Juremir Machado da Silva*
Eu amo os velhos. Especialmente as velhas. Elas
também me amam. É um amor platônico feito de crônicas e alguns abraços
nas ruas de Porto Alegre. Existe entre nós algo que se pode chamar de
“afinidades eletivas”. Gostamos de arte, ironia, grandes provocações e
pequenas implicâncias. A objetividade dos homens não compreende isso.
Não preciso de eufemismos como terceira idade ou melhor idade para falar
de velhos. Não há desrespeito intrínseco na palavra velho. Agora, na
prática, há uma ideologia antivelho alimentada pela modernidade. Antes
de ir ao show do genial e serelepe Charles Aznavour, que celebrou seus
89 anos de idade cantando no Araújo Vianna, ouvi várias pessoas entre os
20 e os 50 anos exclamando:
– Charles Aznavour?! Coisa de velho!
Coisa de velho com bom gosto. Coisa de certos jovens é Luan Santana,
Michel Teló, Fernando e Sorocaba e outros expoentes do sertanejo
universitário. Eu implico com sertanejo universitário. Faço tudo para
compreender esse gênero tão em moda no Brasil. Não consigo. Adoro
sertanejo de raiz. Gosto de todos os gêneros musicais. Menos de
sertanejo universitário. Mas quero mudar de ideia por abertura de
espírito. O problema é que presto atenção nas letras. Por exemplo, esta,
de uma canção de Fernando e Sorocaba: “Eu não gosto de cinema/eu não
sei cozinhar/Nunca fui tão cavalheiro/jurei nunca casar”. A cacofonia de
“nunca casar” acaba com minha boa vontade. A pobreza da letra me leva a
uma sugestão: se o que importa é o ritmo, melhor não ter letra. Ficaria
muito mais rico.
Velhas gostam de poesia. No ônibus, ouvi a conversa de dois jovens e um senhor de cabelos bastante grisalhos:
– Nixon é um lugar ou uma pessoa? – pergunta o rapaz.
Rapaz é palavra de velho. O ancião sorri.
– Foi um presidente dos Estados Unidos – informa.
– Eu não disse que era um cara – completa a guria.
Jovens não precisam saber tudo. Têm tempo para aprender. Tanto tempo
que alguns esquecem de começar. Velhos é que sabem nomes de presidentes
americanos e dos principais afluentes do Amazonas na ponta da língua.
– Margem direita: Javari, Jutaí, Juruá, Madeira, Purus, Coari. Margem esquerda: Napo, Içá, Negro, Jari e Paru.
– Qual o outro nome do Içá?
– Putumayo.
– Que cultura! Vai ser deputado ou do Banco do Brasil.
Como não tinham google, eram obrigados a valorizar a memória.
Proponho um novo pacto entre jovens e velhos. Os jovens passam a
respeitar a experiência dos velhos e estes passam a se abrir para as
novidades defendidas pelos jovens. A única coisa que não entendo é
sustentar que o novo é sempre melhor do que o velho. Produz isto:
– Troquei o programa.
– Eu vi. Ficou pior.
– O senhor tem dificuldade com a mudança.
– Tu tens preconceito com a permanência.
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* Sociólogo. Prof. Universitário. Escritor
Fonte: Correio do Povo on line, 30/05/2013
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