quarta-feira, 30 de abril de 2014

Instintos da espécie humana

Bruno Peron*
 

Nas linhas seguintes, proponho duas interpretações sobre a espécie humana:

1) eu desafio o status privilegiado que nos diferencia de outras espécies animais como seres dotados de inteligência e razão;

2) argumento que algumas atividades humanas nos situam abaixo de outros animais e caracterizam nosso papel colonizador-predatório na Terra.

Antes de desenvolver estas ideias, cujo conteúdo é um tanto desafiador para uma espécie que há poucos séculos acreditou que fosse a mais importante a habitar o planeta central do universo, exponho a definição de animal que encontrei num dicionário. De três acepções listadas, parafraseio a primeira que o situa como um ser vivo que tem células múltiplas, alimenta-se de outros seres vivos, tem capacidade de movimento e responde a estímulos. Até este ponto, tal definição cabe a uma infinidade de criaturas, inclusive humanas.

Porém meu questionamento diz respeito à segunda acepção de animal de acordo com o dicionário. Ela define-o como um ser irracional e que, por isso, opõe-se ao homem.

De acordo com esta linha que diferencia os seres humanos de outros animais, de fato contamos com atributos mais sofisticados (a razão) e mais complexos (a inteligência) que neles. Quantos exemplos temos de criação e manipulação de técnicas para facilitar nossa sobrevivência! O desequilíbrio entre o uso de instinto e de inteligência é o que dá à espécie humana um ar de superioridade no reino das coisas vivas deste planeta.

Entretanto, há que levar em conta que instinto é também um tipo de inteligência pelo qual os animais (incluindo-nos, de acordo com meu argumento) satisfazem suas necessidades de sobrevivência. O ser humano possui resquícios desta inteligência rudimentar quando suas paixões, vícios e más inclinações prevalecem sobre suas virtudes.

Deste modo, temos um clima de animalização do ser humano e de humanização dos outros animais, se tomarmo-nos como parâmetro para comparação. Isto significa que nosso instinto de preservação faz-nos cobiçar, invejar e matar seres da mesma espécie quando não houver impedimentos normativos (as leis, as morais, os costumes); frequentemente a razão se põe de lado para que humanos saciem seus apetites carnais.

Noutro relato, menciono que a organização laboral das abelhas e das formigas nos dá exemplos que nosso orgulho nos impede de observar, enquanto cachorros muitas vezes são de fato “o melhor amigo do homem” devido à sua companhia e fidelidade.

Estamos, assim, abaixo de outros animais no uso de nossa inteligência instintiva. Portanto, não somos uma espécie privilegiada, ainda que façamos uso da razão.

A segunda interpretação que gostaria de propor sobre a espécie humana é de que temos exercido um papel colonizador-predatório na Terra. E há os que já estão de olho na possibilidade de viver em estações espaciais, na Lua e em Marte.

Junto da pretensão de superioridade da espécie humana sobre os outros animais, há também um desejo frenético de controle, expansão e exploração. A história da humanidade tem exemplos de impérios influentes, de diásporas e migrações entre continentes, e de construção de estações científicas no Polo Norte e na Antártica.

O ser humano é sedento de território (daí a origem da globalização através das conquistas de além-mar), ainda que não possa estar de corpo em todos os lugares que conquista. É notável, porém, que temos escravizado as outras espécies para saciar nossas necessidades e temos construído abundâncias que põem o planeta em risco de extinção.

Está sempre conosco a decisão sobre se queremos aprimorar nossa inteligência ou disseminar no lodo da Terra os elementos de nossos instintos rudimentares.
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* Escritor e analista de relações internacionais.
Fonte: http://www.brunoperon.com.br/textos-sul-americanos/artigo.asp?id=361&lang=br
Imagem Internet

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