Marcelo Gleiser*
Satélites querem identificar planetas parecidos com a Terra, mas a ciência mostra que somos raros e valiosos
NESTA SEMANA, a agência espacial americana Nasa autorizou a construção
de um satélite caçador de planetas parecidos com a Terra, mas que giram
em torno de estrelas distantes. Com o nome de Tess (do inglês "Transit
Exoplanet Survey Satellite"), ele identificará a ligeira queda da luz
estelar provocada pela passagem de um planeta à frente de uma estrela, o
método do "trânsito", e deverá ser lançado em 2017.
Kepler, a missão atual, usa o mesmo método e vem identificando milhares
de potenciais planetas e confirmando centenas deles. Tess buscará
planetas em uma região bem mais ampla do céu, focando em estrelas mais
brilhantes.
Com isso, cientistas esperam identificar planetas mais parecidos com a
Terra. A questão é saber quão raro é o nosso planeta, já que a maioria
das estrelas tem planetas orbitando à sua volta.
Nossa galáxia, a Via Láctea, tem em torno de 200 bilhões de estrelas. Se
pelo menos metade delas tem planetas e se, em média, estrelas têm em
torno de quatro planetas, chegamos a 400 bilhões de planetas só na nossa
galáxia.
Como não só planetas mas também suas luas podem ter condições favoráveis
à vida, o número pode chegar a um trilhão de mundos. Sabemos que ao
menos um planeta nesse trilhão tem vida. Quantos outros podem ter?
Milhões? Centenas? Nenhum?
Parte da resposta depende justamente da frequência com que planetas
rochosos como a Terra aparecem dentro da "zona habitável", a região em
torno de uma estrela onde planetas e luas podem ter água líquida. A
complicação é que certas luas fora dessa zona podem ter água líquida,
como é o caso de Europa, a lua de Júpiter, que tem um oceano com quatro
vezes mais água do que todos os oceanos da Terra, sob uma camada de gelo
de dois quilômetros de espessura.
Portanto, um otimista diria que o Universo é cheio de vida, que é
questão de tempo até acharmos algum sinal disso. Afinal, com tantos
planetas e luas por aí... Só que a vida é algo muito complexo. O
primeiro passo --reações químicas que de alguma forma geram vida da não
vida-- não é algo trivial. Tanto que não temos a menor ideia de como
repeti-lo no laboratório.
Missões como Kepler e Tess poderão até identificar traços de substâncias
ligadas à vida na atmosfera de exoplanetas, como o ozônio e o oxigênio.
Se isso ocorrer, teremos evidência de que a vida pode existir por lá. E
é muito provável que algum tipo de vida simples exista em outros
mundos.
Mas se você for um entusiasta de inteligências extraterrestres, a coisa
fica bem mais difícil. Da vida simples aos seres multicelulares --e
destes aos inteligentes--há muitos obstáculos que dependem dos detalhes
da história do planeta.
Junte a isso a ausência de contato com "eles" e vemos que provavelmente
estamos sós. Se não sós, ao menos isolados neste canto da galáxia. O que
significa que somos raros e valiosos. Essa é uma das grandes revelações
da ciência atual. Basta o mundo se convencer disso e começar a mudar.
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