Na semana passada, o presidente Pepe Mujica
assinou o decreto regulamentando a legalização da maconha no Uruguai,
que se tornou o primeiro país do mundo a estabelecer um mercado com
regras para o cultivo, venda e uso da planta. Usuários registrados
poderão comprar sementes em farmácias e cultivar até seis pés de maconha
em casa. As cooperativas e clubes de consumo também foram autorizados.
Enquanto isso, no Brasil, a ignorância sobre a maconha continua a
vicejar. Um preconceito histórico também contribui para a erva ser
considerada “maldita”: como foi trazida ao Brasil pelos negros
africanos, o combate à maconha carrega uma dose de racismo implícito
desde seus primórdios. Para piorar, o forte lobby evangélico tem se
associado ao conservadorismo impedindo que a descriminalização seja
sequer discutida em nosso país –inclusive para a uso medicinal.
Mas maconha não é, ao contrário do que tentam pintar, “coisa de
vagabundo”. Pelo contrário: muita gente boa fuma maconha e você nem
imagina. Em homenagem aos uruguaios, compilei uma seleção de textos e
opiniões de grandes escritores “maconheiros” sobre a erva. Viva Mujica!
Hunter S. Thompson (1937-2005)
“Sempre amei a maconha. Ela tem sido uma fonte de alegria e conforto
para mim por tantos anos. E eu ainda acho que é uma das coisas básicas
da vida, ao lado da cerveja, gelo e grapefruits –e milhões de americanos concordam comigo.”
Norman Mailer (1923-2007)
“O efeito da maconha em alguém é sempre existencial. Pode-se sentir a
importância de cada momento e como isto nos afeta. É possível sentir a
própria essência, tornar-se consciente do enorme mecanismo do nada –o
zumbido do aparelho do som, o vazio de uma interrupção sem sentido. Nos
tornamos conscientes da guerra dentro de cada um de nós, e como o nada
dentro de nós busca atacar a essência dos outros, e como nossa essência,
por sua vez, é atacada pelo nada dos outros.”
“Minha experiência com a cannabis melhorou muito minha
apreciação da arte, um tema que nunca pude apreciar antes. O
entendimento do propósito do artista, que eu obtenho quando estou
chapado, algumas vezes continua quando estou de cara. Esta é uma das
muitas fronteiras humanas que a cannabis me ajudou a transpor.
Tem também algumas sacadas relacionadas à arte –eu não sei se elas são
verdadeiras ou falsas, mas foram muito divertidas de formular. Por
exemplo: passei algum tempo doidão apreciando o trabalho do surrealista
belga (na verdade francês) Yves Tanguy. Alguns anos mais tarde,
ao emergir depois de um longo mergulho no Caribe, afundei exausto na
praia formada pela erosão de um recife de coral nas proximidades.
Examinando à toa os fragmentos arqueados de coral em tons pastel que
formavam a praia, vi diante de mim uma pintura de Tanguy. Talvez ele
tenha visitado uma praia assim na infância.” (leia o texto completo de
Sagan sobre a maconha aqui. Em inglês.)
“Julgue por si mesmo, senhor Aladim –julgue, mas não se resuma a uma
só tentativa. Como tudo o mais, precisamos acostumar os sentidos a uma
primeira impressão, suave ou violenta, triste ou alegre. Há uma luta em
nossa natureza contra essa substância divina –nas naturezas que não são
feitas para o prazer e se aferram à dor. É preciso que a natureza
subjugada sucumba no combate, o sonho tem que vencer a realidade e o
sonho reinar supremo; então o sonho se transforma em realidade e a
realidade se torna sonho. Mas que mudanças ocorrem! Apenas pela
comparação da dor da existência verdadeira com as alegrias da existência
assumida é que você desejará não mais viver, mas sonhar para sempre.
Quando você retorna a esta esfera mundana de seu mundo visionário, é
como se trocasse uma primavera napolitana pelo inverno da Lapônia
–deixar o Paraíso pela Terra, céu pelo inferno! Experimente o haxixe,
meu hóspede –experimente o haxixe.” (em O Conde de Monte Cristo)
Stephen King (1947-)
“Eu acho que a maconha deveria não só ser legal como deveria ser uma
indústria caseira. Seria maravilhoso para o Estado do Maine. Tem uma
erva muito boa plantada em casa. Tenho certeza que seria ainda melhor se
fosse possível cultivar em estufas, utilizando fertilizantes…”
Friederich Nietzsche (1844-1900)
“Quando a gente quer se livrar de uma pressão insuportável o haxixe é necessário.”
Gilberto Freyre (1900-1987)
“Já fumamos a macumba ou diamba. Produz realmente visões e um como cansaço suave; a impressão de quem volta cansado dum baile, mas com a música ainda nos ouvidos.” (nas notas de Casa Grande & Senzala)
Ramon Del Valle-Inclán (1866-1936)
–O México me pareceu um país destinado a fazer coisas maravilhosas.
Tem uma capacidade que o mundo não sabe admirar em toda a sua grandeza: a
revolucionária. Através dela avançará e evoluirá. Dela… e do cânhamo
índico, que lhe faz viver em uma exaltação religiosa extraordinária.
–O cânhamo índico?
–O cânhamo índico?
–A erva maconha ou cânhamo índico, que é o que os mexicanos fumam. É o que explica seu desprezo à morte, que lhes dá um valor sobre-humano. (entrevista ao jornal El Heraldo de Madri, 1918)
Charles Baudelaire
“Eis a felicidade! Uma colherinha bem cheia! A felicidade com toda a
sua embriaguez, todas as suas loucuras, todas as suas criancices! Pode
tomá-la sem medo; ninguém morre por causa disso. Seus órgãos físicos não
sofrerão dano algum. Talvez mais tarde, se recorrer muitas vezes ao
sortilégio do haxixe, diminuirá sua força de vontade e você será menos
homem que agora; mas está tão longe o castigo e é tão difícil determinar
a natureza do futuro desastre! Que risco você corre? Um pouco de
cansaço nervoso no dia seguinte. Mas você não se expõe todos os dias a
castigos maiores por menores recompensas?” (em Os Paraísos Artificiais)
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Fonte: CArta Capital online.
Publicado em 12 de maio de 2014
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