sábado, 18 de maio de 2013

Filhos da nova classe média

GERAÇÃO C

 

O Prouni abriu caminho para Stéphane (C, de óculos) qualificar sua formação profissional e hoje ela serve de inspiração para seu irmão Victor (de camisa xadrez)

A pesquisa da Geração C, realizada pelo Instituto Data Popular, revela que cerca de 23 milhões de jovens entre 18 anos e 30 anos devem consolidar a ascensão social da chamada classe C por volta de 2022

Eles representam mais da metade dos jovens brasileiros, têm o dobro da escolaridade de seus pais, acessam notícias diariamente pela internet e têm opiniões menos conservadoras em relação à mulher e ao homossexualismo.

É o que aponta a pesquisa Geração C, recentemente concluída pelo Instituto Data Popular, traçando o perfil dos filhos da nova classe média.

– Esta é a primeira geração de universitários da classe média brasileira, o que é uma conquista. Mas a experiência tem mostrado que só essa formação não tem sido suficiente para uma boa colocação no mercado de trabalho – pondera o sócio-diretor do Data Popular, Wagner Sarnelli.

A relações públicas Angela Braun, 28 anos, sabe disso. Filha da empregada doméstica Maria Nelsi e do torneiro mecânico Darci, ambos de 53 anos, ela começou a trabalhar como secretária aos 16 anos, no turno oposto à escola, para pagar as próprias contas e poder ajudar a família.

– A faculdade era uma coisa distante, eu me preocupava mesmo era em conseguir um bom emprego – conta Angela, como quem concorda com 61% dos jovens ouvidos na pesquisa, que consideram ser possível progredir somente com muito trabalho.

Por outro lado, 82% deles também acreditam que o diploma universitário melhora o currículo. Foi o caminho percorrido por Angela, que se formou em Comunicação Social na Univattes, em 2009, mas só no ano passado, depois de concluir uma pós-graduação, conseguiu um emprego na área. Hoje, trabalha no marketing da universidade e até já financia a casa própria.

Programa ajuda elevar formação

Para o doutor em Ciências Sociais Rudá Ricci, membro do Observatório Internacional da Democracia Participativa, o aumento do grau de instrução resulta no excesso de diplomados buscando vagas, o que diminui o valor do título e leva as médias salariais para baixo.

– Temos de repensar esse modelo educacional. Na Alemanha, por exemplo, 70% dos jovens buscam formação profissionalizante – comenta Ricci.
Angela (na foto com os pais) concluiu pós- graduação, tem um bom emprego e financia a casa própria

Só o Programa Universidade para Todos (Prouni) já distribuiu 1,6 milhão de bolsas desde 2005, ajudando a elevar de 7% para 18% o índice de formação universitária entre os jovens da classe C.

Foi o Prouni que abriu caminho para Stéphane Dias chegar aos 25 anos cursando doutorado em Linguística na Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS). A jovem desenvolve pesquisa com foco no diálogo para mediação de conflitos.

– Uma mente bem formada tem mais ferramentas para avaliar juízos e tomar decisões – considera.

O discurso serve de inspiração para o irmão, Victor, 19 anos, estudante de Relações Internacionais na UniRitter, também com Prouni. A mãe, Silésia, 51 anos, que é cuidadora de idosos, reconhece a importância do programa do governo para que os filhos tivessem acesso à universidade. A troca de conhecimentos em casa mostra que o estudo é levado a sério: Victor aprendeu inglês com Stéphane e está formulando a pesquisa de conclusão de curso com ajuda da irmã.

– Eles têm um futuro brilhante pela frente – vislumbra o vigilante Carlos Alberto Dias, 57 anos, o pai orgulhoso.

Na opinião do antropólogo Moisés Kopper, do Grupo de Estudos em Antropologia Econômica e Política da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), para que jovens como os irmãos Dias tenham colocação profissional à altura de sua qualificação, será preciso investir em áreas hoje carentes de produção nacional, como tecnologia. Uma crise de mão de obra primária não é descartada pelo pesquisador:

– O Brasil já emprega imigrantes de países pobres, sobretudo na construção civil.

Rejeição à política do “pão e circo”

Projetar mudanças a partir da segunda geração da classe C tem desafiado pesquisadores, diante da rápida ascensão de 40 milhões de brasileiros que não tinham qualquer reconhecimento social e agora vão ao shopping, pegam avião, compram celular – e acessam a internet pelo telefone.

O sociólogo Rudá Ricci considera um alento saber que 49% dos jovens dessa classe aprovam o casamento gay e 52% aceitariam “numa boa” ter um filho homossexual, o que pode formar uma sociedade mais tolerante ali na frente. Mas ele é pouco esperançoso de que esta geração, mais escolarizada e mais conectada, possa ser mais crítica em relação a anterior, quando chegar à idade adulta.

– A juventude é historicamente contestadora, mas, na medida que você vai se envolvendo com o status quo, mesmo que você tenha ainda valores progressistas, você vai se enquadrando nos padrões que estão postos – comenta Ricci.

Para o antropólogo Moisés Kopper, que integra um grupo de estudos sobre classe média, a cidadania passa a ser experimentada por esta nova classe social no ato de consumir e ter acesso a redes de informação. Dados da pesquisa Geração C apontam para esse caminho: 57% dos acessos a redes sociais são de jovens da classe média, 51% desses jovens acompanham notícias pela internet diariamente, 31% reclamam de marcas em redes sociais com frequência e 75% dizem adorar produtos tecnológicos de última geração.

– A longo prazo, essa inclusão no acesso a bens tecnológicos poderá produzir cidadãos e consumidores mais exigentes quanto aos seus direitos – avalia Kopper.

Segundo o pesquisador, esta nova classe rejeita a política do “pão e circo” e tende a cobrar mais o Estado pela qualidade dos serviços.

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tais.seibt@zerohora.com.br
Reportagem por TAÍS SEIBT
Fonte: ZH on line, 18/05/2013

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