"Quanto mais ignorante for a pessoa,
maior a valorização que ela dá a si mesmo
e menor a valorização que ela dá aos outros."
Na esteira do artigo da semana passada, no qual abordamos o tema metacognição surgiu a questão:
— Se metacognição é o conhecimento e o controle do próprio
conhecimento, qual seria o efeito da ignorância da própria ignorância?
Com intuito de responder essa questão vou me referir à pesquisa de
David Dunning, um psicólogo da Universidade de Cornell, realizada em
conjunto com Justin Kruger da Universidade de Nova York já noticiada aqui no Hypescience.
A pesquisa fundamentou-se na realização de diversos testes dentro de
determinadas áreas das habilidades humanas, tais como raciocínio lógico,
inteligência emocional, jogos de estratégia, sagacidade no humor, etc.
seguido de uma entrevista.
Nessa entrevista era solicitada a opinião de cada participante sobre seu próprio desempenho nos testes.
Os resultados foram esclarecedores.
Os participantes da pesquisa que tiraram as mais baixas pontuações superestimaram seus resultados em 100% das entrevistas.
E quanto pior o resultado quantitativo em raciocínio lógico,
inteligência emocional, humor ou mesmo habilidades em jogar xadrez, por
exemplo, maior foi a diferença entre a sua real pontuação e a sua
estimativa arrogada na entrevista.
Ficou patente que a incompetência priva as pessoas da capacidade de reconhecer sua própria incompetência.
Tal limitação pode ser a principal responsável pelo descompasso nos
relacionamentos interpessoais e no funcionamento da sociedade como um
todo.
Com mais de uma década de pesquisa os resultados demonstraram que os
seres humanos acham “intrinsecamente difícil ter uma noção do que não
sabem”.
O pior em tudo isso, é que não se trata apenas de otimismo ou autoconfiança.
Os pesquisadores descobriram uma total falta de habilidade em
autoavaliar-se. Um bloqueio nessa parte do autoconhecimento individual
que implica na ignorância sobre a extensão de suas reais habilidades e
na confusão entre a imagem que se tem de si mesmo e a realidade de suas
próprias competências (ou incompetências).
Mesmo quando os pesquisadores ofereceram aos participantes uma
recompensa de US$ 100 para aqueles que classificassem seu desempenho com
a maior precisão, os resultados foram praticamente os mesmos.
“Eles realmente estavam tentando ser honestos e imparciais.
Percebia-se ali uma real incapacidade de se avaliar o próprio
conhecimento bem como seus próprios limites. Nisso podemos apontar a
causa de muitos dos problemas da sociedade, como por exemplo, a própria
negação das alterações climáticas. Tal negação passa pela sedimentação
de uma opinião desinformada e desatrelada da realidade, e o que é pior,
aliada à inconsciência dessa desinformação” — afirmou Dunning.
E para agravar o caso, ficou evidente também que pessoas que não são talentosas em uma determinada área são incapazes de reconhecer esse talento nos outros.
O que é mais uma das obviedades que a psicologia cognitiva está nos esfregando na cara.
Quanto mais ignorante for a pessoa, maior a valorização que ela dá a si mesmo e menor a valorização que ela dá aos outros.
De fato, é um resultado que não surpreende um bom observador da
conduta humana desde que se tem falado em ignorância e arrogância —
parecem que são características indissociáveis e com os resultados mais
nefastos que podemos imaginar na conduta humana.
O que me leva a concluir, sobre a nossa questão base:
Pior que a ignorância — só mesmo a ilusão do conhecimento, que invariavelmente a acompanha.
Essa terrível ilusão que além de levar o indivíduo ao erro também o
aprisiona na própria ignorância, impedindo-o de buscar pelo
conhecimento.
Afinal, ninguém precisa encher um cântaro quando se acredita que ele está completamente cheio.
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Texto de Mustafá Ali Kanso
Fonte: http://hypescience.com/
[Imagem: Vase de Juan Tello]
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