Martha Medeiros*
Anda difícil ser jovem. O leque de opções é farto e
isso deixa qualquer um indeciso. E, até quando se decide com alguma
convicção, pouco adianta: onde foram parar os empregos, onde estão os
amores, o que fazer quando as coisas não saem como o esperado?
De uma coisa a protagonista de 27 anos do filme Frances Ha sabe: “dar certo” é algo muito relativo – e restrito. Existem poucas vias para o sucesso e inúmeras para o fracasso. A única maneira de conseguir vaguear pela vida sem lamentar as tentativas frustradas é reconhecer que a normalidade também pode ser manca, vesga e fanha. Mesmo quando tem chance de acertar, Frances prefere apostar no azarão: “Gosto das coisas que parecem erros”.
E já que ela revela isso com um sorriso no rosto, e não resmungando, subverte a questão e mostra que o “erro” pode ser um estilo de vida aceitável, é só cuidar para que ele não provoque isolamento nem nos conduza ao “ai de mim”. Arriscar com graça e autenticidade pode ser um acerto do avesso.
Nem todos querem ser campeões em tudo. Os errantes não aparecem nas colunas sociais nem são exemplos de virtude, mas têm um jeito próprio de se expressar e de existir, lutando para manter sua identidade mesmo na contramão do que se estabeleceu como “certo”. Conheço, por exemplo, quem prefira dias nublados e chuvosos, o que soa como errado, ainda que um erro poético. Só que a poesia não tem nada a ver com essa preferência. Um dia, essa pessoa me confessou que gostava de dias nublados porque era quando não se sentia cobrada a “aproveitar a vida lá fora”. Ela aproveitava a vida por dentro, e o clima fechado era seu cúmplice diante de uma sociedade que decretou como certo que todas as pessoas devem frequentar parques e praticar exercícios ao ar livre. Quando chovia, ela tinha a rara oportunidade de se sentir enquadrada.
Há caminhos bem sinalizados para se ter uma vida plena, saudável e com garantia de receber uma estrelinha dourada ao final da jornada, mas há quem se sinta tentado pelos desvios. Qual o problema de não querer ter filhos ou de não desejar fazer parte da diretoria? Lembro de uma passagem divertida de um livro de Martin Page. O personagem recebe uma promoção e a recusa, questionando. “Por que sou obrigado a evoluir?”. O patrão insiste: “Mas você faz um trabalho excelente!”. E ele: “Não faço isso de propósito”.
Há quem não queira mais responsabilidades do que já tem, mesmo que isso implique ganhar menos dinheiro. Quem decretará que isso é falta de rumo?
Errantes somos todos, em algum aspecto. Fazer besteira para chamar a atenção é contraproducente, mas optar por alternativas não abençoadas pelo senso comum pode ser apenas uma maneira de levar a vida como se gosta.
------------------De uma coisa a protagonista de 27 anos do filme Frances Ha sabe: “dar certo” é algo muito relativo – e restrito. Existem poucas vias para o sucesso e inúmeras para o fracasso. A única maneira de conseguir vaguear pela vida sem lamentar as tentativas frustradas é reconhecer que a normalidade também pode ser manca, vesga e fanha. Mesmo quando tem chance de acertar, Frances prefere apostar no azarão: “Gosto das coisas que parecem erros”.
E já que ela revela isso com um sorriso no rosto, e não resmungando, subverte a questão e mostra que o “erro” pode ser um estilo de vida aceitável, é só cuidar para que ele não provoque isolamento nem nos conduza ao “ai de mim”. Arriscar com graça e autenticidade pode ser um acerto do avesso.
Nem todos querem ser campeões em tudo. Os errantes não aparecem nas colunas sociais nem são exemplos de virtude, mas têm um jeito próprio de se expressar e de existir, lutando para manter sua identidade mesmo na contramão do que se estabeleceu como “certo”. Conheço, por exemplo, quem prefira dias nublados e chuvosos, o que soa como errado, ainda que um erro poético. Só que a poesia não tem nada a ver com essa preferência. Um dia, essa pessoa me confessou que gostava de dias nublados porque era quando não se sentia cobrada a “aproveitar a vida lá fora”. Ela aproveitava a vida por dentro, e o clima fechado era seu cúmplice diante de uma sociedade que decretou como certo que todas as pessoas devem frequentar parques e praticar exercícios ao ar livre. Quando chovia, ela tinha a rara oportunidade de se sentir enquadrada.
Há caminhos bem sinalizados para se ter uma vida plena, saudável e com garantia de receber uma estrelinha dourada ao final da jornada, mas há quem se sinta tentado pelos desvios. Qual o problema de não querer ter filhos ou de não desejar fazer parte da diretoria? Lembro de uma passagem divertida de um livro de Martin Page. O personagem recebe uma promoção e a recusa, questionando. “Por que sou obrigado a evoluir?”. O patrão insiste: “Mas você faz um trabalho excelente!”. E ele: “Não faço isso de propósito”.
Há quem não queira mais responsabilidades do que já tem, mesmo que isso implique ganhar menos dinheiro. Quem decretará que isso é falta de rumo?
Errantes somos todos, em algum aspecto. Fazer besteira para chamar a atenção é contraproducente, mas optar por alternativas não abençoadas pelo senso comum pode ser apenas uma maneira de levar a vida como se gosta.
* Escritora.
Fonte: ZH on line, 11/09/2013
Imagem do filme:Frances Ha
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