O Brasil é um dos maiores consumidores de produtos
para cabelo, Viagra, anabolizantes e maquiagem.
Para a antropóloga
Mirian Goldberg, isso
tem relação com o medo de envelhecer
e a ideia do
corpo como capital
Uma pesquisadora brasileira fez duas perguntas básicas para homens e
mulheres. “Como você se descreveria para um potencial parceiro” e “O que
você inveja no sexo oposto”? As respostas devem surpreender alguns e
confirmar o que os mais atentos podem já ter percebido: a sociedade
brasileira dá muito (muito!) valor à beleza e à juventude.
De acordo com Mirian Goldberg, antropóloga e professora do Programa
de Pós-Graduação em Sociologia da UFRJ, que realizou a pesquisa na área e
expôs suas conclusões em palestra na Casa do Saber – O Globo-RJ nesta
quarta-feira, 6, as mulheres brasileiras disseram que se descreveriam
como jovens, magras e com cabelos bonitos. Sobre a personalidade, a
característica que ganhou foi “divertida”. Já os homens se descreveriam
como altos, jovens e… bem dotados.
Para Goldberg, no Brasil, a preocupação com a beleza tem um caráter
diferenciado, e o corpo é visto como um valioso capital. E é claro que
não é qualquer corpo. “Meu trabalho é com as classes média e alta. Para
as mulheres dessas classes, o corpo e a juventude são de grande
importância. E o corpo essencialmente magro”, diz. Segundo ela, a
obsessão pela magreza contraria justamente o perfil mais característicos
das brasileiras, porque busca em padrões internacionais, um ideal.
“Gilberto Freyre, falando da mistura das raças já dizia que as
brasileiras ‘macaqueavam’ as estrangeiras. Uma pesquisa revelou que
somente 1% das brasileiras está completamente satisfeita com seu corpo.
Isso enquanto em todo o mundo, as brasileiras são consideradas as
mulheres mais bonitas”, diz Goldberg. Ela cita que se Sonia Braga e Vera
Fischer já foram modelos antagônicas no passado, hoje em dia a
dicotomia entre beleza brasileira e beleza estrangeira pode ser vista
em duas musas: Juliana Paes e Gisele Bündchen.
"Pesquisadora constatou que, no Brasil,
medo de envelhecer é tema recorrente
entre mulheres de meia idade"
Sexo oposto e velhice
Quando questionada sobre o que inveja no sexo oposto, a resposta
feminina é unânime: liberdade. Em segundo lugar: fazer xixi em pé. Para
Goldberg, as duas respostas se complementam. A falta de liberdade da
mulher está em diferentes níveis, dos mais complexos. “Até para fazer
xixi a mulher é mais controlada. A mulher não urina em qualquer lugar,
prende até chegar em casa. Quando viaja com o namorado, tem vergonha de
ir ao banheiro, porque foi ensinada assim. Isso também tem relação com a
liberdade”, sugere.
A maioria dos homens, quando perguntados o que mais invejam nas
mulheres, não conseguiu pensar em nada. Para Goldberg, isso mostra que,
no Brasil, a mulher ainda é desvalorizada em seu papel. Apesar dos
homens não invejarem as mulheres, eles também têm uma relação
diferenciada com a beleza. Enquanto as mulheres brasileiras são as
maiores consumidoras de produtos para cabelo e remédios para emagrecer,
eles são um dos maiores consumidores de Viagra e anabolizantes do mundo.
Brasileiros e brasileiras se preocupam com padrões estéticos como
nenhum outro povo.
Para as mulheres, mais especificamente, a antropóloga acredita que,
no que se refere ao corpo, quanto mais se mostra, mais prisioneira se é.
Ela relembrou o caso da atriz Beth Faria, de 72 anos, que apareceu na
praia de biquíni e foi criticada porque estaria muito velha para tal
comportamento. “Mas quem define isso? Nem as próprias mulheres sabem. Só
se sabe que se chega num ponto que elas se veem muito velhas para usar
minissaia, decote, cabelo comprido”. Para a pesquisadora, a relação com a
velhice em outros países é menos cruel.
Ela conta que, em entrevistas feitas no Brasil com mulheres entre 40 e
50 anos, o medo de envelhecer era tema recorrente. Já na Alemanha, onde
também realizou um estudo com mulheres de 60 anos, o tema sequer foi
abordado. “Em outros países, o corpo é tratado de forma diferente. Se
aqui as mulheres se acostumam desde cedo a receberem olhares e cantadas
na rua — não que elas gostem, mas se acostumam — na Alemanha isso é
impensável”, comenta. “O estigma da velhice é muito maior na
brasileira”.
---------------------------
Reportagem por
Nenhum comentário:
Postar um comentário