Luis Fernando Veríssimo*
Passei por uma loja que vendia roupa "plus size" para mulheres. Levei
algum tempo para entender o que era "plus size". "Plus", em inglês, é
mais. "Size é tamanho. Mais tamanho? Claro: era uma loja de roupas para
mulheres grandes e gordas, ou com mais tamanho do que o normal. Só não
entendi isto logo porque a loja não ficava em Miami ou em Nova York,
ficava no Brasil. Não sei como seria uma versão em português do que ela
oferecia, mas o "plus size" presumia 1) que a mulher grande ou gorda
saberia que a loja era para ela, 2) que a mulher grande ou gorda se
sentiria melhor sendo uma "plus size" do que o seu equivalente em
brasileiro, e 3) que ninguém mais estranha que o inglês já seja quase a
nossa primeira língua, pelo menos no comércio.
A invasão de americanismos no nosso cotidiano hoje é epidêmica, e
chegou a uma espécie de ápice do ridículo quando "entrega" virou
"delivery". Perdemos o último resquício de escrúpulo nacional quando a
nossa pizza, em vez de entregue, passou a ser "delivered" na porta. Isto
não é xenofobia nem anticolonialismo cultural americano primário, nem
eu acho que se deva combater a invasão com legislação, como já foi
proposto. O inglês, para muita gente, é a língua da modernidade. Todos
queremos ser modernos e, nem que seja só na imaginação, um pouco
americanos. E nada contra quem prefere ser "plus" a ser mais e ter
"size" em vez de altura ou largura. Só é triste acompanhar esta entrega -
ou devo dizer "delivery"? - de identidade de um país com vergonha da
própria língua.
Papo vovô. Engana-se quem acha que os avós vivem num paraíso enquanto
os pais padecem com as crianças. Ser avô também requer prática e
habilidade e, acima de tudo, versatilidade. Ainda mais quando a neta tem
uma imaginação ativa, como a Lucinda, e vive mudando a distribuição de
papéis nos seus faz de contas. Você um minuto é príncipe e no outro é
pai, no outro é caçador e no outro é monstro, e pode passar rapidamente
de rei a cachorro. O que exige do avô um talento histriônico fora do
comum, além de preparo físico. Uma das minhas encarnações é a de marido.
Já nos casamos várias vezes, e como marido tenho um direito que nenhum
outro personagem tem, nem o cachorro: o de ser chamado de "meu amor". É o
meu papel preferido.
-----------
* Escritor.
Imagem da Internet
Fonte: Estadão on line, 23/05/2013
Nenhum comentário:
Postar um comentário