ANSELMO BORGES*
A sua ordem é um pouco arbitrária, mas começaria pela globalização. Pela primeira vez, somos verdadeiramente uma "pequena aldeia". Devido às redes de transportes e comunicações, fluxos de bens, serviços, capitais, conhecimentos e pessoas, os países e os povos do mundo estão cada vez mais integrados numa sociedade global. O que vai então significar a globalização: simples liberalização económica? Que nova configuração vai ter o mundo, com a emergência dos BRICS e, concretamente, das potências asiáticas, nomeadamente da China e da Índia? E o que será da Europa, se não caminhar para estruturas federativas?
A globalização contemporânea, a partir de 1945, tem características próprias e coloca problemas gigantescos, como escreveu A. Sasot Mateus: as tendências monopolistas do capital, a ausência de mecanismos para a fiscalização da especulação financeira à escala planetária, o terrorismo global, a falta de mecanismos efectivos para a resolução dos conflitos internacionais, os problemas ligados à sustentabilidade mundial, a desintegração da coesão social, o desemprego, os défices democráticos nas instituições estatais e supra-estatais e as ameaças à própria democracia devido à subordinação à ditadura financeira, tráficos ilegais de todo o tipo: armas, pessoas, drogas, órgãos, com máfias poderosíssimas à mistura, paraísos financeiros que fomentam a falta de solidariedade e branqueiam capitais de origem duvidosa... No quadro da globalização, com os problemas globais, é evidente que é necessário pensar numa governança global.
Este mundo globalizado, é, também por força dos fluxos migratórios, um mundo multicultural e a questão que se coloca é se vamos entrar num choque de culturas e civilizações ou se, pelo contrário, seremos capazes de abrir portas para uma aliança de culturas, mediante o diálogo intercultural e inter-religioso. Como impedir a homogeneização cultural? Por outro lado, como proteger a diversidade cultural, sem permitir a lesão dos direitos humanos?
E aí está uma nova cultura: a cibercultura, que o sociólogo M. Castells estudou, analisando a estrutura da "era da informação" como "sociedade da rede". As novas gerações nascem sob o impacto das novas tecnologias electrónicas, que modelam a sua visão da existência e do mundo. Navegando por infindos ecrãs de textos e imagens, ligando-se em fóruns de discussão e intervenção, trocando mensagens de simultaneidade generalizada, perdendo a noção do tempo e da realidade mediante a entrada no virtual, marcando encontros cibersexuais, experimentam uma nova revolução em curso. Então, que novo tipo de homem, que nova imagem do corpo, que nova relação com a memória e o tempo? Na relação universal virtual, não se perde a relação com o outro face a face, mergulhando na insuportável solidão? E não cresce o perigo de novas formas de exclusão, com o novo analfabetismo: o cibernético? E no meio de tsunamis de informação, como analisá-la criticamente e distinguir? E não se ergue um risco maior: o de, esquecendo a dimensão vertical, sem referências, a Rede transformar-se, na expressão feliz de João Maria André, num Labirinto?
Outras revoluções estão em curso: a genética e as neurociências - o cérebro é o infindável novo continente em exploração. Poderemos, com as novas tecnologias, vir a vencer a dor, o envelhecimento e a própria morte? Assistir-se-á à transformação da natureza do humano? Caminharemos para o pós--humano e um transhumanismo, que fazem inclusivamente alguns pensarem na possibilidade de uma bifurcação da Humanidade? Os novos desafios: manipulação genética, manipulação da actividade cerebral, investigação em embriões, clonagem, híbridos, criação do super-homem...
Não se pode deixar de apontar o desafio ecológico, quando o planeta está em risco e a Humanidade pode deixar de ter futuro.
Poderá esquecer-se o Transcendente, ao menos enquanto questão? E abandonar a afirmação de Cícero: "res sacra homo" ( o ser humano é realidade sagrada)?
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*Jornalista português
Fonte: http://www.dn.pt/inicio/opiniao/06/04/2013
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