Luiz Felipe Pondé*
Quase todo mundo faz quase o tempo todo quase tudo por poder, dinheiro e sexo
"Meu Deus, eu queria tanto ouvir um pecado novo." Esta frase me foi dita
por uma amiga minha, uma verdadeira dama, citando um padre amigo seu.
Esta fala revela a repetição dos temas humanos: dinheiro, poder, sexo.
Nada há de novo embaixo do sol, como diz a Bíblia Hebraica. Iniciantes
acham que há.
Posso imaginar a monotonia do confessionário. Para nós, mero mortais, a
ideia, por exemplo, de uma mulher contando suas infidelidades, reais ou
imaginárias, é uma delícia de luxúria. Para o apreciador do sexo frágil,
o segredo do mundo está entre as pernas das mulheres.
Aliás, a luxúria é um dos sete pecados capitais. E pecado é coisa séria,
apesar de hoje estar na moda achar que não existem mais pecados. Eu,
que sou um medieval, creio mais neles do que nas ciências humanas.
Ingênuos acreditam que a vida mudou em sua "essência". Mesmo o caso do
Vatileaks repete a velha história de poder, dinheiro e sexo.
Mesmo Jesus, em seus 40 dias no deserto (que por sua vez simbolizam os
40 anos do povo hebreu perdido no Sinai, pós-Egito), foi tentado nesta
velha chave: poder, ouro, mulheres.
Mas existe uma hierarquia nesta estrutura. Por exemplo, ninguém nunca
perdeu mulher perseguindo dinheiro (ouro), mas sim perdeu muito dinheiro
perseguindo mulher, portanto, dinheiro é mais essencial e seguro do que
começar por mulheres. Uma vez tendo o dinheiro, elas virão.
"Sabedorias" como essa falam do pecado, essa marca de nossa natureza
humana. Prever o comportamento humano a partir do pecado é quase uma
ciência exata.
Uma coisa chata sobre essa ciência exata do pecado é justamente ela
furar nossas utopias. E o mundo moderno, assim como é o tempo da técnica
e da ciência, é também o tempo da mentira moral generalizada que se diz
utopia.
Adianto que não uso pecado aqui como algo necessariamente religioso, mas
sim como traço de comportamento verificável do tipo "ratinho do
Pavlov": os sete pecados capitais funcionam "cientificamente" melhor do
que a luta de classes.
Lembre, por exemplo, da inveja que seu colega de trabalho tem quando
você tem mais sucesso do que ele. E se ele não reagir de modo banal,
isto é, babar de inveja, saiba que você está diante de alguém de
caráter. Coisa rara. As feias querem matar suas colegas mais bonitas. A
única esperança das feias é que as bonitas sejam mesmo burras e
superficiais.
Mas a luxúria é top. Depois da revolução sexual pensamos que a luxúria
não existe mais e que "sexo salva". Pensar isso é coisa de iniciante.
O que caracteriza o pecado é que ele extenua a pessoa. A ideia mais
perto disso é a ideia de vício. Vício em drogas, álcool. Luxúria seria o
vício no sexo. Alguns especialistas acham que não existe vício em sexo e
que falar disso é simplesmente ser "moralista" ou ter inveja de quem
faz muito sexo.
Eu suspeito de que quem acha que não existe vício em sexo é que não faz
sexo o suficiente, por isso não sabe o que é estar submetido a um desejo
que destrói a alma. Neste caso, a simples visão de uma mulher, suas
pernas, sua voz, seus gestos, implica no silêncio do resto do mundo.
Os antigos e medievais entendiam mais da natureza humana do que nós,
principalmente porque eram menos utópicos e não sofriam dessa bobagem de
achar que é a "ideologia" que determina quem somos.
A "crítica da ideologia" é uma das pragas contemporâneas e virou uma
espécie de fetiche do pensamento, que nos impede de ver o óbvio: poder e
dinheiro trazem sexo, seja homem ou mulher, isso não é "ideológico".
Quase todo mundo faz quase o tempo todo quase tudo por poder, dinheiro e
sexo.
Sobre o risco de conceitos virarem fetiche, o livro de Luís de Gusmão,
"O Fetichismo do Conceito" (Topbooks), é uma pérola. Recomendo para quem
acredita em "mitos".
Autores como Evagrio Pônticos (345-399), Santo Agostinho (354-430) e São
Tomás de Aquino (1225-1274) podem nos ensinar bastante sobre natureza
humana. Saia da moda e leia os antigos e os medievais. Pra eles, o
pecado é a perda da autonomia da vontade. Quem nunca viveu isso, que se
cale e vá brincar.
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* Filósofo. Prof. Universitário. Escritor. colunista da Folha
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