Arnaldo Niskier*
A vida e a obra de Guimarães Rosa foram ambas muito ricas. Daí o acerto da lembrança nas bem-sucedidas
maratonas escolares
Um fato em educação não admite sofisma: os alunos que, desafiando as dificuldades, escrevem melhor são os que mais leem.
Não se conhece uma pesquisa nacional confiável sobre essa verdade, mas
se considerarmos os resultados das maratonas escolares, promovidas por
secretarias de Educação, isso pode ser revelado, com uma indisfarçável
ponta de otimismo. Quanto mais, melhor. É o começo da paixão pela
leitura.
No Rio de Janeiro, a Secretaria municipal de Educação realiza pela
quinta vez consecutiva a sua maratona escolar. Depois de Euclides da
Cunha, Rachel de Queiroz, Erico Verissimo e Ariano Suassuna, chegou a
vez de trabalhar a vida e a obra de Guimarães Rosa.
A secretária Claudia Costin, na Academia Brasileira de Letras (parceira
do empreendimento), recordou que, ao dirigir o Círculo de Leitores em
São Paulo, trouxe jovens alunos de favelas de São Bernardo do Campo para
a capital, para que pudessem melhor se inteirar da obra do autor de
"Grande Sertão: Veredas".
Concluiu que os resultados, em termos de motivação para a leitura, foram
verdadeiramente excepcionais. Confia na repetição desse êxito, agora em
outra capital.
Essa preocupação oficial, em termos culturais, integra o programa Uma
Cidade de Leitores, voltado para alunos de oitavo e nono anos do ensino
fundamental e da educação de jovens e adultos (EJA).
Os estudantes ouvem palestras de acadêmicos sobre Guimarães Rosa,
podendo com eles tirar dúvidas porventura existentes. Depois, farão
redações sobre qualquer obra do escritor de Cordisburgo (MG), nascido em
1908 e que viveu uma dramática experiência com a Academia Brasileira de
Letras.
Não queria se candidatar. Temia pela emoção que isso poderia
representar. Vencido pela insistência de amigos, entre os quais se
incluía Pedro Bloch, cedeu e aceitou o pleito. Venceu, mas adiou a posse
por quatro anos, fato inédito, até que em 1967 resolveu assumir a sua
cadeira. Fez um bonito discurso, muito aplaudido. Morreu quatro dias
depois, confirmando a sua premonição.
Os contos e romances de Rosa, como era conhecido, ambientaram-se quase
todos no sertão brasileiro, que ele conhecia pessoalmente de diversas
visitas, empunhando o seu caderninho de notas. Registrava expressões
próprias, que se tornaram o hit das suas obras. Elas ultrapassaram o
regionalismo tradicional, para se tornar universais.
Daí a existência de inúmeras traduções para diversos idiomas, tarefa que
aparentemente parecia impossível de ser executada. As suas veredas
ganharam o mundo.
Guimarães Rosa foi também médico e um diplomata aplicado. Em companhia
de sua mulher, Aracy, na Segunda Guerra Mundial, ajudou a salvar a vida
de inúmeros judeus perseguidos pelo nazismo. Era cônsul-adjunto em
Hamburgo. Teve uma vida e uma obra muito ricas, daí o acerto da
lembrança nas bem-sucedidas maratonas escolares.
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* ARNALDO NISKIER, 77, doutor em educação, é membro da Academia
Brasileira de Letras e presidente do Centro de Integração Empresa-Escola
no Rio de Janeiro (CIEE-RJ)
Fonte: Folha on line, 11/07/2013
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