Gilles Lapouge*
Os assassinos
suicidas matam seus inimigos com uma "arma absoluta": sua própria morte.
PARIS - No Quênia, em Nairóbi, homens invadem um
shopping center, atiram contra a multidão, matam 61 civis e deixam 200
feridos.
Num outro país africano, a Nigéria, membros do grupo Boko Haram
atacam a pequena cidade de Borno. Incendeiam duas casas. Os habitantes
saem às ruas. Os terroristas atiram, há 150 cadáveres.
No Paquistão, na Ásia, um duplo atentado suicida tem por alvo a
igreja cristã de Peshawar. Cinquenta mortos. Os camicazes atiraram no
momento em que as pessoas saíam da missa.
Cada um desses três ataques foi provocado por uma situação singular,
local ou regional. No entanto, está claro que os três têm um ponto
comum. Foram perpetrados pelo islamismo radical que há muitos anos vem
enlutando a Terra.
Sem subestimar a culpa assustadora dos jihadistas islamistas, podemos
perguntar se um outro delírio não está se formando. Tudo ocorre como se
uma "Internacional dos Apaixonados pela Morte" castigasse duramente
nosso planeta há um século.
No início da Guerra Civil da Espanha, em 1936, um fato que ocorreu
poderia servir de "frontispício" para nosso tempo e talvez até para esse
longo romance ensanguentado que nós chamamos de A História.
Em 12 de outubro de 1935, uma cerimônia é realizada na Universidade
de Salamanca por soldados fascistas. O general franquista Milan Astray,
homem caolho, manco e perneta, pronuncia um discurso que termina com
essa frase: "Viva a morte!".
O reitor da Universidade de Salamanca é o grande filósofo Miguel de
Unamuno (O sentimento trágico da vida). É um homem de direita, mas não é
fascista. Ele toma a palavra. "Acabo de ouvir um grito insano e
desprovido de sentido, 'Viva la muerte'. É um grito bárbaro,
repugnante." Na sala, desencadeia-se a desordem. O general fascista
repete mecanicamente: "Viva a morte! Morte à inteligência!"
Os legionários fascistas marcham na direção do filósofo Unamuno. Este
se retira dignamente em meio ao público vociferante. Morrerá alguns
dias mais tarde, no último dia do ano de 1936. De tristeza.
Menos de dez anos depois, no dia 10 de junho de 1944, a divisão alemã
Das Reich, na França, desloca-se na direção da Normandia - onde ocorre o
desembarque dos aliados. Os alemães chegam à aldeia de Oradour sur
Glane. Reúnem todos os habitantes, sem exceção, e atiram: 642 cadáveres.
O que há de espantoso? Há muitos anos, o líder alemão, Adolf Hitler,
também celebra seu "amor pela morte" assassinando milhões de judeus nas
câmaras de gás.
Hoje, outros adoradores da morte massacram, sem qualquer motivo, sem
mesmo um pretexto, crianças, mulheres, camponeses, gente pacífica, de
uma extremidade à outra da África e da Ásia. Eles contribuem,
aprimorando-o, para o amor à morte celebrado pelo general franquista de
Salamanca, pelos soldados alemães de Das Reich e pelos especialistas das
câmaras de gás.
Não se contentam em amar a morte dos outros, amam também a própria
morte, porque se reúnem às suas vítimas no mesmo nada. Os assassinos
suicidas matam seus inimigos com uma "arma absoluta": sua própria morte.
----------------------------------
*Gilles Lapouge é correspondente em Paris.
TRADUÇÃO DE TEREZINHA MARTINOFONTE: Estadão on line,26/09/2013
Imagem da Internet
Nenhum comentário:
Postar um comentário