domingo, 11 de maio de 2014

“Há possibilidades de usar a luz para ajudar as pessoas.”

 
Diretora do programa de iluminação e saúde do Light Research Center, do Rensselaer Polytechnic Institute

Dezoito anos atrás, quando foi passar uma temporada nos Estados Unidos, a arquiteta mineira Mariana Figueiro planejava se dedicar ao design de iluminação. Acabou enveredando, meio por acaso, pela pesquisa sobre como a luz regula o relógio biológico e interfere no ciclo diário de funcionamento do organismo – o chamado ritmo circadiano. Acabou permanecendo nos EUA e hoje é uma das principais pesquisadoras da área, liderando uma equipe de 15 pessoas na função de diretora do programa de iluminação e saúde do Light Research Center, no estado de Nova York.

Mariana concedeu a seguinte entrevista a Zero Hora.

No ano passado, a senhora participou do primeiro simpósio da Sociedade da Luz Azul, que parece nome de alguma entidade esotérica. O que é a luz azul e por que ela é importante?

A luz azul é a que afeta o nosso ritmo circadiano. Precisamos dela para manter a sincronização dos nossos ritmos internos com o mundo do lado de fora. Por isso, ela é a luz mais importante. Onde está mais presente é na luz do dia, na luz natural.

Televisores, smartphones, computadores e outros eletrônicos emitem luz azul?

Concluímos que os computadores, porque são telas grandes e porque ficamos muito perto da tela, emitem luz azul com possibilidade de afetar os ritmos circadianos. Realizamos também um estudo com iPads, com tablets, no qual se viu que, quando você usa o equipamento por mais de duas horas, também afeta os ritmos.

O que o estudo que a senhora fez sobre o uso do tablet à noite ensina sobre equipamentos que emitem luz?

Nossa sociedade está escrava desse tipo de equipamento. As pessoas têm de começar a pensar em diminuir a intensidade da luz ou parar de usar duas horas antes de dormir.

O papel da luz nas nossas vidas está sendo subestimado?

Sim, porque manter os ritmos circadianos é muito importante para a saúde. Há muitas possibilidades de usar a luz para ajudar as pessoas. Alguns estudos mostram que receber mais luz durante o dia pode diminuir o peso. Faço um trabalho com pacientes de alzheimer no qual conseguimos fazê-los dormir melhor e ter menos sintomas de depressão, modificando a quantidade e o tipo de luz que recebem.

Hoje passamos o dia expostos à luz artificial, e não natural. À noite, quando está escuro, continuamos iluminados graças à eletricidade. Quais são os riscos?

Quando os ritmos circadianos não estão funcionando bem, há mais risco de diabetes, obesidade e até mesmo câncer. Você tem um relógio biológico no cérebro. O que ele faz é sincronizar com a luz do dia e mandar essa informação, se é dia ou noite, para o resto do corpo, através do hormônio melatonina. Então os órgãos do corpo sabem o que precisam fazer a cada momento. Se perde esse ciclo, as coisas não acontecem nas horas em que deveriam. Isso pode prejudicar os reparos de DNA que acontecem à noite, a forma como as células se dividem ou os hormônios associados ao sistema imunológico.

Comparando com o passado, hoje se dorme menos tempo. Estamos todos sendo afetados pelo problema?

Se você olha a sociedade de hoje, pelo menos aqui nos Estados Unidos, as pessoas são muito mais obesas, a diabetes é um problema seríssimo, as doenças de coração também, e até mesmo o câncer. Pode ser que uma razão do câncer seja simplesmente essa desconexão que temos de menos luz durante o dia e mais luz durante a noite.

Passando o dia em ambientes fechados, com luz artificial, recebemos luminosidade insuficiente?

Correto. As pessoas tendem a não receber muita luz natural. E faz diferença, porque a luz natural tem a quantidade e a intensidade que a gente precisa de luz azul.

Sua formação original é em arquitetura. Que tipo de aplicação os conhecimentos sobre a influência da luz teria nessa área?

Vai desde o início do projeto da casa, pensando onde colocar janelas para ter luz natural pela manhã, o momento mais importante. Estou em um projeto com o departamento de energia da Suécia para fazer a casa saudável. A ideia é ter uma iluminação que varia durante o dia, de acordo com as necessidades do ritmo circadiano. Eu usaria um sensor que mede a quantidade de luz que a pessoa está recebendo e interpreta se ela precisa de mais ou menos luz. A casa vai mudar o tipo de iluminação, conforme a necessidade de cada indivíduo.

A senhora também pesquisa o uso de luzes para insônia. É promissor?

Se a insônia é relacionada com problema no ritmo circadiano, conseguimos consertar com o uso de luzes durante o dia. Mas se a insônia é porque você está ansioso porque não consegue pagar sua contas, aí não conseguimos resolver, não.

Como é o projeto que a senhora desenvolve nos submarinos da Marinha dos Estados Unidos?

Estamos incluindo uma iluminação mais azulada quando eles estão trabalhando no submarino. A iluminação hoje é horrível. Estamos modificando para melhorar a perfomance na hora de trabalho e o sono na hora de dormir. A nossa ideia é que o projeto seja implantado em toda a frota.
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Reportagem por  MARIANA FIGUEIRO
Fonte: ZH online, 11/05/2014
imagem da Internet

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