Luis Fernando Veríssimo*
Pode acontecer. A moça do tempo na TV entra no bar com
um grupo de amigos. É recebida com óbvio desconforto pelos
frequentadores do bar. Ouve-se um zum-zum-zum de desaprovação à sua
presença. O grupo da moça ocupa uma mesa. Depois de algum tempo, um
homem da mesa ao lado não se contem e pergunta:
– Você não é a moça do tempo, na TV?
A moça diz que é, sorrindo, mas o homem não sorri. Pergunta:
– Até quando vai esse calor?
– Pois é – diz a moça, ainda sorrindo. – Está difícil de prever. Tem uma zona de pressão na...
– Não – interrompe o homem – não me venha com zona de pressão. Chega de enrolação.
Uma mulher de outra mesa se manifesta:
– Há dias que você põe a culpa pelo calor nessa zona de pressão. E não toma providências.
– Minha senhora, eu...
Outros começam a gritar.
– Sensação térmica de 51 graus. Onde já se viu isso?
– Não dá mais para aguentar!
– Faça alguma coisa!
A moça do tempo na TV agora está em pânico.
– O que eu posso fazer? Eu só descrevo o tempo. Não tenho o poder de...
– Alguém tem que assumir a culpa, minha filha! Sensação térmica de 51 graus, alguém tem que ser responsável.
– A culpa é da Natureza!
– Rá. Natureza. Muito bonito. Muito conveniente. É como culpar a corrupção na índole do brasileiro. Aqui ninguém tem culpa de ser corrupto, é a índole. A índole do tempo, num país tropical, é essa. E quem pode reclamar da índole? Ou da Natureza? De você nós podemos reclamar, querida.
– Mas a culpa não é minha!
– Estamos cansados do seu distanciamento enquanto mostra no mapa que o calor só vai aumentar. Seu ar superior, como se não tivesse nada a ver com aquilo. Chega!
A mesa da moça do tempo na TV está cercada. Caras raivosas. Ameaça de violência. A moça do tempo na TV se ergue e grita:
– Está bem! Está bem! Amanhã eu faço chegar uma frente fria. Eu prometo!
As pessoas se acalmam. Todos voltam para as suas mesas. O garçom vem tirar o pedido do grupo da moça do tempo na TV e tenta explicar:
– É o calor... O pessoal fica meio louco.
– Você não é a moça do tempo, na TV?
A moça diz que é, sorrindo, mas o homem não sorri. Pergunta:
– Até quando vai esse calor?
– Pois é – diz a moça, ainda sorrindo. – Está difícil de prever. Tem uma zona de pressão na...
– Não – interrompe o homem – não me venha com zona de pressão. Chega de enrolação.
Uma mulher de outra mesa se manifesta:
– Há dias que você põe a culpa pelo calor nessa zona de pressão. E não toma providências.
– Minha senhora, eu...
Outros começam a gritar.
– Sensação térmica de 51 graus. Onde já se viu isso?
– Não dá mais para aguentar!
– Faça alguma coisa!
A moça do tempo na TV agora está em pânico.
– O que eu posso fazer? Eu só descrevo o tempo. Não tenho o poder de...
– Alguém tem que assumir a culpa, minha filha! Sensação térmica de 51 graus, alguém tem que ser responsável.
– A culpa é da Natureza!
– Rá. Natureza. Muito bonito. Muito conveniente. É como culpar a corrupção na índole do brasileiro. Aqui ninguém tem culpa de ser corrupto, é a índole. A índole do tempo, num país tropical, é essa. E quem pode reclamar da índole? Ou da Natureza? De você nós podemos reclamar, querida.
– Mas a culpa não é minha!
– Estamos cansados do seu distanciamento enquanto mostra no mapa que o calor só vai aumentar. Seu ar superior, como se não tivesse nada a ver com aquilo. Chega!
A mesa da moça do tempo na TV está cercada. Caras raivosas. Ameaça de violência. A moça do tempo na TV se ergue e grita:
– Está bem! Está bem! Amanhã eu faço chegar uma frente fria. Eu prometo!
As pessoas se acalmam. Todos voltam para as suas mesas. O garçom vem tirar o pedido do grupo da moça do tempo na TV e tenta explicar:
– É o calor... O pessoal fica meio louco.
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* Jornalista. Escritor. Cronista da ZH
Fonte: ZH online, 10/11/2014
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