João Pedro Wapler*
Ano que vem é ano de Eleições. Quase todo mundo odeia essa época e
com toda a razão. Rios de dinheiro serão drenados para propagar
candidatos cada vez mais despreparados e inescrupulosos. Seremos
obrigados a conviver com jingles retardados, sorrisos maquiavélicos e
debates completamente inócuos. Mas quem gosta de eleição exceto as
siglas partidárias, não? Eleição não é a festa da democracia e sim a
farra da plutocracia.
Depois do pequeno desabafo, vou iniciar de outra maneira meu texto,
quiçá pior que a anterior: entraremos agora no ano da Copa do Mundo. O
curioso é que justamente no “país do futebol”, “na pátria de chuteiras”
(dentre outras expressões chatas que sempre ouvimos por aí nos
noticiários vagabundos) surgiram diversas desconfianças acerca do
evento. Logo aqui onde quase tudo gira em torno do círculo central do
gramado. Muitos achavam que a festança seria saudada pelo povo e que
todos bateriam palmas como macacos. O pão e o circo futebolístico
dopariam definitivamente os nativos, numa versão pós-moderna do mito
romano. Todos acreditariam de pés juntos que vivem num país abençoado e
“bonito por natureza” e se convenceriam de que Deus é de fato brasileiro
registrado em cartório. Aconteceu o contrário, graças a Deus! Foi
comprovado que não estamos no Planeta dos Macacos.
Os únicos que parecem saudar com os dentes (brancos e bem alinhados)
da boca o evento são os governantes, as empresas de refrigerante e as
grandes construtoras. As manifestações que tomaram conta do país em 2013
endossaram o que já era sabido: a população acha vergonhoso torrar em
estádios o que poderia ser investido em escolas. O pessoal acha estúpido
ocupar espaços públicos com monumentos à FIFA ao invés de reforma-los
para a utilidade pública. Os eleitores não são tão otários assim como
dantes.
Mas é claro que não somos uma nação que sataniza qualquer competição.
O ano de Copa sempre foi e sempre será um momento de catarse, altamente
divertido e saudável. O brasileiro é apaixonado por futebol, sendo esse
desporto, como dizem os mais velhos amantes da bola, não apenas uma
atividade física mas um símbolo nacional indiscutível, como o samba, a
bossa nova, a telenovela e o Carnaval. Se houve uma Copa em países onde
mal se joga futebol (África do Sul, EUA) por que não haver uma no
Brasil? Segundo a nova política da FIFA, a mandatária suprema nas quatro
linhas, as sedes dos Mundiais devem se espalhar pelos continentes num
mundo globalizado e não apenas se centrar nas grandes potências. É um
grande negócio para os organizadores do evento e um “marketing” para os
países-sedes. Dentro dessa lógica uma Copa num país do futuro faz todo o sentido. Mas pra quem faz sentido?
Uma coisa é a galera curtir o evento sabendo que ele está sendo
financiado com dinheiro da Alemanha, da Coreia do Sul ou da África de
Mandela, outra é tomar uma cerveja com plena consciência que nossos
impostos estão pagando o aço dum estádio no meio da floresta que depois
da Copa virará sei lá o que.
A última Copa por aqui foi em 1950. Desde lá tivemos duas Copas no
México, outro representante do Terceiro Mundo. Os outros países sedes
sempre foram grandes potências. Pra quem é a Copa? Ou melhor, quem sai
ganhando verdadeiramente com o megaevento? Os primeiros beneficiados da
Copa são as grandes empresas que bancam ela com a parceria confusa e
suja com os governos. Uma elite está rindo à custa do povo,
superfaturando obras e etc e tal. Outros favorecidos são a alta casta
que pagará preços estapafúrdios para assistir às partidas. A grande
massa acompanhará a Copa da mesma maneira que acompanharia se ela fosse
realizada no Uzbequistão: sentado na poltrona ou num bar.
O pior da Copa é aguentar à enxurrada de publicidade e de matérias
jornalísticas ufanistas, saudando o evento como a coisa mais maravilhosa
já feita no Brasil, como a “festa do povo”. Tudo isso é um grande
engodo. Querem vender a ideia de que todos “ganharão com a Copa”, mas o
outro lado desse discurso populista é outro: o que se forma nesses
megaeventos são cartéis que comandam tudo e se autobeneficiam dessa
sensação de alegria que muitos entram só por estarmos “em mês de Copa do
Mundo”. As escolas e faculdades ficarão vazias só por que uma seleção
europeia vai jogar uma partida na cidade. Existe algo mais patético que
isso? Parece que estamos escancarando nossos traços de colonizados com
essa postura.
Espero que a Copa não seja nada demais e que as pessoas lembrem mais
das Eleições do que da Copa, mesmo que isso seja chato. O Brasil tem um
grave problema em idolatrar o divertimento e deixar que nosso futuro
seja decidido em bancas de negócios escusos.
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*João Pedro Wapler é ator e escritor. Mantém o blog de fotografia Mobile Frame (http://mobileframe.tumblr.com).
Fonte: http://palavraria.wordpress.com/ - Acesso: 21/12/2013
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