1968 foi um ano de revoltas, considerado por alguns como o ano das revoltas mais importantes do século. Na França, país que desencadeou todas as manifestações, Guy Debord comandava a Internacional Situacionista, grupo de intelectuais críticos da sociedade daquela época, que tinha como base teórica sua maior obra: "A Sociedade Do Espetáculo"
Guy Debord foi um filósofo, cineasta e crítico cultural francês. Dentro
de toda sua participação política, principalmente nos eventos de Maio de
68, esteve envolvido com a fundação e manutenção da Internacional
Situacionista – grupo dedicado à crítica daquilo que ele chamou de
sociedade do espetáculo, uma sociedade mediada por imagens, onde a
lógica do intercâmbio mercantil atingiu toda a vida cotidiana
Uma das raras fotos de Guy Debord.
Reunião da Internacional Situacionista.
A Sociedade Do Espetáculo, O Livro
O livro "A Sociedade Do Espetáculo" pode ser descrito como uma crítica
feroz à sociedade contemporânea, isto é, à sociedade do consumo, à
cultura da imagem e à invasão da economia em todas as esferas da vida. É
sua obra principal e fundadora de uma corrente de crítica renovada que
não estava satisfeita com o capitalismo ocidental e nem com o socialismo
bolchevique russo.
Capa do livro "A Sociedade do Espectáculo".
Foi lançado em 67 e causou um imenso estardalhaço, ficando popular entre
a esquerda alternativa, artistas e estudantes. Vale lembrar que o Maio
de 68 teve um enorme suporte universitário.
Neste livro, ele apresenta seu conceito de espetáculo como uma “relação
de pessoas mediada por imagens”. Imagens seriam representações imediatas
que adquirem autonomia e fazem das pessoas meros espectadores
contemplativos. Um exemplo é a moral religiosa, que se coloca como
natural, divina, absoluta, inquestionável e se impõe de maneira que não
pode ser nem percebida como uma construção social – só pode ser
contemplada e obedecida.
O Maio de 68
Um panfleto de Maio de '68.
“O que queremos, de fato, é que as ideias voltem a ser perigosas” dizia
Guy Debord em meio às revoltas estudantis e à greve geral na França de
68.
O que começou como um protesto em Nanterre tornou-se um contágio em todo
o território francês e deu impulso para revoltas nos países vizinhos,
como Alemanha, Tchecoslováquia, Itália e Polônia. No dia 20 de Maio já
não havia como segurar o caos organizado em que o Estado francês se
tornara: não havia metrô, ônibus, telefone, fábricas, nada estava
funcionando. Greve geral, literalmente.
O que mais chama a atenção nesses eventos é sua presença e
desenvolvimento majoritariamente popular, pois não foi uma ação política
tomada por grupos pequenos com algum poder de condução de massas, foi
uma ação popular de estudantes que alastrou para trabalhadores e tendeu a
modificar uma França conservadora que ainda não havia se recuperado dos
traumas da Segunda Grande Guerra.
Estudantes em 1968 na França.
Na França comandada pelo general Charles De Gaulle, o lugar das mulheres
era em casa, o lugar dos estudantes era dentro das universidades, que
os preparavam para um mundo de moral rígida e trabalho dignificador. A
homossexualidade era considerada doença e a liberdade democrática era,
ainda, uma vontade reprimida. Tudo mudou depois daquele ano.
Se os anos 60 foram a base para toda a forma de contestação cultural e
base para a exigência de visibilidade para grupos minoritários, os
trabalhos de Guy Debord foram o recheio teórico desta época. Sua obra
ainda é tema de debates e reflexões anarquistas e marxistas, além de ter
uma importância destacada na teoria da comunicação.
A Sociedade Do Espetáculo, O Filme
O filme, dirigido por Debord e lançado em 73, é uma versão audiovisual
do livro, onde, ao expor seus conceitos, ele utiliza um recorte de
imagens incessante e, a primeiro momento, aleatório, mas que dá suporte à
teoria apresentada no livro. É, na verdade, um anti-filme. Uma forma de
desvio: a utilização da cultura para fins subversivos. Nele, a imagem não obedece ao narrador, não o segue.
Início do filme "A Sociedade do Espectáculo".
É importante dizer que a França da década de 60 e 70 respirava o cinema -
os cineclubes, antros de estudantes e amantes da arte, sempre iniciavam
bons debates sobre os filmes apresentados. Utilizar o cinema como meio
para sua obra não era, então, uma questão de "facilitar" a assimilação
do conteúdo do livro (coisa que, realmente, não acontece), mas de
utilizar de uma nova forma de arte. De explorar o visual. No fundo,
parte do ápice de um cinema político.
É uma maneira completamente diferente de se fazer cinema: não-acadêmica e
não-comercial. Não se trata de uma tentativa de vender uma história,
mas de apresentar uma crítica à sociedade em que vivemos.
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