Paulo Ghiraldelli*
Dica
1. Não inicie como quem não se dá importância. Por exemplo, “Muito se
tem dito sobre …” ou “Não pretendo aqui exaurir o assunto …”. Também não
inicie como quem vai explicar tudo que não vai fazer, isso é
desanimador e pode não sobrar espaço para o que você vai fazer – ou iria
fazer! Por exemplo: “Não se trata de…”. Inicie com elementos taxativos,
curiosos, capazes de em uma fisgada levar o leitor a se engajar na
leitura. Por exemplo, você vai escrever sobre pesquisa a respeito de
água em Marte. Tendo ou não água em Marte, comece com algo do tipo “Há
água em Marte. Pode haver vida …”. É claro que, em vários casos, terá de
relativizar depois.
Dica 2. Não faça frases longas. Deixe
isso para o Saramago (que eu não leio). Também não abuse no tamanho dos
parágrafos. Há quem faça muitos parágrafos, usando aquele estilo que
permite mesmo quase que uma frase em cada parágrafo. Esse estilo não é
para qualquer um. Não aconselho.
Dica 3. Escreva com o seu repertório,
com o seu vocabulário. Caso ele não seja rico, paciência. Escreva com o
que tem, deixe para depois ler mais e adquirir um vocabulário maior. Não
tente não repetir palavras, como a professora da escola básica ensinou.
Pode repetir. O segredo é não repetir de um modo que, lendo em voz
alta, você sinta que incomodou. Hoje em dia, por influência do inglês,
repetimos mais do que no passado. Não gosto daquele truque de substituir
Marx por “o autor de O Capital”, para não repetir o nome “Marx”. É um
recurso infantil.
Dica 4. Escreva de uma vez só. Bem, ao
menos a versão final, deve escrever de uma vez só. As paradas mudam o
estilo da escrita, os tempos dos verbos etc. Somente escritores bem
treinados pegam um texto que estava na gaveta há algum tempo e reiniciam
no mesmo tom e estilo.
Dica 5. Não cite autores importantes
para dizer coisas que você ou qualquer um pode dizer. Para usar uma
frase ou um pequeno trecho de um autor, escolha algo que é relevante,
algo que é original dele. Mas não cite por citar, o trecho utilizado
deve vir por necessidade do texto. Evite aquele estilo de tese velha
(mesmo que esteja escrevendo algo parecido com tese), em que o autor
prima por nunca escrever, apenas ir de citação em citação, de destaque
em destaque.
Dica 6. Cuidado com os vícios
gramaticais. Todos nós temos e todos nós, mesmo os profissionais da
escrita, adquirirem outros mais tão logo corrigiram os que incomodavam.
Há autores veteranos que, sabe-se lá por qual razão, começam a escrever
com um ou dois erros e vão embora com isso. Corrigidos, ficam
paralisados, não sabendo como que puderam cair naquele erro. É que não
era um erro, ou melhor, era sim um erro, mas algo que se tornou um vício
imperceptível.
Dica 7. Não abuse de vírgulas. Há regras
para tal, mas se você foi bem alfabetizado, a melhor regra é a da
respiração, que lhe dá a pausa “natural”. Leia em voz alta e então
corrija as vírgulas.
Dica 8. Não escreva sobre o que não
sabe. Escrever sobre o que não se sabe é um dom. Mas é um dom que
chateia demais! Há pessoas que deixam a pena correr, que falam de tudo,
mas não falam do assunto que escolheram. Afinal, o que tinham para dizer
sobre aquele assunto cabia em um bilhete. Use o Twitter ou o Facebook
em caso de ter apenas ideias esparsas. Texto bom é antes de tudo texto
informativo sobre o assunto proposto. Isso também vale para o texto
ficcional. Descrições de ambiente, divagações e outros recursos que
antes chamávamos de “encher linguiça”, mostram um escritor vazio. Quando
um tema geral lhe é desconhecido, e cai sobre sua cabeça como
imposição, então você pode pensar sobre ele e encontrar em seu interior o
modo de abordá-lo que lhe é conhecido, familiar. Pegue por aí.
Dica 9. Não faça do esquema
“introdução-desenvolvimento-conclusão” uma camisa de força. Tal esquema é
pobre, é realmente para quem não tem nenhuma experiência com a leitura e
a escrita. Serve para quem realmente é um iniciante. Mas, logo que
possa saia disso.
Dica 10. Saiba distinguir gêneros
narrativos. Um ensaio tem semelhança com um artigo, mas não é um artigo.
Uma tese é uma tese. Um aforismo é um aforismo. E por aí vai. Cuidado
com isso. Muitos jovens só leem textos científicos, os de sua área de
estudo, e não conseguem construir uma narrativa própria para “contar
algo”. Aprenda a “contar uma história”, a “contar algo”. Lembre-se que
pode sim escrever na primeira pessoa, alternando com a primeira do
plural quando quiser engajar o leitor. Não é necessário escrever no
impessoal, mesmo que seja filosofia!
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* Paulo Ghiraldelli, 56, filósofo, escritor, cartunista e professor da UFRRJ
Fonte: Blog pessoal: http://ghiraldelli.pro.br
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