sexta-feira, 14 de fevereiro de 2014

BOM DOMINGO E BOM ALMOÇO

José Tolentino Mendonça* 
 
Bom domingo e bom almoço.
É com esta frase que o Papa Francisco se despede dos fiéis reunidos para o Angelus em cada domingo. É uma expressão inabitual, há que reconhecer. O que os pontífices anteriores se concediam era, quanto muito, um aceno de mão a mais ou um sorriso que se abria. Naquela janela do Palácio Apostólico, tanto João Paulo II como Bento XVI, só para falar dos mais recentes, mostraram-se sem véus, é verdade. Basta lembrar o lento e dolente calvário do Papa Wojtyla que fazia alguns comentadores perguntarem se não seria demais a exposição de tamanho sofrimento. Ou os últimos Angelus do Papa Ratzinger, antes e depois da grande renúncia. Para quem quisesse ver estava tudo ali. E a forma de comunicação não era nem melhor nem pior: era simplesmente diferente. Mas o que toca tanta gente no estilo do Papa Francisco é esta capacidade, que parece fácil mas é muito rara, de avizinhar-se, de revelar-se familiar, de expressar uma atenção concreta pelos outros. Traduzida por ele, a pastoral deixa de ser uma ciência abstracta, feita de gráficos e organigramas. Deixa de reger-se por categorizações e manuais. É evangélica, instintiva e inclusiva; torna-se uma arte que o coração conhece (e reconhece). É um pacto de confiança que aceita  a necessidade permanente de refazer-se.  É um passar da soleira formal onde tantas vezes a evangelização, infelizmente, se detém. Jesus enviou os seus discípulos dizendo-lhes que entrassem nas casas, que se sentassem à mesa, que comessem e bebessem do que lhes fosse servido (Lc 10,8). Nessa comunhão de mesa e de destino realiza-se uma das viagens mais surpreendentes que se pode fazer, em qualquer tempo e em qualquer civilização: o transcender daquele espaço que separa os outros dos nossos; o atravessar dos  obstáculos que dividem o mundo entre estranhos e familiares. Quando ouvimos o Papa Francisco desejar “bom domingo e bom almoço” não é apenas uma forma tipificada de cortesia.  É mais do que isso. É muito mais.
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* Teólogo. Escritor.
Fonte:  http://www.agencia.ecclesia.pt/cgi-bin/noticia.pl?id=99056

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