sábado, 8 de março de 2014

Se pudesse... o que você mudaria?

 Ahas*

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 Através de diversos depoimentos ao redor do mundo, 
o projeto If I Could abre uma 
intrigante reflexão
É uma pergunta simples, mas que faz pensar. Muito provavelmente sua vida seria completamente outra se suas escolhas tivessem sido diferentes. O que somos é a soma das opções que adotamos ao longo de nossa trajetória. Afinal, não há nada que diz mais sobre nós que nossas próprias decisões. Por isso, uma das grandes angústias da humanidade é a variedade de possibilidades e rumos que nosso destino pode tomar em busca da tão sonhada felicidade. Essa abundância gera ansiedade, nos faz criar mais expectativas, dá margem a diversas possibilidades. E se você escolhesse outra profissão? E se você morasse em outro bairro? E se resolvesse pedir demissão do seu emprego? Você seria mais feliz se suas escolhas fossem outras?

Em meio a esses devaneios nasceu o projeto If I Could (se eu pudesse) do Filipe, que estava cansado do seu cotidiano. A vida de publicitário que levava em São Paulo estava esgotando todas suas vontades e motivações. Morava confortavelmente com a família e tinha um futuro promissor, trabalhando em uma agência de médio porte com possibilidades de crescimento, no ápice da juventude dos seus 26 anos; mesmo assim, pediu demissão. Estava insatisfeito, gastava energia demais com o trabalho que demandava dias e noites de dedicação com questões que não lhe davam retorno pessoal. Foi levando a situação até a exaustão, quando não aguentou mais e juntou dinheiro para viajar por três meses em uma aventura que mudaria sua vida. Fez um mochilão pela Europa, visitando diversos países e foi se perder pelo mundo para encontrar a si mesmo. Filipe queria tornar sua experiência em algo tangível, e o projeto If I Could foi a maneira que ele pensou para tornar sua viagem em algo “relevante” e passar uma mensagem com sua escolha. Ele conheceria vários lugares e pessoas diferentes, então, quis saber dos outros o que, se pudessem, mudariam em suas vidas. Veja o resultado.

If I Could (O vídeo tem legenda em português, basta ativá-la)
 
Engraçado pensar que a possibilidade de mudar é uma simples escolha. Aponte um ser humano que não queira mudar algo na própria realidade. Claro que na simplicidade de dizer sim ou não há diversas complexidades, porém, ainda assim, decidir é o mais simples e o mais importante dos passos, é o primeiro de uma longa caminhada. Depois desses três meses fora, Filipe decidiu que sairia de vez do Brasil para morar na Alemanha, Berlim. Largar emprego, família e amigos para se aventurar em um terreno desconhecido e totalmente novo, com uma língua estranha da sua e costumes diferentes. “Vou ser feliz”, argumentou quando questionado, e não há fato que enfraqueça este argumento. Na Alemanha, Filipe se apaixonou por Berlim e por uma alemã e esses motivos foram a engrenagem de suas decisões. No vídeo que vimos, um dos entrevistados (Frederik – Bélgica) se arrepende justamente de não ter feito o que Filipe fez. Em nome da estabilidade e segurança, Frederik não largou mão de tudo para viver uma história que o tornaria outra pessoa, agora a angústia desta possibilidade o atormenta.

Certo ou errado? Não importa. Afinal, julgamos de acordo com nossos valores e isso cai fácil na subjetividade. O importante é que em nossas escolhas somos. No sentido de identidade, e somos muito mais em nossos erros. Em certo ponto de vista, o erro é o desvio de um padrão dito como correto, é uma particularidade como se fosse uma idiossincrasia, um modo próprio. Por isso, a sabedoria na literatura de Clarice Lispector nos alerta que “até cortar os próprios defeitos pode ser perigoso”, mostrando que nossa identidade é formada mais pelos nossos erros que acertos.

Erro, logo, sou”. Santo Agostino parafraseia a célere frase de Descartes “Penso, logo existo” para definir bem o valor das falhas em nossas vidas. Quando olhamos para trás, vimos que poderíamos ter agido de forma diferente em diversos casos, mas a mesma observação nos faz concluir que o resultado do nosso presente é essa soma de decisões que tomamos no passado. Prefiro acreditar que se há uma justiça neste mundo, essa está contida na fórmula física de ação e reação, em que nossas escolhas são as ações e as consequências, reações. Isso não significa que errar é bom ou positivo, mas que errar é também aprendizado e crescimento, e só não ensina mais que o exemplo.

