Martha Medeiros*
Recebi o e-mail de uma mulher madura contando que ela e
o marido estão praticamente vivendo um para o outro, pois estão
decepcionados com os demais semelhantes - cuja semelhança ela não vê,
aliás. Resumo aqui suas palavras: Somos instruídos e temos ótimo pique,
porém estamos cada vez mais isolados, os filhos moram longe e as demais
pessoas não nos dizem nada. Gostamos de coisas que ninguém gosta. Nosso
nível de tolerância é mínimo diante da hipocrisia humana, do
politicamente correto, do bairrismo, dos fanáticos, dos mal-educados,
dos ridículos, dos sem noção, dos burros, dos ignorantes e da
manipulação da massa através dos meios de comunicação.
Escapei não sei como. Ela diz que comigo até que gostaria de conversar, e me pediu opinião sobre sua ansiedade. “Se meu marido morrer, ficarei perdida”.
Bom, eis um caso de uma mulher que cruzou com sua alma gêmea, o que a coloca em vantagem. Porém, procura almas gêmeas também na vida social. Amiga, desista. Você já encontrou a sua e casou com ela, valorize a sua sorte, não seja fominha.
Brincadeiras à parte, dizer o quê? Afora os seres intragáveis, a maioria das pessoas possui alguma coisa que fecha com a gente. Alguma coisa. Não precisa fechar em tudo. Tem aquela amiga que é ótima para viajar, tem a santa que ouve nossos lamentos, aquela outra que é uma alegre parceira de indiadas, a que sempre tem uma bolsa de festa para emprestar, a que se oferece para dar carona, a que é companheira para assistir filmes iranianos, a que diz tanta bobagem que é impossível não rir. Alguma coisa, entende?
Escapei não sei como. Ela diz que comigo até que gostaria de conversar, e me pediu opinião sobre sua ansiedade. “Se meu marido morrer, ficarei perdida”.
Bom, eis um caso de uma mulher que cruzou com sua alma gêmea, o que a coloca em vantagem. Porém, procura almas gêmeas também na vida social. Amiga, desista. Você já encontrou a sua e casou com ela, valorize a sua sorte, não seja fominha.
Brincadeiras à parte, dizer o quê? Afora os seres intragáveis, a maioria das pessoas possui alguma coisa que fecha com a gente. Alguma coisa. Não precisa fechar em tudo. Tem aquela amiga que é ótima para viajar, tem a santa que ouve nossos lamentos, aquela outra que é uma alegre parceira de indiadas, a que sempre tem uma bolsa de festa para emprestar, a que se oferece para dar carona, a que é companheira para assistir filmes iranianos, a que diz tanta bobagem que é impossível não rir. Alguma coisa, entende?
Minha leitora deveria diminuir o nível de exigência e extrair das pessoas o seu melhor, deixando o pior pra lá. A vizinha chata pode ser uma ótima professora de espanhol, a avarenta pode preparar um risoto caprichado, a cafona pode ser aquela que ficará na cabeceira da sua cama quando você estiver com um febrão. Todos têm seu lado A e B - nós, inclusive.
Compreendo que minha leitora tem um estilo de vida arrojado e uma cabeça cosmopolita que destoa da cidade onde vive, que não é nenhuma Nova York. Então por que não se muda para uma urbe mais vibrante? Se não der, que baixe a guarda e procure as agulhas no palheiro, elas existem. Tive uma amiga que igualmente acreditava ter nascido no planeta errado, para ela todos também eram bairristas, ignorantes e ridículos - e quanto mais ela discursava sobre seu inconformismo, mais ela própria parecia bairrista, ignorante e ridícula. A falta de condescendência nos bitola.
Querida leitora, torço para que consiga encontrar pessoas afins e interagir com as menos afins sem tanto rigor. Você faz bem em grudar no seu marido - um companheiro que é seu melhor amigo é uma benção - mas não julgue tão severamente os que estão em volta. Eles podem ser úteis, nem que seja para exercitar sua humildade.
-------------------
* Escritora. Cronista da ZH
Fonte: ZH online, 06/04/2014
Nenhum comentário:
Postar um comentário