sexta-feira, 21 de junho de 2013

A Rebelião das Massas


Michel Aires de Souza*

protesto

 O povo é como um grande elefante africano de cinco toneladas,  que está preso a um toco de cinco centímetros por uma frágil corda. Ele ignora a força que tem, não se dá conta que seus grilhões podem ser arrebentados facilmente.  As massas são capazes de suportar a fome, a miséria e a labuta, mas basta que experimentem um pouco de paz, segurança, conforto e consumo,  para que elas exijam cada vez mais. Elas jamais irão se acostumar a sua antiga condição.  Elas irão às ruas exigir sua bem aventurança. O filósofo espanhol Ortega Y Gasset em seu livro “Rebelião das Massas” afirma que “as massas por definição, não devem e nem podem dirigir sua própria existência, e muito menos reger a sociedade”. Apesar disso, tal como o elefante elas sentem cede, fome e o sol queimando sobre suas cabeças. É esta percepção de que algo está errado que o liberta da pequena corda que o mantém amarrado.

        As manifestações que ocorrem em São Paulo e se estenderam por todo Brasil já eram impulsos latentes, prestes a se transformar em protestos violentos. Somos a sétima economia mundial, mas em bem-estar social, distribuição de renda, serviços públicos de qualidade e ética na política, resplandece uma calamidade triunfal. A violência nas grandes cidades, a insegurança social, os serviços públicos de má qualidade, o crescente número de favelas, o trânsito nas metrópoles, o fantasma da inflação, a corrupção política, os gastos com a copa do mundo, a carga tributária altíssima e o grande custo de vida foram os motivos explosivos que detonaram a rebelião.

       O Brasil possui um PIB de 4,4 trilhões de dólares, uma renda per capita de 11, 8 mil dólares e uma carga tributária que chega 38% do PIB. Isso significa que o governo recebe um terço de nossas riquezas produzidas. Na prática o trabalhador trabalha quatro meses para pagar seus impostos anualmente. Esse valor deveria retornar em benefícios para a população. Contudo, muitos cidadãos pagam do próprio bolso serviços essenciais, como saúde, educação e segurança. Se a carga tributária fosse bem empregada, como na Alemanha, teríamos subsídios para moradia, seguro maternidade, cuidados infantis, seguro invalidez, seguro desemprego, escolas de qualidade, hospitais de qualidade, transportes de qualidade, bons salários, ruas limpas, sem favelas e sem mendigos. Mas se o dinheiro não vai para onde deveria ir, todos nós sabemos para onde ele vai, não é preciso ter uma bola de cristal, ele vai para “a cueca”, para “o bolso” e para “a meia” de muitos políticos.

tarifa 
No Brasil há uma grande desigualdade na distribuição de renda.  Em um país em que quase metade da população ganha menos de dois salários mínimos, aqueles que têm renda familiar de 4.500 reais são considerados elites. Segundo estudo da FGV (Fundação Getulio Vargas) a classe média alta com renda acima de 4.591 reais cresceu de 12,99% para 15,52%. Apesar de a pobreza ter diminuído, o número de ricos também cresceu nos últimos anos. Segundo estudos do IPEA (Instituto de Pesquisas Econômicas Avançadas) houve um aumento do número de indivíduos que ganham mais de quarenta salários mínimos, que cresceu de 0,8% para 1% da população. Esses dados só demonstram que grande parte da riqueza produzida em nosso país encontra-se nas mãos dos mais ricos. Esse é outro grave problema, o grande abismo entre ricos e pobres. Os mais pobres pagam altos impostos e não usufruem de serviços públicos de qualidade. Em São Paulo nos últimos 20 anos de governo PSDB as periferias foram abandonadas. As ruas são todas esburacadas, os hospitais e postos de saúde são lotados, as escolas públicas são de má qualidade, há um grande número de favelas, as drogas, a insegurança e a violência é uma constante. Para ir ao serviço os trabalhadores levam de duas a três horas. Além disso, não há áreas de lazer, como cinemas, teatros, museus, parques ou áreas verdes. Por isso é muito cômodo os meios de comunicação fazerem promessas de felicidade de uma televisão de 42 polegadas e chamarem de vandalismo quando a turba revoltada invade lojas para adquirir uma.  Quebrar bancos, invadir lojas, destruir o patrimônio público, queimar ônibus foram cometidos principalmente por jovens da periferia pobre das grandes cidades, as imagens na televisão e os dados policiais demonstram isso. Esse é o grande problema que o Brasil deve enfrentar.  Esses jovens não são assistidos, grande parte deles está desempregada ou faz bicos em um trabalho informal. Não vemos políticas públicas para a juventude pobre dos grandes centros urbanos, falta a eles acesso a boas escolas, áreas de lazer, hospitais, segurança e cidadania. Usando a terminologia do sociólogo francês Bordieu, falta aos jovens acesso ao capital econômico, ao capital cultural, ao capital social e ao capital simbólico. A revolta é sempre latente neles.

         Os políticos querem achar lideranças, querem negociar, mas não acham lideres. Eles ignoram que as massas atuam sem leis, elas são cegas, impõe suas aspirações e desejos sem liderança, “não há protagonistas, só há coro”. Para Gasset o homem massa é aquele que não se considera nem superior nem inferior aos outros, não atribui a si um valor bom ou mau, mas que se sente “como todo mundo” e não se angustia com isso. O homem massa não se interessa por política, não se envolve em movimentos políticos, o que a massa deseja é apenas elevar seu padrão de vida e usufruir de serviços públicos de qualidade.
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* Filósofo.
Fonte: http://filosofonet.wordpress.com/2013/06/21/a-rebeliao-das-massas/

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