“Em um mundo que não controlamos, a tolerância é obviamente um bem”, disse Ryan Holiday, autor de "The Obstacle Is The Way"
Em 1914, o laboratório de Thomas Edison foi destruído num incêndio, e anos de trabalho foram perdidos.
Isso poderia facilmente ser descrito como a pior coisa a ter acontecido
a Edison, mas, em vez disso, o inventor decidiu encarar o incidente
como uma oportunidade de reexaminar e reconstruir muito de seu trabalho.
Edison teria afirmado na época: “Graças a Deus que todos os nossos erros foram queimados. Podemos começar de novo, do zero”.
“Em um mundo que não controlamos, a tolerância é obviamente um bem”, disse ao Huffington Post Ryan Holiday, autor de "The Obstacle Is The Way" (O obstáculo é o caminho, em tradução livre).
“Mas a capacidade de encontrar energia e força naquilo que não controlamos é uma vantagem competitiva imensa.”
Ele está falando de força mental,
um conceito psicológico difícil de definir e que inclui inteligência
emocional, obstinação, resiliência, autocontrole, resistência mental e
consciência.
É algo que Edison tinha de sobra e a razão pela qual algumas pessoas
são capazes de superar qualquer obstáculo, enquanto outras se esmigalham
diante dos desafios e das frustrações do dia a dia.
A capacidade de lidar com emoções e situação difíceis é um indicador importante do nosso sucesso e da nossa felicidade.
Os indivíduos mais capazes neste sentido transformam obstáculos em fontes de crescimento e oportunidade.
E, apesar de muito se falar do que as pessoas mentalmente fortes evitam fazer
- tal como viver no passado, ressentir-se do sucesso alheio e sentir
pena de si mesmas -, o que elas de fato fazem? Que táticas elas usam
para superar as adversidades repetidas vezes?
“O que pensamos ser obstáculos, na verdade, são oportunidades de fazer
algo”, diz Holiday. “De uma certa maneira, são recompensas inesperadas,
desde que lidemos e não fujamos desses obstáculos.”
Aqui estão nove hábitos essenciais e práticas das pessoas mentalmente
fortes que podem ajudá-lo a atravessar qualquer desafio ou dificuldade.
Elas veem as coisas objetivamente
Existe uma máxima na antiga filosofia do estoicismo: “Não há mau nem bom, apenas a percepção”, que mais tarde foi ecoada num verso famoso de Shakespeare: “Não há nada bom ou nada mau, mas o pensamento o faz assim”.
A maneira como percebemos uma situação tem um poder tremendo de nos ajudar ou nos prejudicar. Muitas vezes reagimos emocionalmente e projetamos julgamentos negativos em uma situação, quando na realidade a chave para superar um obstáculo é ver as coisas objetivamente.
“Você pode ter o melhor plano do mundo, mas, se não vir a situação claramente, não adianta nada”, diz Holiday.
Holiday estudou inúmeros exemplos de indivíduos ao longo da história capazes de lidar com obstáculos que, para nós, parecem insuperáveis, desde ser falsamente acusado de um triplo homicídio a ser intensamente discriminado por motivos de raça ou sexo.
Ele concluiu que a resistência mental depende de três coisas: percepção, ação e vontade.
“[A resistência mental depende de] algum tipo de estrutura filosófica que permita enxergar além das emoções ou das primeiras impressões causadas por determinada situação”, diz Holiday.
“Então, os elementos disso são 1) sua percepção: você consegue enxergar as coisas claramente e com equilíbrio? 2) você tem soluções ou ações criativas? E, finalmente, que tipo de determinação ou vontade você tem para lidar com a situação?”
Elas não se acham “no direito”
Todos nós merecemos a felicidade, mas não merecemos uma vida livre de obstáculos ou adversidades.
Agir como se esse fosse um direito – achar que devemos ter o que
queremos a maior parte do tempo – dificulta a vida na hora de lidar com
os desafios quando eles aparecem e nos pegam de surpresa.
Esse é um obstáculo especialmente comum para a Geração Y, de acordo com
o especialista Paul Harvey, professor-assistente de administração da
Universidade de New Hampshire, que observou que a geração do milênio tem “expectativas irreais e uma forte resistência em aceitar comentários negativos”.
“Vendeu-se para a Geração Y um certo jeito de pensar sobre o mundo”, concorda Holiday.
“Antigamente, as pessoas recebiam uma estrutura que não era só mais
humilde, mas que também entendia como o mundo poderia ser imprevisível e
inexplicável.”
Pessoas mentalmente fortes reconhecem que seus planos de vida, e a vida
em si, podem sair dos trilhos a qualquer momento – e elas não perdem
tempo se considerando vítimas do destino quando as coisas não acontecem
como elas gostariam.
Elas mantêm a calma
Resistência mental não significa estar feliz o tempo todo. Talvez seja
mais razoável pensar em algo como “manter a calma o tempo todo”, diz
Holiday.
A estabilidade emocional e a capacidade de manter a cabeça fria é um
bem importante na hora de lidar com situações desafiadoras. Felizmente, a
estabilidade emocional tende a aumentar com a idade – e não é surpresa que fiquemos mais felizes como resultado disso.
Elas não aspiram à felicidade o tempo todo
Uma preocupação excessiva com a felicidade pode na verdade levar a uma
atitude pouco saudável: emoções e experiências negativas.
Pessoas mentalmente fortes não tentam evitar emoções negativas – em vez
disso, elas aceitam as emoções positivas e negativas e permitem que os
diferentes sentimentos coexistam, um componente-chave da resiliência.
“Nós damos tanto valor ao otimismo, à felicidade e a todos esses traços
positivos, eles mesmos abstrações, que somos pegos de surpresa e não
conseguimos lidar com seus opostos”, diz Holiday.
