implicava que você torturasse alguém, isso é uma bobagem. Não tinha ninguém autorizado a maltratar alguém sob a guarda do Estado. Se alguém fez isso, deve ser punido.
SÍMBOLOS DE UMA ÉPOCA
O ministro do“milagre”e o carro pré-crise do petróleo
Hoje o senhor é interlocutor da presidente Dilma, na época presa e torturada. Vocês falaram sobre isso?
Não, nunca conversei sobre isso. Ela é uma pessoa vivida, nós temos de aproveitar a Dilma, que tem características muito interessantes.
O senhor sempre foi muito discreto sobre sua vida privada...
(interrompendo) E continuo.
Como o senhor teve um neto há pouco, o Rafael, conversa sobre isso com a presidente Dilma, que gosta de falar do Gabriel, o neto dela?
Você continua acreditando na imprensa, nunca tive conversas pessoais com a presidente. Quando ela me honra com um convite, vou e discutimos sobre futebol (risos). Ela é do Internacional, mas no regime autoritário eram todos do Grêmio.
O senhor teve um problema sério de saúde em 2010...
(interrompendo) Tive um probleminha (Delfim ficou internado por 60 dias, dos quais 18 em coma em 2010).
Está se cuidando melhor?
Eu sempre me cuidei, não teve nenhuma mudança fundamental.
E o senhor tem problema com exercícios físicos...
Eu detesto, mas acho que todo mundo detesta.
Mas não faz bem para a saúde?
Isso resta provar. Estatisticamente não está provado que quem faz esporte dure mais. Ou ao menos não há prova confiável de que quem faz exercício dure mais.
O senhor tem saudade da biblioteca de 300 mil volumes doada à USP?
Poxa... Mas eu tenho uma sala lá, ainda está sendo montada. Esta semana, mandei buscar dois livros do ministro da Economia da Argentina.
Como vê o julgamento do mensalão?
Cumpriu seu papel. Em que lugar do mundo você tem um processo com a abertura que teve aqui? Com a sociedade brasileira assistindo todas as tardes, interrompendo o crescimento, para assistir a um julgamento. A impressão que eu tenho é que a maioria não sabe o que foi julgado. Cada um dá seu palpite. Terminou como tinha de terminar.
Não, nunca conversei sobre isso. Ela é uma pessoa vivida, nós temos de aproveitar a Dilma, que tem características muito interessantes.
O senhor sempre foi muito discreto sobre sua vida privada...
(interrompendo) E continuo.
Como o senhor teve um neto há pouco, o Rafael, conversa sobre isso com a presidente Dilma, que gosta de falar do Gabriel, o neto dela?
Você continua acreditando na imprensa, nunca tive conversas pessoais com a presidente. Quando ela me honra com um convite, vou e discutimos sobre futebol (risos). Ela é do Internacional, mas no regime autoritário eram todos do Grêmio.
O senhor teve um problema sério de saúde em 2010...
(interrompendo) Tive um probleminha (Delfim ficou internado por 60 dias, dos quais 18 em coma em 2010).
Está se cuidando melhor?
Eu sempre me cuidei, não teve nenhuma mudança fundamental.
E o senhor tem problema com exercícios físicos...
Eu detesto, mas acho que todo mundo detesta.
Mas não faz bem para a saúde?
Isso resta provar. Estatisticamente não está provado que quem faz esporte dure mais. Ou ao menos não há prova confiável de que quem faz exercício dure mais.
O senhor tem saudade da biblioteca de 300 mil volumes doada à USP?
Poxa... Mas eu tenho uma sala lá, ainda está sendo montada. Esta semana, mandei buscar dois livros do ministro da Economia da Argentina.
Como vê o julgamento do mensalão?
Cumpriu seu papel. Em que lugar do mundo você tem um processo com a abertura que teve aqui? Com a sociedade brasileira assistindo todas as tardes, interrompendo o crescimento, para assistir a um julgamento. A impressão que eu tenho é que a maioria não sabe o que foi julgado. Cada um dá seu palpite. Terminou como tinha de terminar.
Na sala de Delfim, uma parede exibe charges do tempo em que era ministro,
enquanto no aparador ganha destaque a foto do neto Rafael, de dois anos
Quais as perspectivas de um Estado na situação financeira do Rio Grande do Sul, agora sem alívio na dívida?
Foi uma grande medida essa do governo de terminar com a ênfase nessa mudança. Talvez na letra não violasse, mas no espírito violava a Lei de Responsabilidade Fiscal. Todos os níveis de governo precisam encontrar formas de acertar as finanças. O problema do Rio Grande é muito antigo, o que aumenta as dificuldades. Admiro muito o governador Tarso Genro, que me honrou com sua amizade, mas não acredito que seja possível que os Estados continuem esperando da União algum reforço muito importante. A União, ela mesma, está hoje em situação muito delicada.
O Estado tem buscado novos financiamentos. É boa opção?
O espaço para o endividamento tem um limite, e você já atingiu esse limite. Você não consegue sequer honrar as condições para manter um nível de endividamento existente. É muito difícil encontrar saída no endividamento, é uma coisa provisória. Você tem de comparar o endividamento com a renda do Estado, na verdade tem de ter um controle do endividamento perante a renda do Estado, que já é muito grande.
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marta.sfredo@zerohora.com.br
Reportagem por MARTA SFREDOFoi uma grande medida essa do governo de terminar com a ênfase nessa mudança. Talvez na letra não violasse, mas no espírito violava a Lei de Responsabilidade Fiscal. Todos os níveis de governo precisam encontrar formas de acertar as finanças. O problema do Rio Grande é muito antigo, o que aumenta as dificuldades. Admiro muito o governador Tarso Genro, que me honrou com sua amizade, mas não acredito que seja possível que os Estados continuem esperando da União algum reforço muito importante. A União, ela mesma, está hoje em situação muito delicada.
O Estado tem buscado novos financiamentos. É boa opção?
O espaço para o endividamento tem um limite, e você já atingiu esse limite. Você não consegue sequer honrar as condições para manter um nível de endividamento existente. É muito difícil encontrar saída no endividamento, é uma coisa provisória. Você tem de comparar o endividamento com a renda do Estado, na verdade tem de ter um controle do endividamento perante a renda do Estado, que já é muito grande.
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marta.sfredo@zerohora.com.br
Fonte: ZH on line, 01/12/2013
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