CAROL BENSIMON*
De qualquer
maneira, se quisermos insistir no termo, muitas coisas podem ser
chamadas de “porta de entrada”.
Um pai ausente.
O fim de um
relacionamento.
Um fracasso profissional.
Ou uma situação socioeconômica
precária.
Essa sim, a maior de todas as portas.
Você com certeza já ouviu o seguinte argumento sair da
boca de quem é contra a legalização ou a descriminalização da maconha: a
canábis, essa planta que foi remédio na China, velas nas frotas de
Colombo e Cabral, baforada pelos Beatles e por Bob Dylan em pleno
Palácio de Buckingham, seria a porta de entrada para outras drogas. Daí a
periculosidade de uma mudança legal. É um argumento, repare bem, que
admite que a maconha, por si só, não se constitui um problema tão grave;
o risco estaria no fato de ela ser o primeiro degrau na subida rumo à
dependência química.
Mas a teoria da maconha como porta de entrada não se sustenta em um debate minimamente aprofundado. Se é certo que muitas pessoas com problemas sérios de drogadição começaram por ela, quantas outras a experimentaram sem jamais migrar para drogas mais pesadas?
No fim das contas, nós adoramos culpabilizar as coisas e eximir as pessoas de sua responsabilidade, com frequência tirando da equação o contexto social, os dramas familiares e a complexidade existencial que atormenta cada um de nós. Pegue como exemplo a história recente de Marcelo Pesseghini, o menino que, durante um surto psicótico, matou a família. Marcelo adorava jogos violentos de videogame. Então o videogame foi a porta de entrada? Quantas pessoas jogam esses mesmos jogos e não se tornam assassinas? O fato de o menino ter uma doença que o mataria em poucos anos, o que portanto lhe deu pais superprotetores, ambos, aliás, policiais, que ensinaram Marcelo a atirar e a dirigir antes dos 13 anos, não parecem elementos muito mais decisivos nessa tragédia?
No caso das drogas, o correto seria considerar o traficante como porta de entrada, não a maconha. Por intermédio dele, o fumante ocasional tem acesso a uma gama muito mais perigosa de drogas, como é inegavelmente o caso do crack. O que parece, portanto, mais urgente para a sociedade, continuar alimentando a guerra insana do tráfico, que destrói famílias e comunidades inteiras, ou tirar a figura do traficante dessa transação, permitindo o cultivo para consumo próprio, a exemplo do que está em curso no Uruguai?
Nunca vi alguém considerar um cálice de vinho a porta de entrada para o alcoolismo. Acontece que em alguns casos é, mas não na maioria deles, o que justifica o fato de essa substância ser uma droga legalizada; há níveis seguros de administração de álcool, e apenas uma minoria (cerca de 10% dos brasileiros) o consome em excesso.
De qualquer maneira, se quisermos insistir no termo, muitas coisas podem ser chamadas de “porta de entrada”. Um pai ausente. O fim de um relacionamento. Um fracasso profissional. Ou uma situação socioeconômica precária. Essa sim, a maior de todas as portas.
Mas a teoria da maconha como porta de entrada não se sustenta em um debate minimamente aprofundado. Se é certo que muitas pessoas com problemas sérios de drogadição começaram por ela, quantas outras a experimentaram sem jamais migrar para drogas mais pesadas?
No fim das contas, nós adoramos culpabilizar as coisas e eximir as pessoas de sua responsabilidade, com frequência tirando da equação o contexto social, os dramas familiares e a complexidade existencial que atormenta cada um de nós. Pegue como exemplo a história recente de Marcelo Pesseghini, o menino que, durante um surto psicótico, matou a família. Marcelo adorava jogos violentos de videogame. Então o videogame foi a porta de entrada? Quantas pessoas jogam esses mesmos jogos e não se tornam assassinas? O fato de o menino ter uma doença que o mataria em poucos anos, o que portanto lhe deu pais superprotetores, ambos, aliás, policiais, que ensinaram Marcelo a atirar e a dirigir antes dos 13 anos, não parecem elementos muito mais decisivos nessa tragédia?
No caso das drogas, o correto seria considerar o traficante como porta de entrada, não a maconha. Por intermédio dele, o fumante ocasional tem acesso a uma gama muito mais perigosa de drogas, como é inegavelmente o caso do crack. O que parece, portanto, mais urgente para a sociedade, continuar alimentando a guerra insana do tráfico, que destrói famílias e comunidades inteiras, ou tirar a figura do traficante dessa transação, permitindo o cultivo para consumo próprio, a exemplo do que está em curso no Uruguai?
Nunca vi alguém considerar um cálice de vinho a porta de entrada para o alcoolismo. Acontece que em alguns casos é, mas não na maioria deles, o que justifica o fato de essa substância ser uma droga legalizada; há níveis seguros de administração de álcool, e apenas uma minoria (cerca de 10% dos brasileiros) o consome em excesso.
De qualquer maneira, se quisermos insistir no termo, muitas coisas podem ser chamadas de “porta de entrada”. Um pai ausente. O fim de um relacionamento. Um fracasso profissional. Ou uma situação socioeconômica precária. Essa sim, a maior de todas as portas.
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* Interina
Fonte: ZH on line, 21/09/2013
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