O poder da escolha dá a sensação de controle sobre determinada situação. Mas a vida é a total improbabilidade, tanto que a incerteza do futuro é recheada de previsões que a realidade cisma em surpreender. Por mais que tenhamos certo controle de nossas ações, nossa liberdade é extremamente limitada. Essa discussão é longa e entra em várias vertentes filosóficas que abordam sobre o livre-arbítrio. Gosto muito da abordagem de Fernando Pessoa quando afirma que “Não querer é poder”, ao contrário do jargão mais recorrente de o verdadeiro poder é querer. O que Pessoa quer nos dizer é que somos adaptações da realidade, viemos ao mundo em um ambiente imposto e com diversas limitações físicas e psíquicas. Neste cenário, o não querer tem mais força, pois é um dos poucos momentos em que o Homem tem soberania sobre a Natureza e pode, de fato, escolher e não simplesmente se adaptar.
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Há interpretações como a do filósofo Kierkegaard que define o livre-arbítrio como a maior angústia do Homem. Nesta visão, estamos condenados simplesmente por existir, por estarmos no meio de forças opostas que lutam entre si. Muitos desses conceitos são dramáticos e pensar sobre o que poderíamos mudar pode ser bem menos torturante que isso. A pergunta simples nos obriga a repensar nossos passos, só por isso ela já tem grande valor, pois nos tempos atuais vivemos a febre da opinião, e ela está sempre voltada ao próximo, um período que todo mundo acha algo, condena algo, julga algo. Voltar para si essa autocrítica é um exercício que fortalece os próprios valores e direcionam novas e mais justas condutas. Pensar no que mudaríamos é também pensar no que nos tornamos com os impactos das experiências que acumulamos. Agiríamos de maneira diferente se tivéssemos a bagagem atual nas experiências passadas, com certeza. Mas pense no quanto se ganha com a ignorância. A condição básica do aprender é o não saber, e dessa forma nossas escolhas fazem mais que contar uma história, elas também projetam o futuro.

O projeto If I Could tem um site (http://ificouldfilm.com/) no qual você pode enviar seu vídeo e contribuir para disseminar essa mensagem simples e transformadora. Felizmente ou infelizmente o tempo não volta atrás, por isso, ter em mente o que mudaríamos em nossas vidas nos deixa alerta às oportunidades que nos são dadas, para não deixar passar aquele momento único que muda para sempre sua sorte. Isso me faz lembrar a poética de Mário Quintana em  “O tempo”, em que ele diz que 

Quando se vê, já são seis horas.
Quando se vê, já é sexta-feira. 
Quando se vê, já é Natal. 
Quando se vê, já terminou o ano.
Quando se vê, perdemos o amor da nossa vida.
Quando se vê, passaram-se 50 anos! 
Agora, é tarde demais para ser reprovado.
Se me fosse dado, um dia, outra oportunidade, eu nem olhava o relógio.
Seguiria sempre em frente e iria jogando pelo caminho, a casca dourada e inútil das horas.
Eu seguraria todos os meus amigos, que já não sei como e onde eles estão e diria: vocês são extremamente importantes para mim.
Seguraria o amor que está a minha frente e diria que eu o amo.
Dessa forma eu digo, não deixe de fazer algo que gosta devido a falta de tempo.
Não deixe de ter pessoas ao seu lado por puro medo de ser feliz.
A única falta que terá será a desse tempo que, infelizmente, nunca mais voltará”. 

Acredito nisso, e como diz o escritor Millôr Fernandes, "viver é desenhar sem borracha". Por mais radical que tenha sido a decisão do Filipe, não foi loucura da parte dele largar a certeza de um futuro estável para arriscar um futuro espetacular, que ele escolheu. Eu o conheço e sei que isso certamente ele vai conseguir, pois aqueles que acreditam e lutam para tornar seus sonhos em realidade são os verdadeiros donos dos seus destinos e mentores da própria felicidade. A realidade é uma questão de postura. Eu também resolvi participar do projeto e dei minha contribuição para o site. Fiz o vídeo que você confere abaixo e eu deixo a pergunta para você: se pudesse mudar algo, o que seria? E por que não começa agora?
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* É escritor, mas se prostitui como redator.
Fonte: © obvious: http://lounge.obviousmag.org/weltschmerz/2014/03/s
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