“Se estivéssemos mais no meio do caminho as coisas seriam melhores.
Tiraríamos vantagem do que acontece conosco porque haveria mais
objetividade.”
O pesquisador australiano Hugh Mackay argumenta que nossa obsessão
cultural com a felicidade pode ser perigosa e que, em vez de se
preocupar em ser felizes, deveríamos na verdade nos preocupar em ser
completos.
“A ideia de que tudo o que fazemos é buscar a felicidade me parece
realmente perigosa e tem levado a uma doença contemporânea na sociedade
ocidental, que é o medo da tristeza”, escreve Mackay em The Good Life.
“Deveríamos buscar a completude, e a tristeza é parte dela, assim como o
são os desapontamentos, as frustrações e os fracassos; tudo o que nos
faz ser o que somos. Felicidade, vitórias e conquistas são coisinhas
boas que acontecem em nossas vidas, mas elas não nos ensinam muito.”
Elas são otimistas realistas
As pessoas mentalmente fortes estão acostumadas a se levantar depois de uma queda.
Em vez de ficarem aflitas e desesperadas, elas aproveitam a
oportunidade para raciocinar e encontrar uma solução criativa para o
problema.
Essas pessoas tendem a ser otimistas realistas
- elas têm a esperança dos otimistas e a clareza dos pessimistas - o
que lhes dá a motivação e o pensamento crítico exigido para obter as
soluções criativas.
“Toda vez que [o otimista realista] está diante de uma questão, um
desafio ou um problema, ele não vai dizer: “Não tenho escolha, esta é
minha única opção”, diz a pesquisadora Sophia Chou ao LiveScience.
“Eles são criativos e terão um plano A, um plano B e um plano C.”
Elas vivem no presente
Estar presente – em vez de viver no passado ou ter expectativas futuras – permite ver as coisas como elas realmente são.
Mesmo que não meditem propriamente, as pessoas mentalmente fortes
tendem a manter essa consciência e essa abordagem perante o mundo.
“Pode chamar como quiser, mas a ideia é que, se você se concentrar
exclusivamente naquilo à sua frente, você não está trazendo nenhuma
bagagem para a situação e está considerando só as variáveis que
importam”, diz Holiday.
A ciência tem demonstrado que a meditação pode aumentar o poder do seu cérebro.
Praticar essa “conscientização” já foi ligado à estabilidade emocional, menos estresse e ansiedade e mais clareza mental.
Elas são persistentes na busca de seus objetivos
Todos já ouvimos histórias inspiradoras de pessoas incrivelmente
bem-sucedidas que superaram dificuldades e fracassos para chegar lá.
Elas mostram uma das qualidades fundamentais das pessoas resilientes:
perseverança ou, como coloca a psicóloga Angela Lee Duckworth, obstinação.
Em suas pesquisas com estudantes em diferentes ambientes educacionais,
Duckworth descobriu que a obstinação é a principal razão do sucesso,
mais que qualquer outra qualidade (QI, inteligência emocional,
aparência, saúde física).
Ela também estudou professores e trabalhadores e diversos ambientes profissionais para determinar as razões do sucesso.
“Em todos esses diferentes contextos, um fator emergiu como segredo do
sucesso, e não era a inteligência social, a aparência, a saúde física ou
o QI. Era a obstinação”, disse Duckworth numa palestra no TED.
“A obstinação é paixão ou perseverança em nome de objetivos de longo
prazo. Obstinação é ter resistência, é não abrir mão do futuro, dia após
dia – não só por um dia ou por um mês, mas por anos – para transformar
aquele futuro em realidade.”
Mas elas sabem quando é hora de abrir mão
Uma pessoa mentalmente forte pode dizer para si mesma: “Tentei de tudo e agora posso desistir”, diz Holiday.
Reconhecer que você controla somente suas ações, e não o resultado
delas, é tão importante quanto perseverar. Aceitar este fato nos permite
abrir mão das coisas que estão além de nosso alcance.
Há uma ideia no estoicismo, explica Holiday, chamada a “arte da
aquiescência”, que é abrir o caminho para as coisas que você não pode
mudar, tentando tirar o melhor da situação em vez de se afligir ou
frustrar.
Precisamos de força, determinação e perseverança, mas nem sempre elas
são a resposta que procuramos. As pessoas mentalmente fortes vivem de
acordo com a Oração da Serenidade -- elas mudam o que podem controlar, aceitam o que não podem controlar e sabem a diferença entre as duas situações.
“Às vezes a solução do problema é aceitá-lo e ser flexível o suficiente
para contorná-lo, em vez de bater de frente com ele até que você
quebre”, diz Holiday.
Elas amam suas vidas
Amor fati é uma expressão em latim que pode ser traduzida como “amar o
destino”, um conceito derivado dos antigos filósofos estoicos gregos e
romanos que reapareceu mais tarde na obra de Nietzsche.
Talvez esse seja o fator mais importante na força mental.
“A ideia é que você não tem apenas de tolerar as coisas que não pode
controlar – elas podem ser uma benção”, diz Holiday. “Você pode
encontrar a felicidade não apenas aceitando, mas abraçando as coisas que
acontecem para você.”
Pessoas mentalmente fortes são gratas pelos obstáculos pelo simples fato que eles representam a própria vida.
Pouco antes de morrer, a escritora Jane Lotter, de Seattle, deixou esse conselho para sua família, num obituário que ela mesma escreveu.
Como disse Lotter, “Que você se lembre sempre de que os obstáculos no caminho não são obstáculos, eles SÃO o caminho.”
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Reportagem por:
Fonte:exame.abril.com.br.
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