É arriscado, em poucas linhas, fazer um retrato da
juventude. Com facilidade se cai em frases feitas, em preconceitos que
distorcem a realidade. E que impedem uma ação eclesial significativa.
Quantas juventudes?
Uma ideia óbvia é que a juventude… existe. Há uma faixa
da nossa população que já não está na infância e que ainda não se
assume como adulta. Tem vindo a perder peso no total da população
portuguesa, devido à diminuição da natalidade. Mas esta “condição
juvenil”, que antes era uma fase de transição para a idade adulta,
tende a tornar-se um estilo de vida, um estado permanente. Muitos
“adultos” no vestuário, na forma de pensar, na relação com os
compromissos, querem sentir-se como jovens eternos.
Falar de jovens como uma entidade única não faz muito
sentido. Se é verdade que o facto de ter entre 15 e 25 anos (para
apontar uns limites muito ténues) define algo, também é verdade que a
vida real destes jovens é determinada por muitos outros fatores que não
apenas a idade. O género, o nível social e cultural das famílias onde
cresceram, a situação económica da zona onde vivem, são decisivos para
entender a sua identidade de jovens.
Para lá dos aspetos psicológicos (muito ligados ao
fator idade) económicos e sociais, a possível chave para entender o
mundo juvenil esteja na “cultura”. Cultura no sentido dos modos de
pensar, das tendências que configuram a ação e não no sentido de
“erudição”.
Complexidade
Uma marca distintiva das sociedades desenvolvidas e
pós-industriais é a complexidade social. Todos nós, e os jovens também,
vivemos numa sociedade onde nada é simples, onde tudo é complexo, fruto
de múltiplos e contraditórios interesses e forças. Onde tudo poderia
ser configurado de forma diferente.
Os jovens de hoje nasceram e cresceram numa sociedade
onde não há centros claros. Na nossa sociedade há muitos centros de
poder e de legitimidade. E cada um deles gera as suas “regras” e as
suas legitimidades. As regras de jogo são umas quando estamos on-line,
outras quando estamos num estádio a aplaudir a nossa equipa (ou a
insultar o adversário e o árbitro), outras ainda quando estamos na
escola. Pode-se cultivar uma sensibilidade ambientalista, dizer
palavras bem sonantes sobre o desenvolvimento sustentado durante a
semana e passar o fim-de-semana no centro comercial numa orgia de
consumo. Pode-se passar a noite de 4ª feira na oração de Taizé com a
pastoral universitária e a noite de 5ª a “abanar o capacete” alimentado
a ecstasy.
Como não há um centro único que dê legitimidade aos
valores e às práticas, é muito difícil a hierarquização de valores,
necessidades e oportunidades. E esta complexidade desarticulada não é
somente uma situação de facto: torna-se ideologia. A possibilidade de
encontrar um centro existencial sólido aparece, para uma boa parte da
cultura, como algo negativo e perigoso.
Pontes
Na Igreja, é comum os mais sensíveis à pastoral
juvenil perguntarem-se: “O que pedem os jovens à Igreja?” É uma
pergunta sem grande sentido. A esmagadora maioria dos jovens nada pede à
Igreja. Cresceram num mundo onde tudo é comprado e onde o mérito das
propostas de felicidade se mede pela rapidez e pelo baixo custo.
Alguns sectores eclesiais respondem a este estado de
coisas tentando “jogar” segundo as regras da cultura dominante, sem
coragem de pôr em causa este modelo consumista e relativista. E fazem
uma pastoral juvenil que é mais uma mercadoria de consumo: consumo de
socialização (grupos de jovens sem rumo que se resumem a ser umas meras
sociedades recreativas), consumo de eventos, consumo de emoções e
estética (ainda que mascarada de oração). É uma forma de fazer pastoral
juvenil que, em nome duma mal-entendida inculturação, reduz o
Evangelho a um produto descafeinado, que não tem coragem de falar das
exigências do Evangelho (a nível sexual, económico ou político). É uma
caricatura de pastoral juvenil com “tiques de seita”. Onde custa sempre
muito a comunhão eclesial (com a paróquia, com as estruturas
diocesanas de coordenação). Onde se gasta o melhor das energias virados
“para dentro”; onde não há abertura à missão, ao mundo da vida.
Sementes de um futuro já presente
Mas há já presentes nas nossas comunidades eclesiais
alternativas de pastoral juvenil bem mais consistentes. Vai estando
claro que a pastoral juvenil tem de ser profundamente diversificada
(porque diversa é a realidade dos jovens). É inútil procurar um modelo
standard de pastoral juvenil. Na boa tradição da Igreja, o Evangelho
torna-se realidade ao encontrar os jovens onde eles estão. E sendo o
mundo dos jovens tão fragmentado, a ação da Igreja com os jovens (a
pastoral juvenil) assume uma miríade de configurações e propostas.
(...)
Outra das grandes intuições para a pastoral juvenil é
profundamente contra-cultural: numa cultura consumista, o Evangelho
faz-se amor gratuito. A pastoral juvenil que vai tendo sucesso
consistente é aquela em que a Igreja se aproxima dos jovens oferecendo o
melhor que tem (o evangelho de Jesus Cristo na sua pureza original)
sem nada esperar em troca. Sem instrumentalizar os jovens. Sem os usar
como mão-de-obra barata para eventos eclesiais.
A pastoral juvenil está também a tornar-se amor
educativo. Olhamos para cada jovem e vemo-lo com o olhar de Cristo.
Vemos, ainda que em potência, tudo o que ele tem para dar. E
oferecemo-nos para caminhar ao seu lado, descobrindo a graça
libertadora que vem de Cristo Ressuscitado.
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P. Rui Alberto, sdb
In Agência Ecclesia
In Agência Ecclesia
FONTE:http://www.snpcultura.org/vol_igreja_jovens_que_dialogo.html 08.09.10
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