Lisa Zigue*
A flor de lótus
No dia em que a flor de lótus desabrochou,
A minha mente vagava, e eu não a percebi.
Minha cesta estava vazia, e a flor ficou esquecida.
Somente agora e novamente, uma tristeza caiu sobre mim.
Acordei do meu sonho sentindo o doce rastro
De um perfume no vento sul.
Essa vaga doçura fez o meu coração doer de saudade.
Pareceu-me ser o sopro ardente no verão, procurando completar-se.
Eu não sabia então que a flor estava tão perto de mim,
Que ela era minha, e que essa perfeita doçura
Tinha desabrochado no fundo do meu próprio coração
--------------------------------------------
Rabíndranáth Thákhur (Tagore para o ocidente) nasceu a 6 de maio de
1861 em Calcutá, no seio de uma família abastada e foi educado de acordo
com as tradições. Fez os seus estudos em Direito na Inglaterra entre
1878 e 1880, regressando à Índia para gerir as propriedades rurais da
família. Dedicou-se ao desenvolvimento da agricultura e a projetos de
saúde e educacionais.
A sua aptidão para a poesia manifestou-se cedo. Com oito anos de
idade, já fazia versos. Aos doze, teve a satisfação de ter a aprovação
do seu venerado pai, que exclamou:
— Se o rei conhecesse a língua da nossa terra e pudesse apreciar-lhe a literatura, recompensaria por certo o poeta.
Com uma vasta obra poética, que compreende três mil poemas sobre
temas religiosos, políticos e sociais, estimulou a renovação da
literatura na língua bengali. A obra em prosa, orientada por
preocupações humanistas, é extensa, desmultiplicando-se em novelas,
ensaios e contos. O volume de poesias mais conhecido é "Oferenda
Poética" (1913-1915). Como músico, compôs duas mil canções.
Em 1901, Tagore fundou uma escola de filosofia em Santiniketan.
Sofreu as dores de perder a mulher e dois dos seus filhos e entre 1902 e
1907 dedicou-se a escrever poemas místicos, alguns deles a serem
encontrados em "Oferenda Lírica", publicado em 1910. O impacto desta
obra a nível internacional valeu-lhe a indicação para o Prémio Nobel da
Literatura, recebido em 1913. Em 1919, renunciou ao título de Sir, em
protesto à política inglesa em relação à Índia.
A partir de 1921, Tagore passou a divulgar o ensino da Universidade
Internacional de Visva-Bharati, que ajudou a fundar. A sua contribuição
para a aproximação entre a cultura ocidental e a cultura oriental foi
notável. Faleceu aos 80 anos em Bengala.
Rabindranath Tagore foi aclamado por Gandhi como "Grande Mestre" e
foi reconhecido por todos os indianos como o "Sol da Índia". Foi Tagore
quem, pela primeira vez, em 1919, se referiu a Gandhi como Mahatma (do
sânscrito A Grande Alma), quando este o visitou pela primeira vez.
------------------------------------Interminável Amor
Parece-me que te amei de inúmeras maneiras, inúmeras vezes,
Na vida após vida, em eras após eras eternamente.
O meu coração enfeitiçado fez e voltou a fazer o colar das canções
Que tomaste como uma prenda, usando-o à volta do pescoço de
tantas e tantas formas.
Na vida após vida, em eras após eras eternamente.
Sempre que oiço as antigas crónicas do amor, a sua antiga dor,
O seu antigo conto de estar só ou acompanhado,
Quando contemplo o passado, no fim tu apareces
Vestida com a luz da Estrela Polar que trespassa a escuridão do tempo:
Tornas-te uma imagem do que é recordado sempre.
Tu e eu flutuámos aqui na corrente que traz da nascente
Para o coração do tempo o amor de um pelo outro.
Representámos lado a lado milhões de amantes, partilhando
A mesma tímida doçura do encontro, as mesmas amarguradas
lágrimas do adeus -
Antigo amor, mas renovando-se e renovando-se sempre.
Hoje ele acumulou-se aos teus pés, encontrando o seu fim em ti,
O amor de todos os dias, de todos os homens, do passado e de sempre:
Universal Alegria, universal mágoa, universal vida,
As recordações de todos os amores surgindo com este nosso amor -
E as canções de todos os poetas do passado e de sempre.
Cântico da Esperança
Não peça eu nunca
para me ver livre de perigos,
mas coragem para afrontá-los.
Não queira eu
que se apaguem as minhas dores,
mas que saiba dominá-las
no meu coração.
Não procure eu amigos
no campo da batalha da vida,
mas ter forças dentro de mim.
Não deseje eu ansiosamente
ser salvo,
mas ter esperança
para conquistar pacientemente
a minha liberdade.
Não seja eu tão cobarde, Senhor,
que deseje a tua misericórdia
no meu triunfo,
mas apertar a tua mão
no meu fracasso!
As Coisas Transitórias
Irmão,
nada é eterno, nada sobrevive.
Recorda isto, e alegra-te.
A nossa vida
não é só a carga dos anos.
A nossa vereda
não é só o caminho interminável.
Nenhum poeta tem o dever
de cantar a antiga canção.
A flor murcha e morre;
mas aquele que a leva
não deve chorá-la sempre...
Irmão, recorda isto, e alegra-te.
Chegará um silêncio absoluto,
e, então, a música será perfeita.
A vida inclinar-se-á ao poente
para afogar-se em sombras doiradas.
O amor há-de ser chamado do seu jogo
para beber o sofrimento
e subir ao céu das lágrimas ...
Irmão, recorda isto, e alegra-te.
Apanhemos, no ar, as nossas flores,
não no-las arrebate o vento que passa.
Arde-nos o sangue e brilham nossos olhos
roubando beijos que murchariam
se os esquecêssemos.
É ânsia a nossa vida
e força o nosso desejo,
porque o tempo toca a finados.
Irmão, recorda isto, e alegra-te.
Não podemos, num momento, abraçar as coisas,
parti-las e atirá-las ao chão.
Passam rápidas as horas,
com os sonhos debaixo do manto.
A vida, infindável para o trabalho
e para o fastio,
dá-nos apenas um dia para o amor.
Irmão, recorda isto, e alegra-te.
Sabe-nos bem a beleza
porque a sua dança volúvel
é o ritmo das nossas vidas.
Gostamos da sabedoria
porque não temos sempre de a acabar.
No eterno tudo está feito e concluído,
mas as flores da ilusão terrena
são eternamente frescas,
por causa da morte.
Irmão, recorda isto, e alegra-te.
Nenhum comentário:
Postar um comentário