Aos 79 anos, Ângelo Machado continua produzindo: vai à
universidade duas vezes
por semana e trabalha 10 horas diárias em casa,
por semana e trabalha 10 horas diárias em casa,
pesquisando sobre libélulas ou escrevendo artigos científicos, livros e
peças de teatro.
(foto: Matheus Ventura)
A CH 306 traz o perfil de Angelo Machado, zoólogo,
neurocientista e especialista em libélulas de fama mundial. Sua
trajetória é marcada pela atuação em várias áreas: da pesquisa e
docência à divulgação científica e produção de obras literárias e
teatrais.
Por: Roberto B. de Carvalho
Um diálogo com o filho Eduardo, quando este tinha sete anos,
sintetiza bem o espírito versátil do cientista e escritor Angelo Barbosa
Monteiro Machado, nascido em Belo Horizonte a 22 de maio de 1934. Certo
dia, de volta da escola, o menino procurou o pai:
– A professora pediu uma pesquisa sobre a profissão dos pais. O que é que você faz?
– Sou professor universitário.
– Mas, pai, eu pensei que você fosse médico...
– Sou médico, mas não exerço a profissão.
– Mas você não estudou medicina?
– Sim, estudei.
– Mas eu vejo você mexendo só com bicho. Então você é veterinário...
– Não sou veterinário, sou zoólogo.
– Professor, médico, zoólogo... Ouvi dizer que você é escritor também?
– Isso mesmo.
– Ô, pai, e aquele lugar que você entrou, como é mesmo que chama?
– Academia. Academia Brasileira de Ciências.
– Isso! A mamãe disse que lá só tem cientista. Então você é cientista também?
– Sim.
– Quer saber, pai? Você é uma confusão! Vou fazer a pesquisa com a mamãe.
– Sou professor universitário.
– Mas, pai, eu pensei que você fosse médico...
– Sou médico, mas não exerço a profissão.
– Mas você não estudou medicina?
– Sim, estudei.
– Mas eu vejo você mexendo só com bicho. Então você é veterinário...
– Não sou veterinário, sou zoólogo.
– Professor, médico, zoólogo... Ouvi dizer que você é escritor também?
– Isso mesmo.
– Ô, pai, e aquele lugar que você entrou, como é mesmo que chama?
– Academia. Academia Brasileira de Ciências.
– Isso! A mamãe disse que lá só tem cientista. Então você é cientista também?
– Sim.
– Quer saber, pai? Você é uma confusão! Vou fazer a pesquisa com a mamãe.
Ainda muito jovem, revelou aptidão incomum
no trato com insetos
Numa época marcada pela superespecialização, um tipo singular, como é
o caso de Angelo Machado, pode mesmo confundir até juízos menos
ingênuos que o de uma criança. Ainda muito jovem, revelou aptidão
incomum no trato com insetos, especialmente as libélulas, grupo em que
se tornou especialista de fama mundial.
Convidado pelo respeitado entomólogo Newton Santos (1916-1989) para
aprimorar seus conhecimentos sobre insetos no Museu Nacional do Rio de
Janeiro, não hesitou em aceitar o convite. Hospedado na casa do tio
Aníbal Machado (1894-1964), aproximou-se dos intelectuais que aos
domingos acorriam à residência do ilustre escritor, em Ipanema, para
participar das famosas ‘domingueiras do Aníbal’. Foi assim que começaram
a se solidificar as bases de um terreno que só mais tarde exploraria
com afinco: a literatura e o teatro.
Antes mesmo de ingressar na Faculdade de Medicina da Universidade
Federal de Minas Gerais (UFMG), começou a fazer uma histologia de ponta
ao lado do especialista Wladimir Lobato Paraense (1914-2012), que
trabalhava no escritório do Instituto Osvaldo Cruz em Belo Horizonte.
Foi o início de uma brilhante carreira do morfólogo que depois se
especializaria em ciências do cérebro.
Com a naturalidade dos predestinados, que mantêm um olho vivo no
presente e outro bem assestado no futuro, Angelo sempre agarrou com
determinação as boas chances que a vida lhe ofereceu. Hoje, aos 79 anos,
vai duas vezes por semana ao Departamento de Zoologia da UFMG – do qual
foi professor ao se aposentar no Departamento de Morfologia da mesma
universidade – e trabalha 10 horas diárias em casa, pesquisando sobre
libélulas ou escrevendo artigos científicos, peças de teatro e livros de
literatura infantojuvenil.
Quem conhece Angelo Machado ou já assistiu
a uma de suas palestras jamais se esquece
do fino humor que permeia seu discurso
O saldo de uma vida dedicada à pesquisa e à escrita pode ser
contabilizado nos 130 artigos científicos que publicou, nas inúmeras
espécies zoológicas descritas em sua homenagem e nos muitos prêmios que
recebeu, entre eles o Henry Ford de Conservação do Meio Ambiente, em
1998, o José Reis de Divulgação Científica, em 1995, e o Jabuti de
Literatura infantojuvenil, em 1993, por O velho da montanha: uma aventura amazônica. Além deste, publicou outros 35 livros para crianças e adolescentes.
Quem conhece Angelo Machado ou já assistiu a uma de suas palestras em
eventos científicos, culturais ou de divulgação de ciência sabe de seu
talento para comunicar-se com públicos de diferentes áreas e idades,
reconhece o quanto se aprende ouvindo-o falar e jamais se esquece do
fino humor que permeia seu discurso.
Certa vez, falando do amigo, disse o dramaturgo mineiro Jota Dângelo:
“o Angelo é um humorista nato e poderia ter vivido disso se quisesse”.
Ele não quis viver disso, mas nunca abriu mão de enfrentar a vida com
humor, tendo sempre, na ponta da língua, uma piada oportuna e
inteligente para as mais variadas situações. Ganham com isso seus
interlocutores, ganha com isso principalmente ele próprio, que sabe
levar a vida como ninguém.
Você leu apenas o início do perfil publicado na CH 306. Clique no ícone a seguir para baixar a versão integral.
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