domingo, 30 de março de 2014

Mulheres cabeludas

 Martha Medeiros*
Deixe os pelos do corpo crescerem e aparecerem, e ao inferno com o que os outros pensam. Esse é o slogan do movimento Hairy Awarey, que aqui no Brasil ganhou o nome de Peludas Conscientes. Mulheres no mundo todo estão lutando pelo direito de deixarem as axilas cabeludas, assim como as pernas e provavelmente o bigode, por que não? Madonna semana passada postou numa rede social uma foto com o braço levantado mostrando que é adepta.

“Lutar pelo direito” é força de expressão, pois esse direito existe, ninguém vai presa por não se depilar. Mas lá se vai uma das poucas diferenças que ainda tínhamos com os homens.

Eu sei, eu sei que depilação com cera é uma tortura. Mas se a mulher não tem tempo, dinheiro ou vontade de ir a um salão periodicamente para se submeter ao procedimento, então que use uma lâmina de barbear durante o banho e zás! Elimine os pelinhos das pernocas e das axilas. Todo dia, da mesma forma que usamos xampu e sabonete. Depois é só enxugar, passar um hidratante e fim de drama. Ou então busque outra solução: há tantos cremes depilatórios vendidos em farmácias e supermercados. Sem falar na revolucionária pinça.

Eu sei, eu sei que a mídia é a culpada de tudo que nos acontece. É culpada de não mergulharmos num tonel de chocolate como gostaríamos, é culpada de fazer a gente acordar cedo para praticar exercícios, é culpada das centenas de escovas para alisamento, é culpada até de termos nascido, se bobear. Mas devagar com a carruagem, princesas. Se por um lado é realmente esquizofrênica essa busca pelo padrão de beleza photoshop, há que se concordar que o estímulo à vaidade nem sempre é predador. Buscar a feminilidade não nos torna submissas, escravas, reféns, nem nada que faça retroceder as conquistas estimuladas por Simone de Beauvoir e turma. Ser feminina é um prazer. Não precisamos nos igualar aos homens em todos os quesitos. Ando por aqui com essa história de igualdade, igualdade, igualdade. Quando começa a virar fanatismo, boa coisa não vem.

Aproveitando a deixa: meninos, vocês sim, mantenham-se peludos, por favor. Nadadores se depilam porque precisam eliminar décimos de segundos de seus recordes, mas vocês não irão competir por uma medalha de ouro nas próximas Olimpíadas, até onde sei. Então sosseguem. Esse sofrimento é nosso, vocês têm o de vocês: queda de cabelo, exame de próstata, expectativa de vida menor. Cada um com a sua dor.

Eu sei, eu sei que a liberdade da mulher é um valor a ser defendido com unhas e dentes. Mas com unhas feitas e dentes escovados, de preferência, e sem pelos distribuídos pelo corpo. Ninguém disse que para sermos livres teríamos que voltar para a selva.
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* Escritora. Jornalista
Fonte: ZH online, 30/03/2014

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