Martha Medeiros*
Semanas atrás, Zero Hora publicou uma matéria sobre um
recém-lançado dicionário de palavras mortas, a exemplo de “boco-moco” e
“sirigaita”. Em 1997, escrevi uma crônica intitulada Grande África que
tratava desse mesmo assunto divertido. Adoro vocabulário vintage, e eu
incluiria a expressão “ideia de jerico” entre as que sobreviveram, mesmo
cheirando a naftalina. Pelo menos foi ela que me veio à cabeça quando
soube que tem alguém tentando promover um projeto de lei popular que
decretaria visibilidade zero para cigarros e bebidas, em qualquer mídia,
em qualquer lugar – restrição absoluta, tanto visual quanto auditiva.
Seria como se bebida e cigarro tivessem deixado de existir.
Ideia de jerico.
Se for uma proposta xiita como parece, revistas de viagens teriam que ter algumas fotos vetadas: não poderiam, por exemplo, mostrar imagens da La Bodeguita del Medio, em Havana, com suas garrafas de rum nas prateleiras. Aliás, os livros de Hemingway, Bukowski e outros beberrões teriam que deixar de ser reeditados ou sofrer censura, pois poderiam ser cúmplices da tal “visibilidade” – a simples menção de uma palavra como uísque poderia estimular o vício do leitor.
Quadros representando a Santa Ceia teriam que ser retirados das igrejas e dos sacrossantos lares, pois é sabido que Jesus não tomava Coca-Cola. Aliás, a missa também teria que se adaptar ao projeto de lei. Repartir o pão, tudo bem, mas vinho, sem chance.
Na hipótese de recebermos uma mostra de quadros impressionistas, o Absinto, de Degas, ficaria proibido de ser exposto. A imagem de Rita Hayworth como Gilda só circularia no mercado negro. O filme Sobre Café e Cigarros, de Jim Jarmusch, e Obrigada por Fumar, de Jason Reitman, seriam retirados das locadoras. A série Mad Man sofreria sanções inimagináveis.
Capas de livros. Camisetas. Cartazes de filmes. Fotos de moda. Textos de teatro. Biografias. Tudo o que fizesse menção ao tabagismo ou ao álcool, fogueira neles. Inquisição, o Retorno.
Sem falar na música popular brasileira. Cálice, de Chico Buarque, Chuva, Suor e Cerveja, de Caetano Veloso, e Brasil, de Cazuza, nunca mais tocariam nas rádios, assim como uma série de canções de Nana Caymmi, Zeca Baleiro, Luiz Gonzaga, Maria Bethânia, Ney Matogrosso – até Roberto Carlos já falou em cigarro em uma de suas letras, acredite. E todas as duplas sertanejas seriam banidas da face da terra. O que, pensando bem... deixa pra lá.
O politicamente correto tem um pé na boa intenção e outro pé na repressão à liberdade. Costumo ser defensora acirrada da ética, mas não contem comigo para dar trela aos excessivamente bonzinhos, que pretendem higienizar o universo com medidas estapafúrdias que, espero, nunca serão levadas a sério. Se começarem a restringir a arte e a livre expressão, zzzzzzzzz, o tédio dominará o mundo e colocará todos para dormir mais cedo.
Ideia de jerico.
Se for uma proposta xiita como parece, revistas de viagens teriam que ter algumas fotos vetadas: não poderiam, por exemplo, mostrar imagens da La Bodeguita del Medio, em Havana, com suas garrafas de rum nas prateleiras. Aliás, os livros de Hemingway, Bukowski e outros beberrões teriam que deixar de ser reeditados ou sofrer censura, pois poderiam ser cúmplices da tal “visibilidade” – a simples menção de uma palavra como uísque poderia estimular o vício do leitor.
Quadros representando a Santa Ceia teriam que ser retirados das igrejas e dos sacrossantos lares, pois é sabido que Jesus não tomava Coca-Cola. Aliás, a missa também teria que se adaptar ao projeto de lei. Repartir o pão, tudo bem, mas vinho, sem chance.
Na hipótese de recebermos uma mostra de quadros impressionistas, o Absinto, de Degas, ficaria proibido de ser exposto. A imagem de Rita Hayworth como Gilda só circularia no mercado negro. O filme Sobre Café e Cigarros, de Jim Jarmusch, e Obrigada por Fumar, de Jason Reitman, seriam retirados das locadoras. A série Mad Man sofreria sanções inimagináveis.
Capas de livros. Camisetas. Cartazes de filmes. Fotos de moda. Textos de teatro. Biografias. Tudo o que fizesse menção ao tabagismo ou ao álcool, fogueira neles. Inquisição, o Retorno.
Sem falar na música popular brasileira. Cálice, de Chico Buarque, Chuva, Suor e Cerveja, de Caetano Veloso, e Brasil, de Cazuza, nunca mais tocariam nas rádios, assim como uma série de canções de Nana Caymmi, Zeca Baleiro, Luiz Gonzaga, Maria Bethânia, Ney Matogrosso – até Roberto Carlos já falou em cigarro em uma de suas letras, acredite. E todas as duplas sertanejas seriam banidas da face da terra. O que, pensando bem... deixa pra lá.
O politicamente correto tem um pé na boa intenção e outro pé na repressão à liberdade. Costumo ser defensora acirrada da ética, mas não contem comigo para dar trela aos excessivamente bonzinhos, que pretendem higienizar o universo com medidas estapafúrdias que, espero, nunca serão levadas a sério. Se começarem a restringir a arte e a livre expressão, zzzzzzzzz, o tédio dominará o mundo e colocará todos para dormir mais cedo.
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* Escritora. Cronista da ZH
Fonte: ZH on line, 09/01/2013
Imagem da Internet
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