Daniel Clemente*
O esplêndido ilusionista Issao Imamura, que faz da dúvida a certeza
de um excelente entretenimento, descreveu o sentido e o objetivo da
política mundial travestida de democracia, não o fez com a intenção de
desmoralizar a classe representativa dos povos, na verdade Issao estava
apenas relatando o seu cotidiano, mas deu uma real impressão que falava
sobre os políticos: “A mágica é a clássica arte de iludir os sentidos
humanos através de recursos simples”.
No longa-metragem “O Grande Truque”, dirigido por Christopher Nolan,
dois mágicos competem na cidade de Londres do século XIX pela hegemonia
do ilusionismo, praticando as mesmas técnicas, as mesmas mágicas e
disputando o mesmo público. Ambos utilizam a sabotagem, a espionagem, a
delação ou o sequestro de ideias, com o propósito de restringir e
aniquilar o adversário, para a ascensão onipresente diante da plateia,
os aplausos da maioria é a consagração do direito de iludir.
Essa disputa bipolarizada do certo contra o errado, do bem contra o
mal, repete-se na história com grande frequência entre religiões, nações
e ideologias, procurando ambos em disputa o mesmo fim, o exercício do
poder e a prática de iludir. Nas Cruzadas eram cristãos e muçulmanos
transformando com a espada em punho os caminhos da Terra Santa em
trilhas infernais. Na Guerra Fria, as superpotências URSS e EUA
produziram em nome da paz uma quantidade tão absurda de bombas atômicas
que era possível destruir o planeta Terra mais de vinte vezes. Por falta
de diálogo, a etnia hutu silenciou a golpes de facões oitocentos mil
tutsis nos cem dias mais sangrentos da história de Ruanda.
Também temos exemplos de selvageria bipolar mais branda, democratas e
republicanos disputam á cotoveladas o centro do império capitalista
estadunidense. No Brasil a concorrência pelo saque do dinheiro público é
disputada entre partidos politicos e políticos rachados. Na Venezuela
os bolivarianos chavistas reivindicam o direito de negar direitos á
oligarquia petroleira, que negava as riquezas do ouro negro ao restante
do país. Na Europa oriental, os russos reivindicam aos ucranianos os
territórios que antes pertenciam aos russos, e a Ucrânia reivindica a
Rússia o direito de ser Ucrânia.
A política conduzida pelos ilusionistas black-tie transforma-se em
palco, onde os políticos são os mágicos e a plateia são os eleitores, e
como se fosse a repetição de um roteiro centenário, os atores se dirigem
ao público de uma maneira cativante e convincente, após a eleição
passam a ser iguais aos demais desacreditados políticos, e como se fosse
um passe de mágica são reeleitos, concretizando o espetáculo.
A fórmula da manutenção da política ineficaz, porém persistente, é a
mágica assistida por insistentes vezes, porém não compreendida. A
narrativa de Christopher Nolan contribui para esse entendimento: “Todo
truque de mágica consiste de três partes ou atos, a primeira parte se
chama “a promessa”, o segundo ato chama-se “a virada”, e o terceiro ato é
o grande truque. Agora, vocês estão procurando o segredo, mas não vão
encontrar, porque é claro, vocês não estão realmente olhando, vocês não
querem realmente saber, vocês querem ser enganados”.
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Daniel Clemente é Historiador e Coordenador AmbientalFonte: Ecodebate, 14/04/2014
Imagem da Internet: Do Longa metragem o Grande Truque.
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