Martha Medeiros*
Quarta passada escrevi sobre as vantagens de se ter o
hábito da leitura e, para minha surpresa, recebi um e-mail engraçado,
ainda que a graça fosse involuntária: um senhor de 60 anos defendeu
furiosamente a ideia de que ler é uma perda de tempo, válvula de escape
de preguiçosos que preferem o ócio à realidade – muito melhor seria
viver, praticar esportes. Não explicou como uma coisa impede a outra,
mas seu ataque contra os livros foi tão veemente, que quase acreditei
que os verdadeiros alienados são os que se dedicam às “histórias dos
outros”, como ele disse. Eu estava a ponto de incinerar minha biblioteca
e comprar uma passagem para a Austrália quando um livro me caiu em mãos
e resolvi lê-lo – uma despedida antes de começar a viver de fato. Quem
mandou? Decidi que continuarei criando mofo, tudo por causa de Bom de
Briga, do australiano Markus Zusak, livro que dá prosseguimento a O
Azarão, lançado meses atrás.
Se no primeiro livro os personagens Cameron e Ruben, dois irmãos desajustados de uma família modesta, gastam suas tardes planejando uns crimezinhos mequetrefes pela vizinhança, agora, no segundo livro, eles cresceram um pouco, mas só em tamanho: continuam sem saber o que fazer para se tornar alguém. Até que, por causa de uma briga de rua, os irmãos recebem um convite para lutar às ganhas, valendo dinheiro. É o mais próximo de um emprego que eles já chegaram. A família está na pindaíba, almoça e janta sopa de ervilhas. Os garotos topam.
Os dois livros são excelentes. Uma prosa seca e poética ao mesmo tempo. Está ali, sem pieguice, o processo de iniciação à vida (pois é, os personagens vivem, ao contrário de nós, leitores barrigudos). Em poucas páginas, o significado de vitória e derrota. Dois guris que batem, esmurram, até que o perdedor saia de dentro deles. Que descobrem que a vida é um ringue onde, não importa quanto apanhemos, o importante é levantar do chão.
Não pretendo me inscrever no Ultimate Fighters para levar uns sopapos de verdade. A literatura me aproxima dos efeitos. Emociona, estimula, dá a impressão de que também vivo aquilo tudo, ainda que, segundo o senhor que se orgulha de nunca ter lido um livro, leitura seja um subterfúgio para não frequentar nem ringues nem parques, nem quadras de esporte, nem aeroportos, nem bares, enfim, aquilo que os amantes dos livros ignoram que exista.
Markus Zusak se tornou mais conhecido por A Menina que Roubava Livros, mas esses dois romances que escreveu antes de seu best seller trazem um experimentalismo salutar à criatividade. A crítica, positiva, rotula como “livros para jovens”. Obrigada pela parte que me toca, mas discordo. São universais e uma aula para quem deseja aprender a escrever, já que escrever, ao menos, está atrelado à vida, a julgar pelo próprio autor, Markus Zusak, que a despeito de passar algumas horas em frente ao computador fazendo seu ofício, não esconde de ninguém que o que gosta mesmo é de surfar.
Se no primeiro livro os personagens Cameron e Ruben, dois irmãos desajustados de uma família modesta, gastam suas tardes planejando uns crimezinhos mequetrefes pela vizinhança, agora, no segundo livro, eles cresceram um pouco, mas só em tamanho: continuam sem saber o que fazer para se tornar alguém. Até que, por causa de uma briga de rua, os irmãos recebem um convite para lutar às ganhas, valendo dinheiro. É o mais próximo de um emprego que eles já chegaram. A família está na pindaíba, almoça e janta sopa de ervilhas. Os garotos topam.
Os dois livros são excelentes. Uma prosa seca e poética ao mesmo tempo. Está ali, sem pieguice, o processo de iniciação à vida (pois é, os personagens vivem, ao contrário de nós, leitores barrigudos). Em poucas páginas, o significado de vitória e derrota. Dois guris que batem, esmurram, até que o perdedor saia de dentro deles. Que descobrem que a vida é um ringue onde, não importa quanto apanhemos, o importante é levantar do chão.
Não pretendo me inscrever no Ultimate Fighters para levar uns sopapos de verdade. A literatura me aproxima dos efeitos. Emociona, estimula, dá a impressão de que também vivo aquilo tudo, ainda que, segundo o senhor que se orgulha de nunca ter lido um livro, leitura seja um subterfúgio para não frequentar nem ringues nem parques, nem quadras de esporte, nem aeroportos, nem bares, enfim, aquilo que os amantes dos livros ignoram que exista.
Markus Zusak se tornou mais conhecido por A Menina que Roubava Livros, mas esses dois romances que escreveu antes de seu best seller trazem um experimentalismo salutar à criatividade. A crítica, positiva, rotula como “livros para jovens”. Obrigada pela parte que me toca, mas discordo. São universais e uma aula para quem deseja aprender a escrever, já que escrever, ao menos, está atrelado à vida, a julgar pelo próprio autor, Markus Zusak, que a despeito de passar algumas horas em frente ao computador fazendo seu ofício, não esconde de ninguém que o que gosta mesmo é de surfar.
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* Escritora. Cronista da ZH.
Fonte: ZH on line, 22/05/2013
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