Marcelo Gleiser*
Independentemente do resultado da partida, a Terra, nossa casa, continuará a se aquecer
HOJE É DIA da final da Copa das Confederações, imagino que a maioria
absoluta dos brasileiros esteja grudada na TV. (Eu sou um deles, mesmo
daqui dos EUA).
Interessante o contraste das culturas; por aqui, esse tipo de conexão
nacional não existe em nenhum esporte. Não vejo os americanos unidos,
torcendo pelo seu país em massa em um jogo, como ocorre no Brasil e em
tantos outros países.
Isso é coisa do futebol e da Copa, um fenômeno único mesmo. Olimpíada é
diferente, uma outra espécie de manifestação patriótica. Não é tanto um
esporte, mas muitos juntos, e cada um vê o que gosta mais.
Isso faz do futebol uma coisa à parte, uma manifestação em massa quase
que religiosa, algo que antropólogos culturais estudaram já em detalhe.
Uma expressão de patriotismo, sem dúvida, mas muito mais do que isso.
Aqui nos EUA, isso ocorre mais com as guerras do que com os esportes.
O que me faz pensar no próximo nível de adesão cultural em massa, quando
não somos mais um país, mas uma espécie. Uma das assinaturas do novo
milênio é a transcendência cultural por meio da globalização digital;
todos têm, em princípio, uma voz, a informação que antes era difícil é
acessível com alguns cliques; cursos dados por grandes professores,
palestras sensacionais sobre ideias de vanguarda, vídeos políticos (como
aqueles mostrando as manifestações no Brasil), filosóficos,
esportivos...tudo ao alcance, basta só saber procurar conteúdo. E é esse
o grande desafio da educação moderna: orientar as pessoas a buscar
conteúdo de qualidade, coisas que nos ajudem a aprender, a crescer como
indivíduos e mesmo como espécie.
Pois se uma coisa fica clara com essa globalização e com outra
característica dos nossos tempos, o aquecimento global, é que qualquer
ação local pode ter repercussão global. O moto "pense globalmente e haja
localmente" diz tudo. Semana passada, o presidente Obama declarou a
necessidade de os EUA mudarem sua política com relação à emissão de
carbono: "Os cientistas estão convencidos na sua maioria absoluta de que
o aquecimento global está sendo acelerado pelas atividades humanas;
falo isso pelos meus filhos e as gerações futuras", declarou.
Finalmente!
Não há mesmo dúvida de que estamos pondo uma espécie de cobertor em
torno do planeta, que vai ficando cada vez mais sufocado. A
conscientização conjunta de uma globalização pela internet e pelo clima
deveria também despertar uma noção da necessidade de lutarmos como
espécie para a preservação da nossa casa cósmica. Algo que a ciência
moderna nos ensina é que a vida é rara e a vida complexa mais ainda;
ademais, dadas as variações de planeta a planeta, e dado como a vida
depende dessas variações, podemos afirmar que nós, humanos, somos
únicos, futebol e tudo.
Se as variações culturais ainda são enormes, como no caso da devoção
nacional ao futebol no Brasil e sua ausência nos EUA, estamos todos
juntos neste mesmo planeta.
Independentemente do resultado do jogo, a Terra continuará sendo nossa
casa e continuará a se aquecer. Torço para que o Brasil ganhe, claro, e
para que nosso planeta vença também. Pois neste jogo ganhamos ou
perdemos todos juntos.
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