Luis Fernando Verissimo*
O brasileiro é expansivo mas tem um certo pudor de
mostrar seus sentimentos. Somos da terra do "dá cá um abraço" mas também
temos nossas hesitações afetivas. O meio-termo encontrado é o insulto
carinhoso.
- Seu filho da mãe!
- Seu cafajeste!
São dois amigos que se encontram.
- Só me faltava encontrar você. Estragou meu dia.
- Este lugar já foi mais bem frequentado...
Depois dos insultos, os brasileiros se abraçam com fúria. E os
sonoros tapas nas costas - outra instituição nacional - chegam ao limite
entre a cordialidade e a costela partida. Eles se adoram, mas que
ninguém se engane. É amor de homem, estão pensando o quê?
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Quanto maior a amizade, maior a agressão. E você pode ter certeza que
dois brasileiros são íntimos quando põem a mãe no meio. A mãe é o
último tabu brasileiro. Você só insulta a mãe dos seus melhores amigos.
- Sua mãe continua na zona?
- Aprendendo com a sua.
- Dá cá um abraço!
E lá vêm os tapas.
Um estrangeiro despreparado pode levar alguns sustos antes de se acostumar com a nossa selvageria amorosa.
- Crápula!
- Vigarista!
- Farsante!
- My God! Eles vão se matar!
Não se matam. Se abraçam, às gargalhadas. Talvez ensaiem alguns socos nos braços ou simulem diretos nos queixos. Mas são amigos.
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Os franceses não se abraçam mas se beijam, e não apenas quando estão
se condecorando. Mas dois franceses só chegam ao ponto de se beijarem no
fim de um longo processo de desformalização do seu relacionamento que
começa quando um propõe ao outro que abandonem o "vous" e passem a se
tratar por "tu". Até o passo ser dado o cumprimento entre os dois jamais
passara de um seco aperto de mãos.
Os russos se beijam com qualquer
pretexto e dizem que a progressão, lá, não é do aperto de mão para o
abraço e o beijo mas de beijos protocolares para beijos cada vez mais
longos e estalados.
Os anglo-saxões são mais comedidos e mesmo os
americanos, que são ingleses sem barbatana, reagem quando você,
esquecendo onde está, ameaça abraçá-los.
Ninguém mais informal do que um
americano, ninguém mais antifrancês na velocidade com que chega à etapa
equivalente ao "tu" sem nenhum ritual intermediário, mas a
informalidade termina aí. Até o nosso hábito de bater no braço do outro
quando se aperta a sua mão, aquela amostra grátis de abraço, eles
estranham.
Tapas nas costas, então, nem pensar.
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* Escritor. Cronista da ZH
Fonte: ZH on line, 30/06/2013
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